Retratos | Gao Rongji, pasteleiro

O meu nome é Gao Rongji, tenho 60 anos e há cinco décadas que faço dos biscoitos a minha profissão. A Pastelaria Fong Kei, na Rua do Cunha (Taipa), abriu portas em 1892, durante o reinado do imperador Guangxu. Inicialmente, a minha família tinha uma casa de chá, que também vendia bolos e biscoitos como acompanhamento. Mas, na verdade, naquela altura não éramos especialistas nos biscoitos.

 

Fotos Locanda Films

 

O meu nome é Gao Rongji, tenho 60 anos e há cinco décadas que faço dos biscoitos a minha profissão. A Pastelaria Fong Kei, na Rua do Cunha (Taipa), abriu portas em 1892, durante o reinado do imperador Guangxu. Inicialmente, a minha família tinha uma casa de chá, que também vendia bolos e biscoitos como acompanhamento. Mas, na verdade, naquela altura não éramos especialistas nos biscoitos.

 

 

Aprendi as primeiras receitas quando era um miúdo, com os meus pais, e desde então que me dedico a este negócio. Foi o meu avô quem abriu esta loja há mais de um século. Naquela altura, a Taipa era uma aldeia piscatória, havia umas fábricas também, mas pouca gente vivia deste lado. A Rua do Cunha concentrava uma série de pequenos negócios ligados à comida. Eu tenho fotos de há 60 anos que mostram como isto era pacato.

Na fase inicial da loja, a maioria dos clientes era de Macau. Eles vinham à Taipa passar o dia e compravam sempre os nossos biscoitos.

 

 

Antes dos aterros, havia praias muito bonitas nesta zona. Onde fica a estátua da deusa de Kun Ian era apenas mar antes. As pessoas vinham de Macau para aproveitar o dia na praia, nadavam aqui e tudo. Quando a fome apertava, vinham à minha loja. Também compravam boas quantidades para levar de volta a casa.

Tínhamos clientes muito leais, que vinham de propósito a Taipa, faziam aquela grande travessia, só para comprar os nossos produtos. Por vezes, quando cá chegavam, aquilo que queriam já estava esgotado. Por isso, passaram a escrever-nos dias antes e mandavam-nos uma carta a comunicar quando vinham e o que queriam. Quando cá chegavam, tínhamos tudo pronto para eles de acordo com o que vinha nas cartas. Eles apareciam e diziam: “Mandei-te uma carta com a minha encomenda”. Era bastante fácil gerir as encomendas dessa forma. Isso foi há tanto tempo que esses clientes já nem sequer existem.

 

 

Eu tenho aqui um livro do 32.º ano do reinado de Guangxu com as receitas dos bolos e biscoitos. Os meus familiares também anotavam aqui os nomes dos empregados e os seus respectivos salários. Nós ainda seguimos as indicações deste livro; só fazemos os nossos produtos pelo método tradicional, totalmente artesanal. Se mandássemos isto para uma fábrica ou pedíssemos a outras pessoas para fazerem, não seria a mesma coisa. O sabor não era o mesmo. Por isso queremos manter o negócio na família, a seguir apenas a receita de sempre, com os nossos sabores. Passados todos estes anos, o biscoito ainda é o mesmo. Se depender de mim, não mudará jamais.

 

 

*Este retrato é um dos episódios da série documental Os Resistentes: Retratos de Macau, da autoria do realizador António Faria.