O homem que faz o que pode

O arquitecto José Forjaz está em Moçambique há quase 50 anos. Ganhou vários prémios internacionais e é autor de alguns dos principais monumentos de Moçambique. Para ele, a arquitectura tem como primeiro objectivo defender a espécie e a pessoa
O homem que faz o que pode

“Conhece a história do passarinho?” pergunta o arquitecto José Forjaz, recostado à sua cadeira de design, disposta ao longo da longa mesa de madeira, a um fim de tarde de Maputo.
A história conta assim. Vai um boi grande na estrada e encontra um passarinho deitado de perninhas para o ar. “O que estás a fazer, passarinho?”, pergunta o boi. E o passarinho responde: “ Ouvi dizer que o céu vai cair. E faço o que posso”.
José Forjaz conta a história a rir. Depois encolhe os ombros, e acrescenta. “Eu sou como o passarinho. Faço o que posso”.
O que mais critica na juventude da arquitectura é o vazio de ideologias. Nem precisavam de ser políticas, mas pelo menos sociais. Chegava uma preocupação, um pensamento, um fio que levasse os jovens arquitectos a verem a profissão não só como um desenho, como um amontoado de cimento, pedra e cal. Mas como um acrescento a uma ideologia social, a um querer que o mundo fosse um sítio melhor. José Forjaz faz o que pode, como o passarinho, em Moçambique.Não é um mecenas, nem um Robin dos bosques. Na arquitectura, tenta que o desenvolvimento sustentável seja prioritário. Um edifício pode confundir-se com a natureza, tanto pelo desenho como pelos materiais usados. O desenvolvimento e a ocupação do espaço não precisam de violar nem as pessoas, nem a natureza. José Forjaz faz o que pode, à sua maneira, com uma ideologia antiga de que todos temos o nosso lugar neste mundo e, sobretudo, de que o mundo tem de continuar depois de já não existirmos. A pérola do Índico conheceu-o quando tinha 15 anos. Não veio por querer, mas trazido pelos pais. Já cá estava a família toda, avós, primos. Faltavam eles.

Aos 18 anos foi para a Faculdade de Belas Artes do Porto, em Portugal, conhecida pelas suas ideias vanguardistas e pela intensa vontade de não se ficar pelos dogmas de outros. Mal acabou o curso, voltou homem novo. Foi para a Suazilândia, uma pequena monarquia encastrada entre Moçambique e a África do Sul. Deixou Moçambique e a guerra de lado. De lá, via o seu país a pedir, a querer cada vez mais a independência. E ele, também, a desejar a liberdade.
Quando chegou o dia 25 Junho de 1975, José Forjaz perguntou aos camaradas moçambicanos se precisavam de ajuda. Eles responderam que sim, que era um país a começar, agradecia-se a presença de todos os homens e mulheres que soubessem fazer.
O Monumento aos Heróis de Moçambique, elevado em 1977, e o projecto da casa de Samora Machel, o primeiro presidente moçambicano, foram feitos – quem diria? – por um português branco. “Eu era visto como pessoa. Uma pessoa válida, experiente e com fortes ligações a Moçambique. Não me viam nem como português, nem como branco”. José Forjaz tinha, na altura, 41 anos. África estava dentro dele há 26.

 

 

O conteúdo poético das coisas

 

A Editorial Caminho, que publicou o livro de Forjaz Entre o Adobe e o Aço Inox. Ideias e Projectos,  escreve assim: “Toda a sua actividade criativa tem sido sempre orientada no sentido de descobrir a expressão arquitectónica adequada às condições de transformação cultural e equilíbrio ambiental do meio, e nelas encontrar o seu conteúdo poético”.
Como é que um arquitecto encontra o conteúdo poético das coisas? Como o passarinho, como pode.
José Forjaz é um homem que fala pausadamente, pensando nas palavras, nas frases que diz. Sorri quando a pergunta termina, pensa na resposta.
Para Forjaz, a arquitectura assume valores muito diferentes, de acordo com o tipo de encomenda. Mas em todas, há que ter o sentido da preservação da espécie e do respeito pela pessoa.
A maneira como a luz incide sobre uma sala, directa ou indirectamente. A espessura das paredes. Tudo importa, tudo influencia o homem, a mulher, a criança que ali vive, trabalha, estuda, usa o espaço. As formas têm significado, têm simbologia.
No Centro Madre Teresa de Calcutá (2001), os últimos momentos de vida de um doente terminal estão resguardados da vista das visitas. Naquela sala onde a morte vem com o nome de HIV, nem a luz entra sem ser convidada, mas brilha sem ferir os olhos vazios de vida.
O Parlamento Pan-Africano (2007) é uma bola. Todo o projecto é feito de círculos, como se todos tivessem de dar as mãos, mesmo sem querer, para fazer a imagem geométrica perfeita.
A proposta para o parque de visitantes (2005) do Parque Nacional da Gorongosa, permite ver a fauna no mato, sem ser visto.
É a simplicidade de tudo. Sem grandes brilhos, ou adornos, sem folclores. Só jogos de luz e perspectiva.
O Monumento a Samora Machel (1999) canta.
A obra foi erguida no local onde o avião que levava Samora Machel e mais 33 pessoas se despenhou na região montanhosa dos Libombos, em Mbuzini, na República da África do Sul. O monumento é feito de uma plataforma em betão de onde saem 35 tubos de ferro, cada um com cerca de nove metros de altura, com fendas de diferentes tamanhos em diferentes sítios. Sob os tubos existe uma caixa de ar que serve de caixa de ressonância. E com o vento, o monumento murmura o presidente perdido, herói de todos os moçambicanos.
Ainda hoje, é uma das obras que José Forjaz elege como preferida. “Os projectos têm muitos valores e emoções associadas a eles. As nossas emoções, as emoções intrínsecas ao próprio projecto, o próprio conteúdo do projecto e a sua história. Mas se tivesse de dizer quais os que preferi era o Monumento a Samora Machel – que me ficou na memória por ser de uma grande tristeza e valor emocional -, e, por razões completamente diferentes, o Campus da Universidade de Botswana e Lesotho, na Swazilândia.”
No campus universitário, José Forjaz teve de pensar em espaços de lazer, residências, estudos, refeitório. “Era como desenhar uma pequena cidade, e organizá-la de maneira a ser confortável, prática e com capacidade para dar qualidade de vida a quem o utilizasse. Eu também era novo na altura, penso que isso também influenciou o meu entusiasmo.”
Tinha 40 anos. Hoje tem 73.

 

O que é bom fazer, e o que dói ver

 

o currículo, José Forjaz tem dezenas de projectos. O Monumento à Mulher Moçambicana, residências de representantes de organismos internacionais, de embaixadores e até de Chefes de Estado, pólos universitários e culturais. Entre esses desenhos que mudaram a vida de centenas de pessoas estão os trabalhos pro bono que José Forjaz faz para instituições de beneficência, simplesmente porque lhe pedem. Porquê? “Porque posso e não me custa nada. A maior dádiva que a humanidade tem é poder responder aos problemas do seu tempo.”

José Forjaz tem fama no país, e no mundo. Já escreveu livros, ganhou prémios internacionais. E ainda assim, presunção não tem nenhuma. Adianta logo que não trabalha sozinho, mas sim, com outros 14 arquitectos. Admite também que, mesmo trabalhando 80 horas semanais, precisaria de outras tantas para ler e estudar tudo o que gostaria.
Hoje em dia, o que mais o entristece é rever algumas das suas obras. Massacradas, desfalcadas, violadas. “Manutenção é uma coisa ainda pouco habitual neste país”. Ainda assim, pelo menos por enquanto, é o seu país. Quando lhe perguntamos se se sente moçambicano, responde que, cada vez mais, é um cidadão do mundo.Ou seja, onde quer que esteja, só quer é sentir-se bem. Por enquanto, é em Moçambique que ele faz o que pode para que a arquitectura sirva as pessoas, e não para que as pessoas sejam obrigadas a viver os espaços que lhes dão ou que devem ter.
As casas tradicionais moçambicanas são exemplo disso. São feitas da mesma forma, com os mesmos métodos e materiais, há séculos. Não se muda porque é tradicional, não se muda porque a pobreza é a mesma. As casas tradicionais moçambicanas, que hoje em dia só se encontram nas zonas rurais, são feitas de palha, adobe, trançado vegetal, entre outros materiais naturais. Embora o método e os elementos mudem de região para região, a base é a mesma: casas pequenas – com raras ou nenhumas janelas, sempre sem vidros – e folhas – de palmeira ou outras – a fazer de telhado. Embora seja uma arquitectura tradicional, José Forjaz diz que “há obrigação de dizer que as pessoas habitam mal”. As casas não têm ventilação, nem iluminação, têm muita humidade, não protegem as pessoas de mosquitos e outros insectos, que podem matar. “E as pessoas pagam o preço com uma mortalidade elevada, com uma esperança de vida na ordem dos 40 anos, com reumatismo, vermes intestinais, malária, etc.” Para Forjaz, habitar bem tem parâmetros universais. “Respirar um ar puro dentro de casa, ter espaço suficiente – mais de nove metros quadrados por pessoa -, não ter humidade, proteger do frio no Inverno e do calor no Verão”. José Forjaz sabe que não virá um milagre. Cerca de 80 por cento da população moçambicana vive nas zonas rurais e Moçambique ainda é muito pobre. Mas considera criminoso que, num país onde faz sol mais de 300 dias por ano, não se tenha explorado mais os colectores solares nesses sítios recônditos. A electricidade daria muito mais qualidade de vida às pessoas, já que anoitece às 18 horas praticamente o ano inteiro. José Forjaz aguarda pelo futuro, optimista. E até lá? “Conhece a história do passarinho?” pergunta o arquitecto José Forjaz, recostado à sua cadeira de design, disposta ao longo da longa mesa de madeira, a um fim de tarde de Maputo.

 

Chineses com maior capacidade de realização

 

José Forjaz acabou de fazer uma obra para a Presidência da República de Moçambique. A construtora era chinesa. E José Forjaz ficou espantado com a diferença. “São muito mais minuciosos, estão sempre em contacto comigo para ver se está tudo a correr bem, muito rápidos. Até agora, foi a melhor empresa com quem trabalhei, com maior capacidade de realização”.

De facto há cada vez mais construtoras chinesas em Moçambique. Entre as suas obras, estão o Centro de Conferências Joaquim Chissano, o Estádio Nacional do Zimpeto (ainda em construção),  a Procuradoria Geral da República, entre outros.

 

Festival junta falantes de português

 

Segundo dados do Instituto para os Assuntos Cívicos e Municipais (IACM), responsáveis pela organização do evento, cerca de 15 mil pessoas passaram pela Avenida da Praia, na zona do Carmo, na Taipa, durante os últimos três dias do Festival da Lusofonia, muitos provenientes de Hong Kong e do Interior.
Uma das novidades do evento foi a realização de uma Feira de Artesanato dos países de língua portuguesa.
O Festival é um evento que atrai a participação das diversas comunidades de língua portuguesa de Macau mas também desperta interesse das comunidades não-lusófonas e de turistas.
O festival inclui a realização de espectáculos musicais e, nos últimos três dias, de diversas iniciativas na zona do Carmo, incluindo a presença de tendas dos diversos países de língua portuguesa.