A estética das cores na ópera de Pequim

Quem não se recorda das faces pintadas da ópera de Pequim (jingju 京劇)? A cor e o desenho do rosto ajudam a identificar os personagens: se são bons, se maus, se apenas astutos ou inofensivos. A cor na ópera de Pequim exprime sentimentos, maneiras de ser. Também nas faces pintadas, pela conjugação das cores, se […]
A estética  das cores na ópera de Pequim
Quem não se recorda das faces pintadas da ópera de Pequim (jingju 京劇)? A cor e o desenho do rosto ajudam a identificar os personagens: se são bons, se maus, se apenas astutos ou inofensivos. A cor na ópera de Pequim exprime sentimentos, maneiras de ser. Também nas faces pintadas, pela conjugação das cores, se encontra o melhor e o pior de um carácter e, portanto, as suas virtudes ou defeitos morais. O vermelho, que na primeira filosofia chinesa, a do Clássico das Mutações, era essencialmente feminino, nos falava da alegria e da vivacidade própria das filhas mais novas e dos lagos ou pauis, passa a ser, na ópera de Pequim, uma virtude identificada tradicionalmente com o mundo masculino, pois simboliza a coragem e a lealdade. Do ponto de vista do sentimento, representa a coragem guerreira. Também o roxo corporiza as virtudes da coragem e da lealdade. Na mãe preta, égua ou búfalo maternal, vemos virtudes como a seriedade e a integridade, que estamos habituados a encontrar na simplicidade telúrica.
O branco na Ópera de Pequim assume uma faceta negativa, já não é o pai criativo, o berço de todas as cores, mas denota o engenho manhoso e, por vezes, até a crueldade. Quanto ao amarelo, associado ao raio e à máxima energia no Clássico das Mutações, liga-se na ópera à brutalidade, mas atenção que não se pode confundir o amarelo com o dourado, uma cor muito utilizada em deuses e no mundo espiritual. O verde do Vento do Clássico é ainda lido em termos de movimento, porém na sua faceta mais agressiva, porque agora em vez da delicadeza e da flexibilidade se fala em pressa e falta de auto-controlo. E o azul, cuja principal característica no Clássico é o abissal, mantém na ópera a faceta de natureza mais selvagem, frequentemente representada pelo fora-da-lei.
Pode-se arriscar a seguinte interpretação: a leitura estética das cores leva até às últimas consequências a filosófica: as cores assumem várias facetas, estando sujeitas a uma dupla leitura: no campo masculino e no campo feminino. Assim o vermelho do lado feminino simboliza a alegria e o casamento, do lado masculino, a lealdade e a bravura do guerreiro. O preto maternal tanto representa o apagamento e a tranquilidade, como a seriedade, a integridade e o mistério, associado à figura do sacerdote. O amarelo assume-se como a força bruta e natural do raio telúrico, ou como o máximo de poder de movimento e transformação, sendo na sua faceta positiva susceptível de aproximação ao dourado, que figura o mundo da luz espiritual. O verde pode ser a suavidade e a gentileza femininas ou a agressividade e pressa masculinas. O azul, enquanto força espontânea, pode representar a feminilidade abissal, ou na sua faceta masculina, aquele que não consegue integrar-se na ordem estabelecida. O mesmo sucede ao branco, que é a cor pai e masculina no Clássico das Mutações, e a feminina na geomancia (fengshui 风水), porque o tigre, elemento totalmente yin, representa o Oeste e a morte.