De Macau para a Antártida

Aos 25 anos, Cynthia Tang prepara-se para realizar um sonho: ir à Antártida. Seleccionada para integrar a expedição internacional anual da organização 2041, fundada pelo famoso explorador britânico Robert Swan, parte em Março, com a bandeira de Macau na bagagem.

Cynthia Tang

 

Texto Diana do Mar | Fotos Gonçalo Lobo Pinheiro

 

Foram as aulas de Geografia que lhe despertaram um especial interesse pela Antártida. Concebido nos bancos de escola, o “bichinho” esteve sempre presente. Hoje, aos 25 anos, Cynthia Tang prepara-se para integrar a expedição internacional da organização 2041 fundada pelo explorador britânico Robert Swan. A viagem ao continente gelado está marcada para Março.

“Como gosto tanto e queria muito ir, lia imenso sobre a Antártida e passava o tempo a fazer pesquisas na Internet. Até fui ver se havia oportunidades ou vagas numa estação chinesa, mas infelizmente apenas contratam cientistas. Senti que o meu sonho nunca se iria tornar realidade, até que descobri esta organização e decidi inscrever-me”, conta a jovem natural de Macau. Contudo, prevalecia a sensação de que a probabilidade era remota. “Eles receberam mais de 4000 candidaturas e, por isso, pensei que seria muito difícil escolherem-me mas, em meados de Agosto, recebi um e-mail a dizer que tinha sido aceite!”

A expedição, que se realiza entre 13 e 25 de Março, arranca em Ushuaia, a cidade mais austral do planeta, na Argentina, ponto de encontro e de “aquecimento”. “Esses dois dias servem para formação e treino. Aliás, nem todos podem alguma vez ter visto neve ou gelo”, explica Cynthia Tang. É também em Ushuaia que os participantes devem dizer “adeus” à família porque uma vez a bordo acabaram as comunicações. “Eles avisam que vamos ficar uma semana ‘desligados’ do mundo”, realça a jovem, que trabalha na área no marketing.

A travessia marítima de Ushuai até à Antártida demora um dia e meio, contempla a famosa Passagem Drake – que deve o seu nome a Sir Francis Drake, navegador inglês do século XVI – e tem como o destino final a Península, onde “o clima é menos extremo e perigoso”. O programa prevê uma série de desembarques, nomeadamente na ilha de Curveville, famosa pelos pinguins, com as excursões a serem decididas a bordo numa base diária. Dos locais a visitar figura também o Neko Harbour e o Paradise Harbour, assim como o Canal Lemaire, se o tempo e as condições climatéricas permitirem. Mas o dia mais excitante – a avaliar pela expressão de Cynthia Tang – vai ser o do acampamento para aqueles que alinharem na excêntrica experiência.

Cynthia Tang

Contudo, a expedição tem um preço. “Custa 22 mil dólares norte-americanos, sem contar com o bilhete de avião para a Argentina. Todos os membros – os que são seleccionados – têm de encontrar patrocinadores”. Até ao final de Outubro, Cynthia Tang tinha angariado aproximadamente metade da verba.

A maior ajuda surgiu de uma associação budista. E a possibilidade de não ir por causa da insuficiência de patrocínios nem se coloca. “Vou na mesma, é o meu sonho”, diz, peremptória. O facto de poder contar com o Instituto Politécnico de Macau (IPM), onde se formou em Tradução Chinês/Inglês, como “unidade de apoio” deixa-a “contente”. “Deram-me conselhos e facultaram contactos de organizações locais, ajudando-me a arranjar apoios”.

A própria instituição de ensino também promoveu a antiga aluna, enaltecendo os resultados notáveis que alcançou, os quais lhe granjearam, aliás, diversas bolsas de estudo, ou o trabalho de voluntariado durante os anos de faculdade. “Acreditamos que a Cynthia vai espalhar a energia positiva dos jovens de Macau aos representantes de todo o mundo, apresentando-os a este pequeno mas especial pedaço de terra”, afirmou o presidente do IPM, Lei Heong Iok em comunicado.

Cynthia Tang

Cynthia sabe de outros residentes de Macau que pisaram a Antártida, mas apressa-se a ressalvar: “No programa da 2041 sou a primeira em 12 anos. Sei que no passado houve quatro ou cinco representantes de Hong Kong, mas este ano a organização disse que não ia ninguém de lá”.

Quando submeteu a candidatura Cynthia escondeu o feito da mãe que, anteriormente, em resposta à ideia da filha de ir à Antártida disse: “Tu és louca”. Contudo, quando chegou a boa-nova teve de voltar a tocar no assunto. “O quê? Não! É tão frio e perigoso. Uma rapariga sozinha…”, reagiu a mãe de Cynthia, que depois de ouvir o plano na íntegra e sobretudo a missão do programa acabou por “compreender que era algo com significado”.

Cynthia Tang

“Temos responsabilidade de proteger a Antártida”, frisa a jovem que vai ‘mergulhar’ no universo das alterações climáticas e perceber melhor a forma como afectam o mundo, aprendendo com a equipa de especialistas da organização fundada pelo primeiro homem a calcorrear tanto o Pólo Norte como o Pólo Sul. A 2041 dedica-se à preservação da Antártida, promovendo as energias renováveis e a sustentabilidade para combater as alterações climáticas, procurando inspirar e envolver a próxima geração de líderes a assumir um papel activo.

Quando ouviu falar da Antártida na escola ficou fascinada pela riqueza de recursos naturais – e aprendeu, mais tarde, a importância dos seus ecossistemas e as ambições territoriais de que é alvo –, mas foram sobretudo os glaciares que a atraíram como um íman. Hoje o entusiasmo ainda se nota nas palavras.

Apesar de ainda ter tempo até ao dia da partida, Cynthia Tang confessa que já pensa no que colocar na mala. Além dos equipamentos para o frio, das roupas adequadas para o clima extremo e, claro, das botas, também vai levar a bandeira de Macau. “É o que mais quero”.

Cynthia Tang