“A aposta no turismo é já irreversível”

Emanuel Almeida
O Turismo em Cabo Verde está em alta. Criadas as infra-estruturas de base, como portos e sobretudo aeroportos internacionais em várias ilhas, a fase seguinte é a “revolução” já em curso na legislação para trazer qualidade. Até ao final do ano, os dez “grãozinhos de areia” em pleno Atlântico tropical estarão dotados de toda uma organização que permitirá atrair mais turistas e mais investidores, que contarão com incentivos especiais. Além do tradicional mercado europeu, Emanuel Almeida, director-geral do Turismo de Cabo Verde, explica a aposta no mercado asiático, esperando que, em meados de 2013, para quando se espera a abertura dos primeiros casinos, os jogos de fortuna e azar possam trazer para o arquipélago o turismo de lazer e de jogo

 

Emanuel Almeida

 

Texto José Sousa Dias, da agência Lusa em Cabo Verde

 

Qual é o “estado de saúde” do turismo em Cabo Verde?

Estamos numa fase que podemos chamar de embrionária, mas também numa fase em que já não podemos dar a volta, é irreversível, em relação à aposta no sector. Todos os governos de Cabo Verde trabalharam com este objectivo e hoje podem ver-se os resultados. O turismo participa com mais de 35 por cento do PIB nacional, é um quarto da riqueza que este país produz. É um sector sensível, que exige passos seguros, pelo que estamos a trabalhar para a questão da sustentabilidade do destino, do planeamento, da protecção ambiental, da garantia jurídica dos investimentos e dos investidores que escolhem Cabo Verde para operar, dando toda a cobertura legal e institucional. Estamos ainda a trabalhar na modernização da legislação sobre turismo, de forma a abarcarmos todas as vertentes e criar todas as condições de investimento no país.

 

E vai apostar-se na qualidade?

Estamos a trabalhar para termos um turismo de qualidade. Para tal, estamos a fazer vários investimentos nas infra-estruturas portuárias e aeroportuárias, das vias de comunicação, como estradas, e na melhoria das condições de saúde. Temos ainda uma falha que passa pela questão da água e da energia, mas estamos também a fazer investimentos para garantir esses dois bens preciosos, não em abundância mas em qualidade e que possa servir a população cabo-verdiana e os turistas. Estamos ainda a trabalhar nos planos operacionais do turismo, para organizarmos o sector, identificando os recursos turísticos que temos em cada localidade das dez ilhas do arquipélago para diversificar a nossa oferta. Queremos trabalhar a parte cultural, a nossa diversidade paisagística, explorar o turismo de vendas e de negócios, explorar também o turismo de saúde e o desportivo. Estamos a trabalhar em articulação com os ministérios da Educação, da Juventude e do Desporto para promover essas áreas através da construção de infra-estruturas desportivas.  Já estamos a fazer o inventário turístico de Cabo Verde para que, até meados do próximo ano, tenhamos identificado todos os núcleos turísticos do país passíveis de serem transformados em oferta turística.

 

Em relação à legislação, há muita coisa a ser criada e alterada?

Para melhor. Estamos a rever a legislação sobre a instalação e funcionamento dos estabelecimentos hoteleiros e similares. Devido à demanda de empreendimentos com grande qualidade, já temos hotéis com seis estrelas. Então, temos de adaptar a nossa legislação, que só vai até cinco estrelas. Temos grandes resorts que, embora os estejamos a licenciar, temos de os adaptar a uma legislação que data de 1994, o que traz alguns problemas. Mas já temos o primeiro rascunho desta lei que até ao fim deste ano chegará à Assembleia Nacional para ser aprovado pelos deputados. Vamos rever também a Lei de Utilidade Turística, para que seja mais fácil a instalação de estabelecimentos hoteleiros o que, a par do Código de Investimentos aprovado recentemente e de algumas leis que serão aprovadas em breve, vão permitir criar melhores condições para os investidores. Irão ser dadas grandes condições, incentivos e facilidades.

 

Há ainda mais projectos na calha?

A Lei do Turismo de Cruzeiros já está também a ser trabalhada. Até agora temos sido um país de escala, mas queremos ser um país de destino desde o início. Já temos essa solicitação e estamos a trabalhar nessa lei, que será mais voltada para a organização interna, a preparar o destino dos navios, de forma a bem receber os turistas, para que, depois, possam voltar noutras condições. Vamos ter em breve também a Lei sobre Turismo Rural, pois queremos diversificar a oferta, uma vez que há ilhas que contam com um enorme potencial: Santiago, Santo Antão, São Nicolau, Fogo e Brava. Queremos trabalhar esta vertente e fazer com que o turismo esteja muito mais perto da comunidade. E ao mesmo tempo, arrancar com o projecto “Educar para o Turismo”, que fará a vertente formação, sensibilização e informação junto da comunidade receptora. Está também em curso a revisão da Lei sobre Agências de Viagens e Turismo, que visa criar as condições para o aparecimento de uma operadora turística nacional, de que tanto precisamos. A par de toda esta revolução em termos de legislação, estamos também a incentivar o turismo interno, criando as condições para que o cabo-verdiano possa viajar entre as diversas ilhas e promover Cabo Verde junto da comunidade cabo-verdiana na diáspora.

 

O país tem vários empreendimentos turísticos em que vigora o sistema “tudo incluído” [alojamento e todas as refeições num único pacote]. Tem sido benéfico ou prejudicial?

O sistema “tudo incluído” tem sido benéfico e é essencial para Cabo Verde. Nesta fase de desenvolvimento é essencial para o país, e continuará a ser. Mas vamos diversificar a oferta, criar o caminho para que o turista saia da unidade hoteleira em que está de férias, para ter contacto com a população local. Queremos que o turista que vem para o Sal consiga visitar São Vicente, Santiago, São Nicolau, Fogo e as outras ilhas. O mesmo é válido para o que vem para a Boavista, ou para qualquer outra ilha. Falta ainda o transporte interno, quer marítimo quer aéreo. O turista vem por uma semana e não quer perder três dias em viagens para visitar uma outra ilha. Queremos que a viagem inter-ilhas seja mais barata e mais rápida, para poder prolongar a permanência e dar tempo para que se conheça o arquipélago. É isso que pretendemos para que o turista possa ter contacto directo com a população. Por isso é que a nova legislação sobre turismo rural é muito importante, porque irá incentivar a relação entre o turista estrangeiro e nacional e a comunidade de destino.

 

São os dois lados da mesma moeda…

Sim. Isso ajudará também na distribuição da renda.

 

E a isso juntando-lhe a “morabeza”…

Sim, sem dúvida. Sabemos receber e temos essa arte, a “morabeza”.

 

Há uma aposta clara no turismo que vem sobretudo da Europa. Mas Cabo Verde está à procura de novos mercados. O Oriente surge como uma boa alternativa?

A atracção de investimentos turísticos está a ser feita através da Cabo Verde Investimentos (CV Invest). Há um plano de marketing feito para o triénio 2010-2013 em articulação entre o Ministério do Turismo e a CV Invest. Estamos a trabalhar nessa vertente de investimento e, paralelamente, queremos atrair também turistas. Queremos que o turista venha, se sinta bem com a “morabeza” e que, no fim, tenha vontade de regressar. E, para isso, estamos já a trabalhar com as companhias aéreas que operam em Cabo Verde e com os operadores tradicionais, sobretudo os portugueses, que foram os primeiros a promover Cabo Verde como destino de férias.

 

A aposta no mercado asiático é englobada nesse contexto?

Estamos a trabalhar nisso. Temos também as nossas prioridades, pois sabemos  que a distância conta. Mas é um mercado atractivo, em que as pessoas têm condições para viajar, têm condições para gastar e daí a nossa aposta.

 

O mercado asiático está ligado também à ideia que está em curso de ligar o turismo em Cabo Verde aos jogos de fortuna e azar, os casinos?

Poderá vir a ser. Inicialmente, trabalhou-se nessa vertente, na atracção para os jogos de fortuna e azar, mas o país em si não começou a fazer essa promoção, até porque a previsão para a abertura das primeiras casas de jogos  está apontada para meados de 2013.