José Carlos Seabra Pereira lança livro sobre literatura de Macau

O académico português José Carlos Seabra Pereira vai lançar um livro sobre "literatura de Macau e ligada a Macau", em dois volumes, focada nos autores entre o final do século XIX até aos dias de hoje.

 

O primeiro volume deverá estar terminado até ao Verão, altura em que o professor da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra abandona Macau, depois de um ano como docente convidado no Centro Pedagógico e Científico da Língua Portuguesa, do Instituto Politécnico de Macau. “Há muitas formas de Macau marcar presença na literatura. Pode ser uma presença quase episódica, remota, como um sinal de exotismo, de compensação ideológica. Depois há outras formas de presença mais fortes em que há uma representação literária de Macau como geografia física e humana, como meio de vida”, introduz Seabra Pereira, em entrevista à agência Lusa.

Para este primeiro volume, o professor de Literatura Portuguesa e de Teoria da Literatura pretende focar-se numa “literatura de Macau num sentido mais específico”, ou seja, “naqueles escritores que, podendo ter nascido em Portugal e ter vivido uma parte da sua vida em Portugal, estão numa condição literária diferente”, em que “a obra de matriz macaense é o que os define como escritores”. “O processo de afirmação desses escritores dá-se em Macau. De tal forma que alguns deles não aparecem nos livros de história da literatura ou de crítica literária em Portugal, mas isso não os diminui como escritores, são olhados, antes de mais, como escritores de Macau”, explica.

É o caso de, por exemplo, Henrique de Senna Fernandes, Deolinda da Conceição, Fernanda Dias, Fernando Sales Lopes e Carlos Morais José. No total, o académico estima incluir “um bom quarteirão” de autores.

“O Delta Literário de Macau” (título provisório) vai incluir também autores que se definem, com igual intensidade, pela sua ligação a Macau, e pela sua afirmação fora das fronteiras do território, como Camilo Pessanha e Maria Ondina Braga. “É evidente que Pessanha é o maior nome do simbolismo português e um dos maiores do simbolismo europeu. Mas é um elemento fundamental da literatura de Macau porque aqui escreve, publica parte da sua obra e até vem dar novos elementos para entender a sua obra quando descobre as características da poesia chinesa. Pessanha é um autor fundamental desta literatura de Macau”, afirma.

O mesmo se passa com Maria Ondina Braga, “publicada em Portugal a partir de certo momento da sua vida mas com toda a primeira fase da sua obra intimamente ligada a Macau”.

Há também um conjunto de obras “quase ignoradas em Portugal”, de autores como Ana Maria Accioli Tamagnini, Maria Pacheco Borges, Rodrigo Leal de Carvalho e Helena do Carmo.

Seabra Pereira identifica três grandes temáticas comuns a estes escritores, mesmo considerando as variações de época e a singularidade literária de cada um. “A sensibilidade ao que foram certas situações de grande carência e dificuldade, de crise humanitária em Macau na sequência da ocupação japonesa e da guerra do Pacífico” é frequente na obra destes autores, tal como “o sentido da importância do fortuito em que, ora parece que não acontece nada, que estamos num ambiente onde há uma certa mesmice, e de repente há uma sensação de beleza e encanto”.

Por fim, a resiliência: “Quando alguém está amachucado, derrotado, se lhe for dada uma oportunidade e se for acarinhado, esse alguém pode recuperar e atingir um grau de realização humana elevado e feliz”.

Ainda não há data para o lançamento do segundo volume, onde o Seabra Pereira promete explorar uma relação mais fugaz – mas nem por isso menos marcante – dos autores com o território, abrangendo escritores como Miguel Real, Agustina Bessa-Luís, Eugénio de Andrade e José Augusto Seabra.