Nota 10

Era uma vez... uma escola que nasceu da fusão de outros estabelecimentos de matriz portuguesa, em vésperas do nascimento de uma das regiões administrativas especiais da China. Dez anos depois, a Escola Portuguesa de Macau ultrapassou as incertezas iniciais e é avaliada de forma positiva por alunos, professores, funcionários e pais. Uma década analisada e dividida em dez pontos que compõem a EPM

 

1. Top mundial 

 

Está em quinto lugar na Ásia e em 17º no mundo, no que respeita aos conhecimentos de Ciência. À frente, portanto, da 37º posição de Portugal. Esta classificação de Macau refere-se ao PISA, ou seja, ao Programa para a Avaliação Internacional de alunos da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico). Neste programa trienal, são testados os conhecimentos dos jovens de 15 anos de diferentes partes do mundo. A ciência foi a principal disciplina a ser avaliada na edição de 2006 do PISA,   que também incluiu testes à leitura e à matemática. “São questões que puxam pela parte do raciocínio, compreensão científica. De facto, é importante que o aluno compreenda o que está a ser ensinado”. Maria Edith Silva, presidente da direcção da Escola Portuguesa, sabe do que fala, já que a EPM foi uma das participantes por Macau, tendo contribuído, em 2006, com todos os seus alunos de 15 anos. Precisamente 45. Juntas, todas as escolas da RAEM estiveram representadas por 4560 alunos. Os resultados finais aprovam com distinção o território, quer na Ásia, quer no mundo, num total de 57 países ou territórios.

No grupo de escolas de Macau, a Portuguesa está num lugar invejado. Nas três áreas avaliadas está acima da média local e é uma das 13 melhores do território. Aliás, no grupo das escolas internacionais, no qual foi inserida, a Escola Portuguesa é uma das duas primeiras. “É gratificante observar isto. Os resultados são bastante bons, estamos satisfeitos, mas há sempre algumas coisas que temos que melhorar. Normalmente, é muito difícil fazermos uma avaliação. Só com os resultados externos é possível fazer comparações com outras escolas, mesmo de Macau, já que temos um currículo diferente”, explica Edith Silva.

Quando o currículo é igual, a Escola Portuguesa também sai em vantagem nas comparações. “Ao longo da última década, os exames nacionais têm mostrado que estamos acima da média nacional portuguesa. Apesar de estarmos tão longe, apesar das épocas de exames não serem tão favoráveis a Macau…” O que obriga a tentar incluir no currículo algumas matérias locais; o que obriga, por vezes, a realizar exames nacionais à meia-noite.

Apesar dos apesares, “temos tido resultados muito bons, é um indicativo para nós”, remata a presidente da direcção.

2. Mais de 500

 

Começaram por ser 1120 mas, nos três primeiros anos, o número de alunos reduziu entre 20 a 30 por cento. Uma saída já esperada, reflexo das mudanças do território, na altura a estrear-se como região administrativa especial.

Nos últimos anos, tem existido uma certa estabilidade, com decréscimos anuais na ordem dos cinco a seis por cento. Cinco-dois-zero são os numerais que, juntos, compõem o número de alunos em 2007/2008. Ana Trigo faz parte deste grupo pela última vez. Está a terminar o 12o ano e decidida a estudar Direito no ensino superior. Deve ser “canja”, tendo em conta todos os prémios e menções que tem ganho nos últimos anos como melhor aluna de quase tudo.

Este ano lectivo ainda não terminou, mas já há muito que faz saudades. “É difícil. Cada vez que há um dos eventos anuais da escola, como o dia do mandarim, do inglês, ou de declamação de poesia, penso sempre: ‘é o último, para o ano já não terei isto’”, lamenta Ana Trigo. Numa corrida contra o tempo, neste último ano, Ana deu tréguas a algumas das muitas actividades a que se dedicava nos tempos livres, como o clube de jornalismo ou a pintura em porcelana, de forma a passar mais tempo com os amigos, antes da separação. Assim, passou a frequentar “apenas” os escuteiros, as aulas de guitarra, as aulas de canto e as reuniões da comissão de finalistas.

Dez anos depois, Ana Trigo não esquece o que pensou ao estrear a Escola Portuguesa. “Eu estava na quarta classe, tinha vindo do antigo liceu e lembro-me desta escola estar mais próxima, era mais rápido chegar todos os dias. Estranhos eram também os uniformes, já que antes só tínhamos uma bata. Lembro-me do polo e do vestido e de pensar: ‘o que é isto?’”, relembra Ana ao mesmo tempo que reconhece que ambas as coisas lhe agradam. Como quase tudo, aliás.

Tiago Terra não tem tantas recordações antigas da escola. Pudera, não só é mais novo, como chegou há apenas quatro anos ao território. Mas, o efeito Escola Portuguesa foi imediato. Começou a escrever, mais do que alguma vez tinha feito. “Macau deu-me logo muita inspiração porque é uma terra muito diferente de Portugal. A escola também tem influenciado a escrita. Aqui aprendemos muito e gosto da diversidade dos alunos, somos de diferentes cantos do mundo”, orgulha-se. Na realidade, convivem na escola, para além da portuguesa, outras quinze nacionalidades que representam 20 por cento dos alunos, sobretudo de países de língua oficial portuguesa.

Quatro anos depois, Tiago Terra nos 14 e a frequentar o oitavo ano, já vai no terceiro livro. As personagens principais têm bastante de familiar. A principal chama-se Tiago, “supostamente sou eu”. A acompanhar as aventuras está sempre Professor X, um cientista inspirado no professor Pedro Xavier, que tenta salvar o mundo através de uma fórmula. Três histórias, diferentes cenários. Portugal, Badajoz, Amazónia e Egipto foram os locais dos três primeiros livros. Macau poderá ser o próximo. Durante o próximo Verão, Tiago Terra vai começar a escrever a nova aventura e deixa no ar a possibilidade de levar para a sua história alguns colegas e professores da Escola Portuguesa.

Nessa altura, Ana Trigo já se terá despedido da EPM. Impossível será esquecer. “A escola é como uma família, conhecemo-nos todos, mesmo os pequeninos. No meio dos casinos e tantos turistas, é como se fosse uma pequena ilha, rodeada destas modernices todas”, afirma, enquanto se recorda daquelas tardes em que não tinha nada para fazer em casa e ia até à escola para estar com os amigos. Definitivamente, Ana só pode ser fã.

 

3. Memórias frescas

 

Amizade, amor, respeito e dinamismo. Sem hesitações, João Caetano classifica com estas quatro palavras a escola que o acompanhou até ao 12o ano. As memórias ainda estão frescas, afinal, foi só em 2007 que concluiu o 12o ano e partiu para a Universidade de Chichester, Inglaterra, onde estuda música. “Um dos momento mais fortes foi a homenagem que me fizeram em Junho do ano passado. Vai ficar para sempre a despedida dos colegas e dos professores”, lembra João, aluno revelação do passado ano lectivo. É o tal amor e respeito de que fala. Quanto à amizade e ao dinamismo, lembram, por exemplo, a viagem de finalistas, “o momento alto da vida escolar, sempre na Tailândia, como manda a tradição”.

António Conceição, ou melhor, Kiko, já saiu da EPM há cinco anos. Tem, por isso, lembranças ainda dos tempos em que imaginar o Grand Lisboa era coisa de adivinho. “No primeiro ano, estranhei a localização da nova escola, com aqueles casinos, o DD e o Pacapio logo ali. Uma das imagens que tenho é do tempo que passávamos no Campo dos Operários, que escapava a tudo isso. Íamos durante os intervalos, antes ou depois das aulas. Era também um sítio para muitos experimentarem os cigarros”, lembra com um sorriso.

Kiko está a terminar o curso de som e imagem, com especialização em Cinema e Televisão. Quando começou, foi inevitável não fazer comparações. “A preparação na Escola Portuguesa é deveras diferente do que muitas escolas de Portugal. Para além do papel pedagógico, havia uma ligação especial entre os alunos e certos professores. Eles davam-nos um abanão para fazermos algo para além dos trabalhitos, para termos outros tipos de recompensas”, explica Kiko, da mesma forma que acrescenta que as escolas de Portugal nem sempre sabem como motivar e integrar os alunos na vida escolar.

João Caetano não podia estar mais de acordo: “a EPM é um exemplo para as comunidades portuguesas no mundo. A escola está empenhada no aproveitamento dos alunos, ajuda-nos a olhar para a vida de maneira diferente e no sucesso que procuramos para o futuro”. Apaixonado pela música como pelos professores, João não esquece o carinho que “eles nos dão ao longo do ano que é uma grande recompensa para nós e faz com que nos dediquemos mais à escola e a divulguemos em Macau”. E em matéria de divulgação, João Caetano realça o papel da EPM na comunidade, nomeadamente quando participa, através dos seus grupos, na Festa da Lusofonia ou nas actividades do antigo Leal Senado, actual IACM.

“Na minha escola, juntava-se tudo no mesmo pote, portugueses, macaenses e chineses. Espero que hoje a escola continue a ser um guia para a junção destas diferentes realidades de Macau, um espaço de convivência que incentive e mostre o quão diverso o pequeno Macau é”, assinala António Conceição, aliás, Kiko.

 

4. Mestres para ficar 

 

Tem fama de ser estável, o corpo docente. Os dados confirmam também o proveito. De facto, são muitos os professores que acompanham este projecto educativo desde o início. Segundo a presidente da direcção, isto faz parte do sucesso. “Um corpo docente estável, que dê continuidade aos projectos. Temos tido muita sorte. Os nossos professores são muito especiais porque têm que conhecer os nossos alunos, numa escola que é multicultural. Eu presto homenagem aos professores da Escola Portuguesa, que têm dado o seu melhor”, elogia Edith Silva que ainda dá nota dez à disponibilidade e à dedicação dos professores, nomeadamente nas actividades de fins-de-semana e férias.

Pedro Lobo é um desses professores que estreou a escola e, como muitos outros, sente-se todos os dias em casa. “Somos uma grande família, conhecemo-nos muito bem. Isto não pára, são 24 horas a rolar, às vezes aos fins-de-semana também temos actividades da escola. Não é um local de trabalho como os outros. Passo 12 horas por dia na escola, mais do que em casa”. E não se queixa Pedro Lobo, professor de informática.

Uma família, segundo Pedro Lobo. Uma relação de “pais e filhos” refere Cristina Street, professora de português desde 1999. Os professores não precisam de combinar entre si para traduzirem a escola de forma semelhante. “A escola faz parte de nós, é inerente à forma de estar. Lá passamos o dia todo, dentro de ‘quatro paredes’ com alunos, professores e funcionários. Convivemos juntos muito tempo, somos pais, irmãos, amigos e confidentes”, realça Cristina.

Tamanha ligação familiar reflecte-se no relacionamento entre professores e alunos. “Há alunos que têm os nossos números de telefone, o que seria impensável em Portugal. Fora da escola, cruzamo-nos com eles frequentemente, na rua, no cinema, no supermercado”. Para Cristina Street, é assim que vai crescendo a tal relação próxima e de preocupação, como entre pais e filhos. Pedro Lobo concorda e acrescenta: “Há uma cumplicidade até fora da escola. Por exemplo, se estivermos num café sentamo-nos juntos e os alunos brincam connosco”.

Uma década passada, a primeira responsável da Escola Portuguesa reconhece que houve momentos melhores e piores, mas dá uma nota positiva ao balanço dos dez e declara “missão cumprida, aquilo que prometi, uma escola de prestígio e de qualidade, está feito. Eu falo com emoção dos dez anos da escola porque, muito provavelmente, fui a primeira pessoa a ser contratada. Eu, no dia 1 de Maio de 1998, comecei a trabalhar para a escola. Era preciso preparar tudo para iniciar a 1 de Setembro e eu assumi este encargo de montar a escola. É com carinho que falo, é uma emoção olhando para a história. Nunca esperei ficar aqui até hoje”, confessa Edith Silva, que recorda as sombras da incerteza que pairavam sobre o estabelecimento nos primeiros anos de existência.

 

5. Apoio à educação

 

Somando os administrativos e auxiliares, são 24 os funcionários da escola. Tal como o corpo docente, primam pela estabilidade. Por tradição, só saem por vontade própria mas, ultimamente, esse desejo tem-se manifestado algumas vezes. De facto, a instituição não está imune às transformações do mercado de trabalho local e nem sempre consegue segurar os funcionários auxiliares.

Dez anos depois, do grupo de profissionais que inaugurou o ano lectivo 98/99, ainda estão na Escola Portuguesa 33 pessoas, entre membros da direcção, professores, pessoal administrativo e auxiliar. Marina Pacheco faz parte do grupo pioneiro. “Um de Setembro de 1998, não se esquece. Na verdade, não foi uma grande mudança para mim porque eu antes trabalhava no liceu. Não só continuei a trabalhar na secretaria como conhecia muitos dos que vieram trabalhar para aqui, assim como os alunos. Parecia o liceu antigo, não mudou muito, até os professores eram quase todos do Liceu e da Escola Comercial”, relembra Marina Pacheco, chefe de secretaria da Escola Portuguesa. Gosta. “Dez anos depois, se quero ficar? E porque não?”

Rosa Fernandes também gosta “do ambiente, de estar com as crianças, passo o dia com elas e estou mais perto das minhas filhas que também estudam aqui. É giro vermos misturados os miúdos de todas as idades. Olhamos para os mais pequeninos e vemos o futuro, vemos uma vida”. Foi há seis anos que a secretária da direcção começou a trabalhar no estabelecimento de ensino, acabadinha de regressar de Portugal. “A adaptação foi fácil. Sabe porquê? Eu já era secretária antes e, além disso, tinha sido aluna da Escola Comercial que funcionava neste mesmo local e onde o meu pai também tinha trabalhado. Esta não era uma escola estranha até porque ainda encontrei professores que me tinham dado aulas como Pedro Xavier e Maria Farinha Simões”, refere com alegria na voz.

 

6. Edifício crescente

 

Durante a visita oficial a Macau colocou a primeira pedra da segunda ala da Escola Portuguesa. António Guterres, na altura primeiro-ministro português, deu assim início simbólico às novas instalações, a 18 de Abril de 1998. A escola, porém, assume o 10 de Junho (Dia de Portugal, de Camões e das Comunidades Portuguesas) como data oficial de nascimento. As aulas chegariam a 1 de Setembro de 1998, apenas no edifício da antiga Escola Comercial Pedro Nolasco da Silva, dado que a nova ala foi concluída em 1999, onde foram instalados o ensino secundário e os laboratórios.

Centenas de alunos a usar as instalações deixam muitas marcas. Não é de estranhar, por isso, que ao longo da década, a EPM tenha feito contínuos melhoramentos nos edifícios, no ginásio e no campo, com uma “mãozinha” do governo da RAEM. A Direcção dos Serviços de Educação e Juventude (DSEJ) de Macau dá subsídios aos projectos do escola, à aquisição de material didáctico e às obras.

Por ser inovadora, a sala de informática é passagem quase obrigatória para as visitas, que ainda poderão conhecer o novo laboratório de línguas ou a sala toda equipada pela DSEJ, onde funcionam os três cursos de ensino técnico-profissional.

Segundo a presidente da direcção, a inovação está ainda “nos quadros interactivos, montados em quase todas as salas de aula, coisa que poucas escolas devem ter”. Não basta o equipamento, é preciso usá-lo, por isso, há formação para os professores, que abrange também o uso do computador portátil que foi atribuído a cada um deles, mais uma vez, através da DSEJ.

Talvez por ser a mais recente e muito assediada pelos alunos, a menina-dos-olhos da escola é a sala de leitura Infante D. Henrique, aberta no final de Janeiro de 2008, no arranque das comemorações do 10º aniversário.

Por tudo isto, Edith Silva nem hesita, “temos algum orgulho nas nossas instalações que são boas, em qualquer parte do mundo. Não somos nós que dizemos, são as pessoas de fora que nos visitam, inclusivamente a ministra da Educação portuguesa Maria de Lurdes Rodrigues, o secretário de Estado, Jorge Pedreira, ou o próprio primeiro-ministro português, José Sócrates”.

 

7. Extracurriculares

 

Usando a expressão de um aluno, “há tudo e mais alguma coisa”, relativamente às actividades extracurriculares. Ainda bem que os estudantes reconhecem, já que é a pensar neles que elas existem. As actividades, só no ano passado, foram mais de 200. “São eventos desportivos, culturais e visitas de estudo. Uma escola tem que ter actividades extra, não é só estudar, nem só dar aulas”, defende Edith Silva.

No campo das letras, o espaço é ocupado pelo ‘Tempus & Modus’, o jornal da escola feito por alunos e professores do Clube do Jornalismo. A publicação trimestral, regista as infindáveis actividades da escola, nomeadamente os torneios de futebol, basquetebol, voleibol, por vezes realizados para todo o universo escolar da RAEM. Os campeonatos ou concursos  escolares são promovidos pela DSEJ ou por associações privadas e a Escola Portuguesa tenta estar em todos. Como na dança e na declamação. “O objectivo não é o troféu, é sobretudo o convívio com os alunos das outras escolas. A Escola Portuguesa não é uma ilha, não queremos ser um gueto, nós somos uma escola particular como outra qualquer da RAEM”, faz questão de lembrar a presidente do estabelecimento, cujos alunos podem ganhar a oportunidade de estudar mandarim na China, inglês na Austrália e até português em Portugal, em cursos de Verão.

Com tantas culturas a viver numa escola só, ao longo do ano, alunos e professores têm um calendário diversificado a festejar. Há dias de mandarim, inglês, francês, filosofia, declamação de poesia ou música. Existem ainda as festividades religiosas, no mínimo a duplicar. “Actividades não faltam nesta casa. Tudo o que é festa nesta terra, quer seja chinesa, quer seja portuguesa e até de outras culturas como o Halloween, e o Carnaval”, afirma Edith Silva. A presidente reconhece que tanta festa é igualmente uma forma do estabelecimento se mostrar à terra. “Em dez anos, a escola marcou presença no território. Somos visíveis, as pessoas sabem o que nós somos”. São visíveis, por exemplo, através do teatro, das tecnologias, da ginástica, da banda, do grupo de percussão ou através do vídeo, como aliás é exemplo o mais recente trabalho desenvolvido por alunos do sétimo ano. “Macau Só Vídeo”, um filme sobre o património de Macau. Nota de destaque também para o CD e o filme realizados pelos alunos, sob a direcção de Fabrizio Croce.

 

8. Pais e filhos

 

Já existia mesmo antes do nascimento da Escola Portuguesa. Começou por ser a Associação dos Pais dos Alunos do Complexo Escolar, que funcionava no edifício do actual Instituto Politécnico. Com o nascimento EPM, a associação teve que dar a volta aos nomes. Passou a representar as escolas com ensino em língua veicular portuguesa, mais tarde adoptou o nome actual, mas só em 2005 se concretizou a mudança no papel. No entanto, as preocupações relativas à Escola Portuguesa têm também uma década. “Em 1999, com a incerteza do futuro e com a saída de muitos portugueses, fizemos um movimento para a continuidade da Escola Portuguesa. Lançámos um website e enviámos um fax ao presidente da República Portuguesa no qual apelávamos à manutenção do estabelecimento, independentemente do número de alunos e professores que cá ficassem”, recorda Oliveira Paulo, actual presidente da Associação dos Pais e Encarregados de Educação dos Alunos da Escola Portuguesa. Apesar da preocupação, ficaram mais do que os esperados, para alívio de todos.

Pai de três filhas, Oliveira Paulo acompanha a associação desde meados da década de 90. Conhece, por isso de cor, as dores de cabeça dos pais, inclusivamente no tempo dos seus antecessores, Gabriela César e Fernando Gomes.

O corrente ano marca também o fim do segundo e último mandato de Oliveira Paulo à frente da associação. O princípio do próximo ano lectivo coincide com as eleições. Das três, já só uma das filhas de Oliveira Paulo estuda na Escola Portuguesa.

 

9. Nuvens cinzentas

 

Currículo, instalações e financiamento. As três disciplinas com menor aproveitamento durante a última década. Logo à nascença, em 1998, era incerto o futuro da Escola Portuguesa, devido à transferência de administração e ao regresso de muitos portugueses ao país de origem. Prova superada, mas, cerca de cinco anos passados, surgiu um novo quebra-cabeças, ligado ao projecto educativo e à introdução do cantonense ou mandarim. A solução chegou logo no ano lectivo de 2005/2006, com a introdução do inglês e do mandarim desde o primeiro ano de escolaridade.

A primeira pedra do vizinho Grand Lisboa fez soar de novo o alarme. A mudança de instalações foi equacionada e resultou num acordo entre o Ministério da Educação de Portugal e Stanley Ho, anunciado logo nos primeiros dias de 2005. Cerca de 280 milhões de patacas foi quanto o magnata do jogo estava disposto a dar para a saída do estabelecimento de ensino da Avenida Infante D. Henrique. “Perante o facto consumado, fizemos várias reivindicações para o novo edifício. Pedimos aquilo que já tínhamos usufruído no antigo complexo escolar: piscina, ginásio, campos desportivos e laboratórios”, explica Oliveira Paulo, presidente da Associação de Pais dos Alunos da Escola Portuguesa.

Em 2006, foi apresentado o projecto do arquitecto Vicente Bravo para a ex-futura Escola Portuguesa que teria morada na Taipa e também daria tecto ao Jardim de Infância D. José da Costa Nunes. Todos de acordo, menos os moradores da área, convictos, desde o tempo da administração portuguesa, de que seriam vizinhos de um jardim.

Primeiro Taipa, depois Macau, na zona da Barra e no antigo Hotel Estoril. Nada disso, porém, chegou a passar de hipótese. “As soluções seguintes eram minimalistas, não satisfatórias. As actuais instalações são de qualidade. Se fosse para mudar, só para melhor”. Essa tem sido, de resto a promessa de vários responsáveis pelo projecto, como Roberto Carneiro, presidente da Fundação Escola Portuguesa (FEPM), Sales Marques administrador da FEPM, Moitinho de Almeida, cônsul-geral de Portugal na RAEM e Maria de Lurdes Rodrigues, a ministra da Educação de Portugal. Aqui há unanimidade: mudar, só para melhor. Se vai haver mudança e quando são questões a que ninguém sabe, por agora, responder.

A internacionalização do ensino foi também matéria avaliada, tendo sido encomendado um estudo a Ruben Cabral, reitor do Instituto Inter-Universitário de Macau. Para os pais, internacionalizar não passa apenas pela língua, abrange igualmente o restante currículo, como defende Oliveira Paulo. “Isso iria abrir a escola a outras comunidades para além da portuguesa, o que poderia assegurar a viabilidade financeira da instituição. A escola é de qualidade, mas nós queremos uma de excelência.” E já agora com mais alunos, de diferentes proveniências, e currículos mais adaptados à realidade local. Para agradar aos que querem ficar e aos que vão.

A comunidade escolar aguarda agora os novos desenvolvimentos quanto às declarações de Carlos Monjardino, que em Fevereiro de 2008, afirmou querer “racionalizar mais” o apoio da Fundação Oriente ao funcionamento da Escola Portuguesa.

 

10. Festa rija

 

Para celebrar os 10 anos, a Escola Portuguesa não pensou pequeno. O grande auditório do Centro Cultural foi o local escolhido para o sarau cultural do dia 7 de Junho, a maior das celebrações agendadas. Mais de mil lugares na plateia que tornaram bem maiores o desafio e o risco do espectáculo. De tal forma que, um mês e meio antes, os professores envolvidos na coordenação pouco ou mal dormiam. “A ideia era recuperar os momentos inesquecíveis que se passaram na Escola Portuguesa desde o seu primeiro ano até agora. Momentos passados pincelados com actuações novas”, clarifica Cristina Street, professora de português e um dos elementos do grupo de coordenação do evento. Do passado foi recuperado, por exemplo, um excerto de uma peça de teatro escrita por uma antiga aluna. Num espectáculo feito à imagem de gente grande, com mais de duas horas de duração e ensaios rigorosos, participam cerca de 300 alunos. Dividem-se entre coreografias, pequenas dramatizações ou canções e outras interpretações musicais. Incluídos também no programa da festa estão os vencedores do concurso de poesia deste ano.

Os momentos, do passado e do presente, são trilingues, dado que, para além da portuguesa e da inglesa, também se fala e canta a língua chinesa. Os alunos ensaiaram canções e poemas em mandarim, assim como coreografias ao som de músicas escritas na língua de Confúcio.

O aniversário não se esgota no sarau cultural, uma vez que o programa das festas oficialmente iniciou-se a 1 de Janeiro e só termina a 31 de Dezembro, sob o lema “Ao Sabor das Memórias – 10 anos de vivências na Escola Portuguesa de Macau”. Assim, 9 de Junho é dia de rever a história através de uma exposição, sobretudo fotográfica, e de um livro comemorativo da data.

Inauguração e lançamento feitos em simultâneo, também na presença dos administradores da Fundação da Escola Portuguesa, para que a memória não caia no esquecimento.

João Caetano já não faz parte do grupo de alunos da Escola Portuguesa. Pelo menos oficialmente.

O agora estudante do ensino superior não perde uma e, por isso, regressa a tempo para fazer parte do sarau cultural de 7 de Junho. “A escola perguntou se queria estar no espectáculo e respondi que sim, pois também queria participar. Estou disposto a fazer tudo, sobretudo a actuar com a banda e o grupo de percussão”, remata com o entusiasmo habitual de quem se orgulha de ter passado pela Escola Portuguesa de Macau.