Texto Bruna Pickler
Imagine ouvir o “Barco-Negro” ao som de instrumentos tradicionais chineses. Foi isso mesmo que aconteceu durante as celebrações do Ano Novo Chinês em Portugal. O fado, imortalizado por Amália Rodrigues, foi apresentado no Porto pela Orquestra Folclórica Juvenil da Escola dos Moradores de Macau, um dos 16 estabelecimentos de ensino da RAEM a integrar a comitiva do secretário para os Assuntos Sociais e Cultura, Alexis Tam, na visita a Portugal entre 7 e 13 de Fevereiro.
As celebrações da Festa da Primavera chegaram a diferentes cidades portuguesas, juntando ainda várias associações das diferentes comunidades chinesas residentes no país. Em Lisboa, um desfile com cerca de mil participantes percorreu a Avenida Almirante Reis até à Alameda D. Afonso Henriques; em Vila do Conde as actuações de grupos chineses levaram centenas de curiosos ao Teatro Municipal. “As danças e músicas chinesas e as artes marciais foram bem acolhidas pelos cidadãos portugueses e incluíram uma combinação de recitação de poesia chinesa com artes marciais e ópera cantonense, apresentadas pelos alunos de Macau, que atraíram a atenção de um grande número de espectadores, que registaram o momento, em ambiente animado”, referiu num comunicado a Direcção dos Serviços de Educação e Juventude (DSEJ) de Macau.
A deslocação do responsável da tutela dos Assuntos Sociais e Cultura de Macau a Portugal inseriu-se nas celebrações dos 40 anos do estabelecimento das relações diplomáticas luso-chinesas e dos 20 anos da fundação da RAEM. Num balanço final, Alexis Tam sublinhou que a visita “obteve resultados frutíferos”.
Macau no intercâmbio luso-chinês
“Macau tem vantagens excelentes e consegue desempenhar funções singulares ao nível do intercâmbio entre países e povos”, vincou o secretário da RAEM num encontro com o embaixador da República Popular da China em Portugal. Reunidos em Lisboa, Alexis Tam e Cai Run discutiram sobre “como desenvolver as vantagens de Macau e o seu papel de plataforma, bem como a promoção do reforço de intercâmbio entre a China e Portugal ao nível cultural, educativo, cooperação turística e entre os dois povos”, como se pode ler num comunicado do Gabinete do Secretário para os Assuntos Sociais e Cultura.
Tam reforçou que no desenvolvimento da iniciativa chinesa “Faixa e Rota”, criada pelo Presidente do País, Xi Jinping, em 2013, “Macau possui a vantagem linguística e uma rede social que permite contribuir para a comunicação entre os povos da China e Portugal”.
Já Cai Run, que se encontra em Portugal desde 2015, disse que com a visita do presidente chinês àquele país europeu no ano passado e “o esforço dos dirigentes dos dois governos, a relação entre a China e Portugal entra agora no melhor período de sempre”.
Ainda de acordo com o comunicado, neste encontro o diplomata chinês reconheceu o “estatuto especial de Macau nas relações entre a China e Portugal” e agradeceu ao Executivo da RAEM por ter enviado nos últimos três anos “excelentes alunos e associações juvenis” a Lisboa para participar nas festividades do Ano Novo Chinês.
Prioridade à educação
Educação, cultura, desporto, turismo ou ciência e tecnologia. Ao longo dos seis dias que esteve em Portugal, Alexis Tam debateu a cooperação sino-lusófona em diferentes sectores. No campo desportivo, o secretário sugeriu durante uma reunião com o ministro da Educação português, Tiago Brandão Rodrigues, que os atletas lusos estagiem na RAEM antes dos Jogos Olímpicos de Tóquio de 2022. “A presença portuguesa nos Jogos Olímpicos de Tóquio pode beneficiar das instalações desportivas de qualidade para um período de adaptação importante em Macau devido ao fuso horário”, referiu Tam, de acordo com um comunicado oficial.
Na área da ciência e tecnologia, Portugal e Macau reiteraram a “necessidade de promoção de projectos de investigação conjunta em áreas específicas de interesse mútuo”.
Já no que diz respeito à educação, foram assinados cinco protocolos de geminação entre estabelecimentos de ensino de Macau e Portugal, onde se ensina português e mandarim. Os acordos estipulam como prioritários os domínios das artes, humanidades, ciência, tecnologia e desporto e prevêem que as instituições envolvidas possam estabelecer entre si “actividades de cooperação” baseadas na partilha entre alunos, docentes e órgãos de gestão “através de contactos regulares” que permitam “aumentar a compreensão e a amizade mútuas”.
“Pode servir como uma importante plataforma para a promoção de mais intercâmbio educativo entre as escolas”, salientou Alexis Tam sobre a parceria que associa as escolas locais Hou Kong, da Ilha Verde, dos Moradores, Colégio de São José e Gonzaga Gomes e os estabelecimentos secundários portugueses Carlos Amarante (Braga), Augusto Gomes (Matosinhos), Oliveira Júnior (São João da Madeira), Eng. Acácio Calazans Duarte (Marinha Grande) e D. Duarte (Coimbra).
Em relação ao ensino da língua, o responsável reafirmou nas reuniões com o ministro português da Educação e também com o presidente da Câmara do Porto, Rui Moreira, o desejo de transformar Macau num centro de excelência de aprendizagem da língua portuguesa. A língua, sublinhou, é um “instrumento fulcral para promover o relacionamento” entre as duas partes.
“Neste momento, há cerca de 6700 alunos que estão a estudar a língua portuguesa nas escolas secundárias. Já não falo dos alunos que estão a estudar em Portugal, cada vez há mais alunos que vêm para Portugal para prosseguirem os estudos e também estamos a incentivar os alunos para virem”, disse o responsável durante a visita ao Porto.
Aprofundar “velha aliança” com o Porto
“Este ano é importante para a China e Portugal, porque se celebram 40 anos do estabelecimento da boa relação diplomática entre os dois. Para nós, a amizade já existe há muitos anos. Por exemplo, Macau e o Porto têm uma amizade, são cidades geminadas desde 1991 e, para nós, esta amizade é preciosa. Utilizando a expressão portuguesa de quanto mais velho é o vinho, melhor é. Com a amizade é igual”, afirmou Alexis Tam à imprensa durante a visita ao Porto.
O responsável revelou que os temas abordados no encontro com o presidente da câmara daquela cidade e “amigo de Macau” Rui Moreira foram a cooperação e o futuro na área do turismo. “Macau e Porto são cidades turísticas, também Património Mundial da UNESCO”, disse Tam, admitindo que ainda se podem “desenvolver as áreas do turismo, actividades culturais, assim como a educação, saúde e desporto”.
Para Rui Moreira, os benefícios que o Porto colhe da relação com Macau têm a ver com o turismo, visto que a região chinesa “é um ponto de promoção do Porto como cidade geminada”, e que essa presença portuense se transmite “não só no mercado macaense, mas também para os mercados limítrofes, numa zona da China que é a mais rica do país”.
O autarca português sublinhou que a “velha aliança com Macau” tem aberto as portas do Porto para a China, com “protocolos importantes de colaboração com Shenzhen que só foram possíveis através da mediação de Macau” e que são “importantes para a região”.
“Gostava que esta relação pudesse ser mais aprofundada na parte da cultura”, admitiu Moreira, expressando o desejo de que também na área da educação “fossem feitas mais coisas”.
PROMOÇÃO TAMBÉM NA TELEVISÃO
Alexis Tam encerrou a deslocação oficial a Portugal com a participação no “Praça da Alegria”, o programa das manhãs da RTP 1, a emissora pública portuguesa de rádio e televisão. O secretário da RAEM esteve cerca de sete minutos à conversa com os apresentadores Jorge Gabriel e Sónia Araújo, tendo a sua participação no programa servido para assinalar os 40 anos das relações diplomáticas entre Portugal e a República Popular da China. Na sua intervenção, falou sobre o estado actual das relações entre Portugal e Macau e o impulso dado pelas autoridades locais ao ensino da língua portuguesa. Alexis Tam, que desejou em cantonês votos de bom Ano Novo Lunar aos espectadores da RTP, garantiu que tanto Macau como Pequim têm interesse em reforçar o intercâmbio com Portugal, não apenas a nível económico, mas também cultural, desportivo e turístico.