PME | Pérolas da doçaria francesa

Três chineses de Macau apostaram no talento de um chefe de pastelaria francês. O investimento inicial foi comedido, para ver o quanto a clientela local gostava dos doces de inspiração gaulesa. Só que as filas à porta foram imediatas e obrigaram a Cacao Patisserie a crescer depressa

 

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Texto Nuno G. Pereira | Fotos Gonçalo Lobo Pinheiro

 

A meio do século XVIII, o povo francês estava revoltado com falta de pão. Maria Antonieta, mulher do rei Luís XIV, mandou-os comer brioches. Os historiadores desmentem tal momento, mas a frase, tanto nessa versão como na similar “não têm pão, comam bolos”, ganhou vida eterna. Sabe-se no entanto que a rainha era mesmo gulosa, especialmente quando a iguaria era um pratinho (ou dois) de macarons, aqueles pequenos prazeres crocantes por fora e suaves no recheio. Em Macau não se vislumbra povo revoltado, mas, com mais ou menos pão, toda a gente parece adorar pastelaria francesa. Pelo menos a julgar pela crescente oferta na cidade e pelo caso concreto da Cacao Patisserie.

A marca desta pastelaria apresenta-se com dois grãos de cacau, posicionados como um bigode típico francês, ao qual a imaginação do cliente facilmente acrescenta boina e camisola branca com listas azuis. O chocolate, como se adivinha, é dos ingredientes fortes da doçaria à venda, composta acima de tudo por macarons e bolos coloridos, criados pelo chefe Baptiste Brichon. Apesar de não ser sócio da empresa, esteve na sua génese. Falou com uma amiga de Macau, ela tinha outra amiga, que era casada com um potencial investidor. Resumindo, três jovens chineses de Macau, Micah Au e as sócias Kong Ka Man e Kuok On Kei, juntaram-se para investir no projecto. E Brichon veio de França até este lado do mundo para concretizar a ideia.

A Cacao Patisserie abriu a 4 de Julho de 2014 de forma tímida, com poucos empregados e custos bem controlados. “Tinha um espaço na rua da Barca de um familiar meu, por isso consegui uma renda mais acessível”, lembra Micah Au. Os sócios e Brichon estavam optimistas, claro, mas não lhes passava pela cabeça o tremendo êxito que lhes bateu à porta assim que a abriram. “Houve muito mais procura do que esperávamos”, conta o chefe de pastelaria, recordando-se das filas de clientes madrugadores. “Um dia juntaram-se mais de 60 pessoas na rua à espera da abertura da loja. Para evitar confusão, tivemos mesmo de começar a dar senhas de atendimento. Em regra, nessa altura demorávamos uma hora a vender a produção toda do dia. O que fizemos, logicamente, foi aumentá-la. Agora, como temos mais oferta, as pessoas sabem que podem vir um pouco mais tarde. Graças a isso, já não precisamos das senhas, as vendas decorrem com normalidade ao longo do dia. No início éramos três pessoas na cozinha, agora somos oito.”

 

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Planos de expansão

O investimento inicial foi de 1,2 milhões de patacas, que se recuperaram num ápice, graças à popularidade instantânea da Cacao. “A operação tornou-se depressa lucrativa”, revela Micah Au. “Isso fez com que pudéssemos comprar mais equipamento, contratar novos empregados e abrir uma segunda loja. É mais simples, com produtos fáceis de transportar, por isso só tem, para já, biscoitos, chocolates, macarons e gelados.”

A expansão da marca Cacao não fica por aqui. “O nosso objectivo é captarmos mais o mercado dos turistas que vêm a Macau, daí a segunda loja, que podemos chamar de loja de souvenirs. A expansão passa por aí, abrindo mais lojas deste modelo, nossas ou em regime de franchise. Estamos a trabalhar nessa operação, incluindo a possibilidade de abertura de uma loja em Hong Kong.”

Micah Au é bastante claro sobre o momento que a marca atravessa, explicando que se não fosse a escassez de recursos humanos a aposta até seria mais forte. “Não conseguimos encontrar pessoal para fazer tudo, precisamos de gente para cozinha e atendimento. O negócio podia desenvolver-se mais depressa se este ponto se resolvesse, porque temos dinheiro para investir e clientes que gostam dos nossos produtos. Já fizemos o requerimento para termos empregados importados, porque não conseguimos arranjar trabalhadores locais.”

Quanto ao êxito, houve algum segredo para fazer os bolos resultarem tão bem perante uma clientela com hábitos diferentes do público francês? Baptiste Brichon garante que não necessitou de grandes mudanças de abordagem. Apenas algumas atenções ao gosto local. “Fazemos os bolos um pouco menos doces, as pessoas aqui em Macau apreciam assim. Por isso, mesmo nos macarons, que são receitas que não podemos alterar, tentamos equilibrá-los, por exemplo, com recheios de cremes menos doces. Em França os bolos são mais doces e com mais manteiga. Também se apreciam sabores mais simples, como chocolate, baunilha ou morango, mas aqui as pessoas gostam de propostas mais elaboradas, bolos com sabores especiais.”

Entre bolos e macarons, Brichon sublinha que todos vendem bem, sem haver uns que sobressaiam. A excepção é o macaron de crème brûlée, o doce mais procurado pelos clientes que visitam a Cacao.

 

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