A moda segundo Conceição Júnior

Conhecido pelo seu rico e multifacetado contributo para as artes em Macau, o que incluiu o design de moda, o consultor de arte António Conceição Júnior será, provavelmente a personalidade mais indicada para descrever o fenómeno da moda e o fascínio que esta causa pelas ruas da cidade.
A moda segundo Conceição Júnior
Tendo começado a “fazer design de moda em 1990, desafiado pelo então governador Carlos Melancia”, Conceição Júnior acabaria por ver o seu valor reconhecido a nível nacional ao tornar-se consultor honorário de moda em Pequim e Dalian. Movido pela necessidade de autenticidade em vez da preocupação de seguir as tendências, ou como lhe chama o próprio “importações estéticas”, foi aos 39 anos que se lançou neste projecto. “Comecei a gizar um projecto que, em apenas quatro anos, originou um convite para ir até ao Festival de Moda em Pequim. Eu tinha conseguido convencer alguma indústria em Portugal a trabalhar comigo, na minha condição de criador, para uma apresentação então inteiramente comercial. Dizem que foi a melhor apresentação do evento.”
É toda a esta experiência, durante a década de 1990, que fazem de António Conceição Júnior uma opinião a ter em conta sempre que se fala de moda em Macau.
Começa por lembrar que a moda tem, além do lado criativo e social, o seu lado economicista. Esta indústria, como lembra o criador, vive do mercantilismo associado à venda de marcas ou nomes.
No entanto, á que ter em conta outros factores. citando Coco Chanel, António Conceição Júnior afirma que a moda é “aquilo que está na rua”. “Aquilo que vemos vestido na rua, uma diversa complexidade que geralmente vagueia por uma década de pequenas variações antes de emergir um outro look que possa renovar a necessidade de comprar.”
Esta evolução vem sempre de cima, ou seja, das grandes capitais da moda, continua a explicar. “Milão, Paris ou Nova Iorque, a indústria já desenvolveu poderosos mecanismos que colocam a sua força gravitacional no Ocidente”, afirma respondendo à questão sobre as influências que a moda local recebe. Faz uma pequena viagem pelo tempo para lembrar que foi depois da Segunda Grande Guerra que todo este dinamismo se criou, tendo o mesmo acontecido com todas as grandes indústrias, de como são exemplos os automóveis e a aviação.
“O modo como a maioria das pessoas se veste em Macau relaciona-se directamente com o contexto sociocultural em que se inserem ou de onde são provenientes. No fundo cada pessoa veste-se segundo critérios de gosto muito específicos e que resultam dos legados culturais de que são portadores”, responde explicando o lado mais antropológico da questão.
Quando lhe perguntamos se sente que em Macau existem dois tipos de mercado, o de luxo e o “de rua” e em que estes diferem, Conceição Júnior confirma esta ideia. Segundo ele existem duas grandes influências para dois mercados diferentes. Se por um lado existe o novo-rico que quer ostentar a marca de luxo, por outro existe (no outro extremo) o mercado feito de interpretações de linhas mais asiáticas que não é mais do que “o modo como muitos autores japoneses e coreanos se apropriam das linguagens ocidentais e as adaptam.” É exactamente este segundo tipo que depois vai criando as inúmeras lojas e boutiques que se vêem pelas ruas da cidade onde “a roupa é escolhida ou até concebida e confeccionada pelos donos segundo padrões escolhidos pelos próprios”. Há ainda um último processo criativo, o do próprio consumidor, que vai mais uma vez interpretar as tendências e escolher a sua imagem.
O consultor de arte vê ainda um outro fenómeno tão nosso conhecido em Macau. Diz ele que, o fascínio do jogo traz à sociedade em geral uma espécie de fantasia que “apela ao sonho” e que tantas vezes faz como que o consumidor a confunda com a realidade. Vai ainda mais longe dizendo que é impossível fazer-se uma avaliação cultural pois “estamos perante um processo de aculturação que é o vestuário, a moda, se assim lhe quiser chamar”.
Quanto à pergunta “se há moda em Macau”, Conceição Júnior tem uma opinião forte e concisa. Na sua opinião a moda, como o cinema, “são antes do mais indústrias porque implicam linhas de montagem”. Nesse sentido, continua, é bastante claro que não existe tal coisa no território. Contudo, salvaguarda “fazer design, conceber, criar protótipos é uma coisa, é a proto-moda. Essa, sim, existe”.
Muito se pode dizer sobre a moda e o vestir nesta cidade. É na verdade uma miscelânea de influências. Nas palavras de António Conceição Júnior “Macau tem um segmento imenso muito curioso de influências do chamado cute, que é um pouco a cultura japonesa da Hello Kitty transposta para alguma roupa. São as tais aculturações indigestas.”