Hainão, na margem do céu e na borda do mar

Da imagem de inferno que Hainão teve ao longo dos tempos, quando local de desterro para os governantes caídos em desgraça, a ilha deu a volta à sua história e transformou-se num destino turístico de eleição

 

Hainao

 

Texto José Simões Morais | Foto Gonçalo Lobo Pinheiro

 

Quando em 1988 se tornou numa província, separando-se de Guangdong e ganhando o estatuto de zona económica especial, a ilha de Hainão conheceu então um novo boom, o da construção civil. Novo, pois assistira já, nos anos 1950, à destruição de muita da sua vegetação tropical para dar lugar à plantação de árvores de borracha, trazendo uma visibilidade que até então não tivera. Estava aberta uma nova era e quando se tornou província, não faltaram planos para incrementar o turismo, aproveitando uma costa recortada por praias com coqueiros e fina areia branca. A temperatura excelente da água do mar e a sua transparência, permitindo olhar os corais a dez metros de profundidade, levou ao interesse de apostar em Hainão como um destino turístico de excelência.

Os russos foram dos primeiros turistas a fazer da ilha a sua estância balnear, sobretudo para fugirem aos invernos rigorosos do seu país. Mas, se até 2001 muitos empreendimentos ficaram longo tempo inacabados devido ao reduzido número de visitantes, desde então a construção conheceu um novo incremento quando Hainão passou a ter a sede do Fórum Boao para a Ásia. Um novo período de prosperidade chegou à ilha, reabilitando assim este paraíso, visto como inferno por muitos dos governantes que para aqui vieram desterrados.

Separada da extremidade sul da província de Guangdong pelo estreito de Qiongzhou, Hainão, com 33 mil quilómetros quadrados, é a segunda maior ilha chinesa, mas a província mais pequena da China. Com um clima tropical e uma vegetação luxuriante, Hainão, que significa Mar do Sul, pareceu-nos ser o local idílico para apanhar algum sol e nadar nas suas águas quentes durante o Ano Novo Chinês. O melhor período para visitar Hainão é entre Novembro e Março, quando a temperatura é amena. Nos outros meses do ano, o calor é sufocante, a chuva cai com frequência e os tufões chegam com força.

 

Nas rodas da história

De origem vulcânica, a ilha tem uma costa de 1500 quilómetros e como população nativa o povo Li, pertencente aos Baiyue (100 Yue, que significa muitas tribos Yue), que viveu de forma nómada em Lingnan sem nunca ter sido dominado pelo Império Chinês. Quando Hainão foi integrada no Império Chinês em 110 a.C. pelo general Lu Bode da dinastia Han, foi dividida em duas prefeituras (Dan Er, no Norte e Zhu Ya, a Sul). No entanto, no ano 43, como se tornava muito caro a manutenção de uma guarnição, a ilha foi militarmente abandonada.

Na dinastia Tang, era conhecida por Qiongzhou e por isso ainda hoje tem como abreviatura o nome de Qiong, pela qual a província também é conhecida. Ponto de passagem dos barcos a navegar pela Rota Marítima da Seda, por aqui ficaram alguns persas, representados agora na comunidade chinesa muçulmana dos Hui a viver na ilha.

Durante a dinastia Song foi incorporada na província de Guangxi, vendo chegar uma grande quantidade de população Han, que aí se fixou. Com os mongóis da dinastia Yuan tornou-se uma província independente, mas mal os Han conquistam de novo a China e criaram a dinastia Ming, a ilha passou a estar sob jurisdição da Província Guangdong-Guangxi. Com a chegada de novos grupos Han, o povo Li retirou-se para as montanhas na zona centro sul da ilha até que, no século XVIII, revoltou-se contra a dinastia Qing dos manchus. O povo Miao foi enviado para o combate e aí também se fixou. Quase sempre para aqui tentavam fugir as cortes das dinastias depostas dos Han, quando os seus Impérios eram tomados pelos povos do Norte.

A partir de 1633, Hainão acolheu uma grande quantidade de jesuítas e a ilha acabou por ser  incorporada no Bispado de Macau a 10 de Abril de 1690 pelo Papa Alexandre VIII. Em 1848 ficou ligada a Cantão, mas só a 17 de Setembro de 1858 a Sociedade das Missões Estrangeiras de Paris tomou formalmente posse, ficando a governar a prefeitura apostólica de Guangdong-Guangxi e Hainão. Pelo Tratado de Tianjin, o porto de Qiongshan (uma das áreas da cidade de Haikou) ficou aberto às potências estrangeiras que invadiram a China após a Guerra do Ópio. A ilha foi ainda a ocupada pelos japoneses entre 1939 e 1945, sendo morta às mãos do invasor um terço da população masculina da ilha. Em Abril de 1950, daqui partiram os últimos barcos do Guomindang transportando 70 mil pessoas, que tinham como destino Taiwan.

Hainão serviu como local de serviço cívico para muitos jovens comunistas durante os anos 1960. Agora  apresenta-se como um lugar promissor, rico em recursos naturais e vocacionado para o turismo. Nesse ramo, tem tudo para proporcionar as delícias de quem a visita, com uma grande variedade e qualidade de frutas tropicais, boa comida, calor todo o ano e uma zona franca.

 

O estreito de Qiongzhou

A viagem de comboio pela Província de Guangdong foi feita à noite, permitindo da janela da carruagem assistir aos festejos da passagem de ano realizados pelos pátios das casas iluminadas que se encontram junto à linha férrea. O céu é constantemente presenteado pelas cores dos fogos de artifício. Já no interior das carruagens, a maioria das pessoas dorme, enquanto outras vêem por um pequeno computador o espectáculo televisivo especial de fim de ano transmitido pela CCTV.

Está a amanhecer quando o comboio chega à península de Leizhou, no sul de Guangdong. Desengatilhada a locomotiva, esta, em manobras, vai levando as carruagens em grupos de três para o interior do ferry que atravessará os 24 quilómetros do estreito. Foram precisos 100 anos para o sonho de Sun Yat-sen se tornar realidade e assim, a 7 de Janeiro de 2003, foi aberta a travessia marítima para o comboio. Agora já se pensa num projecto de uma ponte ou em túnel. Após 45 minutos de viagem e já com o comboio de novo alinhado, prosseguimos pela costa nordeste da ilha. Pouco tempo depois chegamos a Haikou.

 

A cidade dos cocos

Como capital de província, Haikou é o centro político, económico e cultural e um dos portos mais importantes da região. Da estação de comboios até ao centro da cidade, os coqueiros dão a sombra às largas avenidas cheias de hotéis e, no outro lado da estrada, às praias. No entanto, poucos são os estrangeiros que visitam a cidade dos cocos, como Haikou é conhecida.

Somos levados a visitar um conjunto de ruas em torno de Xinhua Lu e Zhongshan Lu. As casas antigas de dois e três andares, todas caiadas de branco, abrigam os passeios devido às lojas estarem recuadas em relação aos edifícios, criando uma passagem resguardada tanto do sol como da chuva. Ao atravessar a cidade, vamos dar ao Templo dos Cinco Oficiais, que homenageia oficiais caídos em desgraça: Li Deyu (787-850), primeiro-ministro durante a dinastia Tang que chegou a Hainão em 848, e os outros quatro relacionados com Gao Zong (1127-62), o primeiro imperador da dinastia Song. Ao escolher para seu primeiro-ministro Qin Hui, um homem fugido do campo do inimigo e que tomou como missão negociar a paz com os Jin, Gao Zong fez com que pessoas como o general Li Gang (1085-1140) – originário de Fujian e antigo primeiro-ministro -, o alto oficial da corte Li Guang (?-1155), originário de Zhejiang; Zhao Ding (1085-1147), proveniente de Shanxi e por duas vezes primeiro-ministro, e o historiador Hu Quan (1101-1180) procurassem o exílio na ilha ao sul do país. Já antes, em 1907, Su Dongpo, da dinastia Song do Norte, tinha sido deportado para Hainão. Deixámos o recinto após visitar o Museu de Haikou.

Hainão tem 290 quilómetros de comprimento e 180 quilómetros de largura. O nosso destino é agora o sul, por onde podemos chegar a partir de três estradas. A viagem até Sanya pode ser feita pelo litoral leste ou oeste, ou ainda a cruzar o centro montanhoso da ilha. Além de auto-estradas e da antiga linha férrea, ainda há a opção do comboio de alta velocidade, que liga as duas cidades. Se até então a viagem pelo caminho de ferro desde a capital da ilha demorava cinco horas, em 2010 passou para os 90 minutos. Também há muitas companhias aéreas com voos nacionais e internacionais directos para Sanya (ver caixa para como viajar desde Macau).

Da cidade pouco visitamos, tendo-nos limitado às praias de baías longas e areia branca fina, com um mar azul tão convidativo que não resistimos à água quente e a um sol apetecível para celebrar o Ano Novo. Tiramos um dia para visitar o jardim budista Nanshan, onde encontramos num dos templos uma sala cheia de estátuas, sendo a mais preciosa de jade e ouro incrustada com inúmeras pedras preciosas. Após sair do templo e continuando pela extensa avenida, vamos dar a uma enorme escultura da deusa da Misericórdia e Compaixão, Guan Yin, com 108 metros de altura e situada no meio do mar, de frente para a montanha do Sul (Nanshan). É considerada a maior estátua do mundo da deusa Guan Yin (conhecida em Macau por Kun Iam), representada na mesma peça com três diferentes imagens. Ao fim da tarde chegamos ao Jardim do Fim do Mundo (TianYa Haijiao), os limites do céu na borda do mar, onde se encontra a coluna sul, uma das quatro que suporta o céu na China, representada nas notas de dois yuans.

Na praia, deleitados a beber água de coco após um reconfortante banho de mar, demos por nós a pensar ser este um esplêndido local para ser desterrado.

 

 

Como ir

A China Eastern Airlines (www.flychinaeastern.com) tem voos diários para Sanya com saídas de Zhuhai*

 

Bilhetes de ida e volta a partir de MOP 2000

Horário da ida: 10h55 (1h15 de viagem)

Horário de regresso: 20h20 (1h20 de viagem)

* O aeroporto de Zhuhai disponibiliza um serviço de shuttle bus a partir do seu terminal a dois quarteirões de Gongbei por ¥ 25/ 45 minutos de viagem

 

 

Onde ficar

Preços por quarto duplo com pequeno almoço incluído

 

Captain’s House Hostel (2 estrelas)

MOP 200

 

Sanya Bay Yinyuan Resorts  (3 estrelas)

MOP 260

 

Huandao Beach Hotel (4 estrelas)

MOP 510

 

Days Hotel & Suites Sanya Resort  (5 estrelas)

MOP 800

 

Holiday Inn Sanya Bay Resort (5 estrelas)

MOP 850

 

MGM Grand Sanya (5 estrelas)

MOP 1900

 

Banyan Tree Sanya (5 estrelas)

MOP 3000

 

 

Pacotes

O website www.ctrip.com oferece pacotes com voo e alojamento incluído por preços competitivos.

Pacotes de três noites a partir de MOP 2000 em quarto duplo com pequeno almoço.

 

 

O que visitar

Sea Turtles 911 – organização não-governamental que trabalha na área da defesa das tartarugas no Mar do Sul da China. Os turistas podem ser voluntários por um dia e aprender mais sobre esta espécie.

Praias de Sanya – consideradas as melhores da China, com extensos areais, sossego e água quente.

Montanha do Sul (Área turística de Nanshan) – um grande templo budista de Shaolin na zona sul da ilha.

Vila Gusong em Wenchang – uma aldeia única pela sua história e beleza.

Ilha do Macaco – o único perigo são os macacos que roubam pertences aos turistas distraídos.

Parque do vulcão e aldeias de lava – a 15 km a sul de Haikou.

 

 

O que comer

Frutas tropicais (manga, ananás, jaca, mangostão, líchia, coco)

Marisco

Peixe