Macau visto do Grande Palácio do Povo

O desenvolvimento de Macau foi tema incontornável nas reuniões magnas no Grande Palácio do Povo, em Pequim, na primeira quinzena de Março. Deputados e delegados participaram em intensas sessões diárias nas quais se falou de competitividade, mas também de diversificação económica, aliada a uma maior cooperação regional

0305032015

 

Texto Fátima Valente

 

O relatório do Governo Central entregue pelo primeiro-ministro chinês, Li Keqiang, na Terceira Sessão da 12.ª Assembleia Popular Nacional (APN), principal órgão legislativo da China, reiterou o apoio aos Governos de Macau e Hong Kong “na governação de acordo com a lei, crescimento da economia, melhoria da qualidade de vida, avanço na democracia e promoção da harmonia social”. Esse mesmo relatório foi analisado pelos 29 delegados de Macau à Conferência Consultiva Política do Povo Chinês (CCPPC), afirmou Leonel Alves à MACAU.

“O Governo Central continua a dar todo o apoio para o desenvolvimento estável das duas regiões administrativas especiais de Macau e Hong Kong”, sublinhou o delegado de Macau à CCPPC. Já numa análise em particular sobre Macau, em comparação com o texto do ano passado, o advogado notou a “omissão” de uma “referência expressa quanto à interacção da Ilha da Montanha com o desenvolvimento económico” da região. Leonel Alves arrisca uma interpretação: “Provavelmente isto tem a ver com o anúncio do presidente, Xi Jinping, durante a visita em Dezembro, de que Macau irá ter área administrativa marítima, e portanto tal irá abrir um novo capítulo no desenvolvimento de Macau ao nível da possibilidade de ter águas marítimas e eventuais novos aterros”.

A interacção com a Ilha da Montanha foi, no entanto, objecto de análise pelos delegados de Macau à CCPPC: “A conclusão é a de que a Ilha da Montanha (Hengqin Dao) tem uma jurisdição própria e, portanto, a legislação aplicável em todos os aspectos é sempre a de Zhuhai. Apesar da sua proximidade física a Macau há uma diferença abissal, quer a nível de legislação, quer a nível fiscal, quer administrativo”.

A necessidade de “espaço físico foi outro tema bastante discutido”, apontou Leonel Alves, sublinhando que, após o desenvolvimento dos últimos 15 anos, “Macau está exausta” e precisa de fazer face a problemas como o trânsito e o aumento demográfico, além dos visitantes e trabalhadores do exterior. “Macau precisa, de facto, de mais aterros”, comentou.

 

0106032015

 

Cooperação regional

Um dia depois do apoio reiterado à região no relatório do Governo Central foi a vez de o presidente do Comité Permanente da APN, Zhang Dejiang, reunir com os 12 membros de Macau, e defender a diversificação económica, aliada a uma maior cooperação regional. “É um tema recorrente: como é que se diversifica? Como é que Macau irá desenvolver-se em 2020/2030?”, questionou Leonel Alves, argumentando que “ninguém gosta da dependência única e exclusiva da indústria do jogo”.

Na opinião do delegado à CCPPC, Macau pode evoluir como centro financeiro pelo menos para abranger as trocas comerciais ou para pagamentos comerciais da China com os países de expressão portuguesa. “É um tema que pode ser desenvolvido: Macau, como porta de entrada para a China, pode ser guia para os investidores lusófonos. A China é um ‘grande edifício’, a entrada não é fácil (…) e Macau pode servir de plataforma para guiar os empresários e os profissionais que queiram desenvolver a sua actividade na China”, salientou.

Outro ponto em foco nas reuniões em Pequim foi o ‘Estado de Direito’, “um tema forte no interior da China”, descreveu. “Tivemos um projecto que fala exactamente na governação de acordo com a lei, e também temos vindo a discutir o modo de funcionamento interno do grupo de Macau na CCPPC para ver, ao longo do ano, em que área podemos dedicar a nossa atenção na cooperação com o interior da China”, adiantou.

 

0306032015

 

Optimismo no futuro

O Chefe do Executivo de Macau deslocou-se a Pequim com uma queda das receitas do jogo, que se tem prolongado desde 2014, ainda fresca e com o debate instalado sobre o eventual limite de visitantes. Chui Sai On disse estar “optimista” em relação ao “desenvolvimento saudável e estável” da indústria do jogo, e que “nos tempos de abundância do desenvolvimento do sector, o Governo foi-se preparando para a crise, através do aumento da reserva financeira”.

Na capital chinesa, Chui Sai On encontrou-se com o presidente do Banco Popular da China, Zhou Xiaochuan, com quem abordou a “segurança e estabilidade do sistema financeiro de Macau e o aperfeiçoamento do regime de reserva financeira, e o desenvolvimento das operações financeiras”. Noutro encontro, abordou a optimização da política de vistos individuais com o director da Administração Nacional do Turismo, Li Jinzao, com a tónica na necessidade de acautelar “a qualidade de vida dos residentes, independentemente de Macau ser um destino turístico onde os visitantes se sentem em casa”. A melhoria da política de vistos individuais para os residentes do interior da China estará já a ser estudada, segundo informação divulgada ao nível do Conselho de Estado.

De acordo com Leonel Alves, os delegados de Macau à CCPPC não abordaram a questão das receitas do jogo nem a limitação do número de turistas: “Ninguém abordou esta questão. Pelo contrário: entendemos que se deve incentivar a criação de mais e melhores estruturas em Macau para acolher turistas de todas as proveniências, não só da China. Em Hong Kong o assunto ganhou outra tonalidade, mas entre os membros de Macau nem sequer foi falado”.