A escola para o multiculturalismo

Instituto Inter-Universitário aposta na investigação e na captação de alunos estrangeiros

 

Começou por ser uma escola de pós-graduações, com poucos estudantes, mas rapidamente se transformou numa das mais pujantes universidades da RAEM. Nos últimos anos o Instituto Inter-Universitário de Macau (IIUM) multiplicou as ofertas curriculares, passou a oferecer 21 licenciaturas e programas, incluindo o pré-universitário, 16 mestrados e nove opções ao nível do doutoramento.

Os cursos disponíveis são de áreas diversas, do Design aos Estudos Religiosos, passando pelos Estudos Governamentais, Psicologia e Estudos Lusófonos, entre muitas outras opções.

No corrente ano lectivo estão inscritos cerca de 1200 alunos. Em Setembro próximo, calcula o reitor da instituição, Ruben Cabral, deverão frequentar o IIUM 2000 estudantes, divididos entre os diferentes níveis de ensino. “O tecto que nós queremos para a nossa universidade é de 2200 alunos, não mais do que isso.” É essa a capacidade do novo campus, que está a ser construído e deverá entrar em funcionamento no próximo ano.

A dimensão da universidade prende-se com a orientação pedagógica que tem. Com uma aposta clara na investigação, o IIUM transporta o conceito reservado, por norma, aos académicos, para os alunos que iniciam a sua vida universitária. “O número de aulas de cátedra é muito pequeno e toda a universidade assenta numa estratégia de resolver problemas, fazer projectos, estimular os alunos a investigarem”, explica o vice-reitor para a Investigação e Relações Internacionais, Ivo Carneiro de Sousa.

Mas a dimensão da instituição está ainda relacionada com outra componente que, para o IIUM, é imprescindível neste tipo de estabelecimento de ensino: “a dimensão humanista e cristã”, como vinca o pró-reitor Luís Sequeira.

Nesta lógica, continua o jesuíta, “destaca-se a preocupação pelo apoio e acompanhamento personalizado, que é algo que as grandes universidades terão dificuldade em fazer”. O IIUM, garante Luís Sequeira, preocupa-se com “a formação intelectual, sendo que esta é acompanhada por uma dimensão pessoal forte em liberdade, criatividade e dinamismo.” Crescer muito seria sinónimo de perda do “sentido da pessoa”.

 

Salas de aula viradas para o mundo

 

Com uma forte ligação à Universidade Católica Portuguesa, o IIUM congratula-se por ser uma “faculdade europeia internacional”, uma da “identidades” apontadas por Ivo Carneiro de Sousa para descrever o projecto.

A identidade europeia está na sua raiz e no modelo adoptado ao nível dos cursos, feitos à semelhança do previsto no Acordo de Bolonha. “As licenciaturas adaptaram-se já em termos de organização modular e de créditos”, que podem ser transferidos na esfera dos países que adoptaram o acordo.

O lado internacional faz-se através do corpo docente, com professores das mais variadas origens, e principalmente pelos alunos. O Instituto tem vindo a trabalhar no sentido de alargar as suas redes de contactos e de cooperação ao nível internacional. A comunicação com instituições académicas do espaço lusófono é uma das apostas.

“O panorama étnico dos alunos é muito diversificado: temos alunos da Nigéria, do Irão, de países europeus e vão chegar cerca de vinte alunos do Brasil para estudarem connosco”, afirma Ruben Cabral. “Desde o princípio sempre quisemos que esta universidade tivesse cerca de trinta por cento de alunos de Macau, trinta por cento da China Continental e outros tantos alunos internacionais.”

Ivo Carneiro de Sousa acrescenta que, neste momento, há já “dezenas de nacionalidades” dentro da universidade: alunos do Paquistão, da Índia, de Timor-Leste, de São Tomé, da Guiné-Bissau, da Guiné-Conacri, do Mali, de Moçambique, da Nigéria e de Angola. “Temos mais de 20 alunos do Myanmar e estudantes do Vietname e de Singapura. Estamos a fazer os primeiros contactos com o Vietname e o Camboja”, acrescenta o vice-reitor.

“Estamos a desenvolver sistematicamente a cooperação com os países de expressão portuguesa. Queremos ser realmente internacionais, não apenas de nome mas na prática”, acrescenta o docente.

A diversidade cultural é “deliberada” e tem as suas consequências, nem sempre positivas. “Temos que lidar com problemas mais ou menos abertos de diferenciação étnica e cultural que às vezes são um pouco mais agressivas do que outras”, conta Ruben Cabral.

Porque os ambientes multiculturais, com as suas diferenças em termos de hábitos, tradições, idiomas e religiões, não nasceram perfeitos, a escola integra cadeiras específicas para aprender a viver e a conviver com a diferença. “Temos uma estratégia em que todas as licenciaturas partilham determinadas disciplinas, como “World Lab”, “Life Lab”, “Knowledge and Humanity”. São cadeiras pensadas para se trabalhar a diversidade cultural”, vinca Carneiro de Sousa.

Os cursos são todos ministrados em inglês mas há duas línguas de aprendizagem obrigatória para todos os alunos: mandarim e português. Através do ensino destes idiomas pretende-se dotar os alunos de instrumentos de comunicação que lhes permitam perceber mais mundos além daqueles de onde vêm.

 

Em contacto com a comunidade

 

Dentro daquilo que são as ofertas ao nível do ensino universitário em Macau, o IIUM distingue-se pela abordagem pedagógica que tem, e que faz com que tenha uma “identidade ao nível da investigação”, não só na forma como as aulas são conduzidas, como também em trabalhos de pesquisa.

Esta componente forte de investigação traduz-se numa relação com a comunidade. Para começar, as pesquisas feitas estão vinculadas a questões sociais; além disso, o Instituto abre com frequência as suas portas à comunidade, através da realização de seminários e de frequências.

“A nossa actividade pública decorre directamente dos centros de investigação. Algumas dessas actividades estão ligadas a redes internacionais em que sistematicamente nos temos vindo a introduzir”, explica Ivo Carneiro de Sousa. Porque “não é possível ser competitivo em todas as áreas”, prossegue, a universidade entendeu concentrar esforços nalguma.

Assim, a investigação que está a ser feita debruça-se sobre os impactos do processo de globalização na região onde se encontra e a “mudança social”, onde se incluem o processo de transição demográfica e a mudança climática.

Esta vertente da investigação aplica-se a todos os programas. O vice-reitor dá um exemplo: “O curso de Arquitectura, que começa em Setembro, vai estudar essas mudanças sociais”.

Depois, a aposta na área da investigação permite ainda estar em contacto com o mundo e desenvolver o conceito de participação. “Todos estes seminários têm a ver com a mobilização. Não temos qualquer tipo de tabu, discutimos tudo”, vinca Carneiro de Sousa.

Para este ano estão já planeados vários seminários, com destaque para a crise económica. O IIUM vai também fazer o balanço da Região Administrativa Especial de Macau, nos dez anos do seu estabelecimento, com conferências sectoriais que pretendem mostrar perspectivas nem sempre tidas em conta. “Algumas pessoas vão fazer balanços do que se publicou em dez anos, nas Artes, nas Ciências Sociais… Essas partes que parecem mais escondidas mas que são essenciais para perceber a sociedade.”

Da lista de planos para as conferências abertas ao público faz ainda parte um conjunto de iniciativas sobre o planeamento urbano.

 

Ensinar a duvidar

 

Na perspectiva puramente pedagógica, o IIUM também sobressai por ter optado por uma metodologia de interactividade a vários níveis. “As estratégias pedagógicas são baseadas numa metodologia interactiva entre os próprios alunos, entre os alunos e os professores, e entre o ambiente académico e a comunidade exterior”, resume o vice-reitor José Alves.

“Os alunos têm que aprender a funcionar de forma independente mas nos grupos onde estão inseridos nas salas de aula, com os professores e com o meio exterior, com as empresas e as organizações não governamentais com que estamos a iniciar projectos”, acrescenta.

A universidade afasta assim o tradicional método de ensino em que o professor chega à sala de aula, debita matéria que o aluno memoriza com o objectivo principal de passar no exame. “Uma da coisas que nos propomos fazer é desafiar os alunos para que questionem, para que ponham em causa aquilo que se julga saber”, sublinha Ruben Cabral.

É o conceito “viver no fio da navalha em termos de ciência, questionar constantemente, porque não há respostas científicas, só há perguntas científicas”, algo que “é fundamental” para o reitor.

Ruben Cabral salienta ainda a forma como o conhecimento está estruturado. “As licenciaturas não são especializações, não faz sentido. O aluno que está a tirar Design tem cadeiras de Filosofia, de Psicologia, de Religião, porque temos que conceber a fase do pós-secundário como um aprofundamento da cultura geral, daquilo que se sabe”, diz, defendendo que “a concentração profissionalizante começa, sobretudo, no mestrado”.

 

O reconhecimento internacional

 

Quem estuda no IIUM tem a garantia de que não terá problemas com o reconhecimento do seu curso dentro ou fora de Macau. Além disso, tem uma ligação com a Universidade Católica Portuguesa (UCP) que é sinónimo de credibilidade.

Embora o goze de total autonomia, o reitor do Instituto é nomeado pela UCP. “Todos os diplomas, graus académicos e certificados são dados automática e conjuntamente por nós e pela Universidade Católica”, afirma Ruben Cabral. Trata-se de uma “mais-valia tremenda, porque a UCP não só tem acreditação na Europa, como ao nível internacional”.