Texto Sandra Lobo Pimentel | Fotos GCS
A paixão pelos insectos não começou cedo na vida de Danny Leong. Foi pouco antes de escolher prosseguir estudos superiores que surgiu a vontade de conhecer mais profunda e cientificamente a biodiversidade local. Os insectos prenderam a atenção do jovem nascido e criado em Macau, que rumou a Taiwan em 2013 para se tornar um especialista.
Já quase no fim dos estudos, em 2015, o jovem entomologista lançou-se numa investigação na Ilha Verde e as amostras de solo levaram, só este ano, à descoberta de três novas espécies. A primeira foi a formiga Leptanilla macauensis, seguiu-se o ácaro Meristolohmannia macauensis, e uma terceira que ainda não foi publicada, mas está para breve, revelou Danny Leong à MACAU.
Tudo começou com a Leptanilla macauensis, uma pequena formiga que não excede um milímetro, de cor amarela pálida e com pequenas antenas. No laboratório passou longas horas a analisar amostras de solo até que se deparou com algo que nunca tinha visto. “Tinha características da Leptanilla, muito rara. Há poucos registos no sul da China. Analisei as restantes amostras de solo para procurar mais e ter a certeza de que tinha feito uma descoberta.”
Em Julho do ano passado, foi a vez do Meristolohmannia macauensis. “Chamamos-lhe o ácaro-escaravelho, porque a morfologia é muito parecida com a do escaravelho, muito luminosa, tipo metalizada, e este ácaro também se alimenta de madeira e depois de digerir tudo regressa ao solo”, explicou Danny Leong.
Novamente as amostras recolhidas na Ilha Verde mostraram-se proveitosas para a investigação, mas foram vários os locais em Macau onde efectuou pesquisas, como Coloane, mais especificamente a zona da barragem de Ká-Ho, mas também as colinas da Taipa Grande e Taipa Pequena, e finalmente a Ilha Verde e a Colina de Mong-Há, na península.
“Não sei porque apenas fiz descobertas nas amostras recolhidas na Ilha Verde, mas de alguma forma quis assinalar esse facto e nesta terceira espécie que descobri, ainda não revelada porque falta a publicação da pesquisa, inclui o nome da Ilha Verde, em vez do nome de Macau como fiz com as outras duas. O estudo já foi aceite”, revelou.
“Esta descoberta é muito especial, por isso dei-lhe o nome da Ilha Verde. Fico feliz de poder colaborar e trabalhar com outros cientistas de Hong Kong, do Japão, Vietname, do Interior do País ou da Rússia. Tenho tido muitos contactos e vejo que há muita gente interessada em mim e na minha história e, em especial, nas espécies de Macau.”
Os mentores
Iniciou os estudos em 2013 e no ano seguinte passou a ser assistente do professor Shiuh-Feng Shiao na Universidade de Taiwan, um reputado especialista em taxonomia de insectos, disciplina biológica que define os grupos de organismos biológicos com base nas suas características comuns e lhes dá nome.
Dessa colaboração resultou a descoberta de duas espécies de formigas em Taiwan, cujos estudos foram publicados também no decorrer do ano passado. Apesar do trabalho desenvolvido na região, Danny Leong não esqueceu Macau, o que o levou a conhecer outros dos seus mentores.
Quando descobriu a Leptanilla macauensis Danny Leong já fazia pesquisas com Benoit Guénard, professor assistente da Escola de Ciências Biológicas da Universidade de Hong Kong, que se entusiasmou com a vontade de Danny em estudar a entomologia de Macau. O académico confirmou a suspeita: estava encontrada uma nova espécie de formiga, que viria a receber o nome de Macau.
Mas a ligação começou antes, em 2015, quando Danny esteve em Macau a recolher várias amostras de solo, convencido de que poderia encontrar novas espécies de formigas. “Escrevi ao professor Guénard sobre esta minha convicção, nem sei se ele percebeu tudo o que escrevi, porque o meu inglês não era muito bom, mas ele prestou atenção”, lembrou.
O académico interessou-se pela possibilidade de um território como Macau ter esta diversidade e aceitou que o jovem estudante fosse seu aprendiz. “Aprendi a fazer recolha de amostras de forma correcta e a usar o laboratório da Universidade de Hong Kong. Ele ensinou-me tanta coisa sobre formigas, mas não só. Sem a sua ajuda eu não conseguiria sequer fazer a descrição da morfologia desta nova espécie. Não sabia nem como escrever o estudo, também em inglês”, lembrou.
Macau pode ser exemplo
Danny Leong acredita que as descobertas que fez, e as que ainda espera fazer, são importantes para a região, mas não só. “Macau é das cidades mundiais com maior densidade populacional, segundo a Organização das Nações Unidas. Por isso, entender a biodiversidade da cidade é importante também para outras cidades, para perceberem como a biodiversidade é afectada. Muitos cientistas querem ajudar-me a estudar e encontrar uma solução para grandes áreas urbanas. Podemos encontrar uma solução ecológica para todos e o exemplo de Macau pode ajudar. Como equilibrar o desenvolvimento e a conservação da biodiversidade? Em Macau encontramos um exemplo que pode ser muito útil.”
Danny Leong é o terceiro especialista a estudar os insectos de Macau e acredita que esse pequeno número prova que, “apesar dos insectos serem tão importantes, não há muita gente que se importe com eles”.
O jovem entomologista acredita que “os insectos são a espécie-chave e fundamental na ecologia”. Explica que as estimativas do número de insectos que povoam o planeta são muito inferiores à realidade. “É altamente improvável que o número que conhecemos seja o real. Deve haver muito mais espécies que ainda vamos descobrir, mas já é bem maior do que o número de outros animais, o que comprova a importância dos insectos, até para os humanos. A medicina tradicional chinesa, por exemplo, usa muitos insectos e a natureza em geral para aplicar na cura de doenças”, aponta.
A investigar insectos desde 2015, quando aproveitou as férias da faculdade para recolher amostras em Macau, considera que a maioria da população local não conhece o valor destas espécies. “As crianças, os pais, os avós, ninguém consegue perceber que é raro, são como tesouros estas novas espécies. E mais ainda, não percebem como os insectos podem ajudar na nossa vida em comunidade. Temos o exemplo das abelhas e de como ajudam nas plantações. Sem elas não era possível, mas poucos têm noção disso.”
Encorajar os mais novos
Danny Leong diz que o que o levou a dedicar-se à entomologia foi a tristeza que sentia por esta incompreensão que a maioria das pessoas tem com o meio que as rodeia. “Sentia pena dos insectos e pensei em estudá-los cientificamente. Assim escolhi entomologia. E logo no primeiro ano de licenciatura, na Universidade de Taiwan, fiquei surpreendido pela forma dedicada como eram feitos os estudos e a tentativa de compreender melhor as espécies. Aprendi muito”, conta.
Nas férias da faculdade, aproveitou para concluir os primeiros trabalhos científicos na área, e foi quando descobriu que Macau tinha 113 espécies diferentes de formigas. “Em Taiwan há cerca de 300 espécies. Se compararmos a dimensão dos dois territórios, este número de Macau é muito interessante e chamou a atenção de alguns professores e especialistas na universidade, que acharam fantástico.”
A conservação biológica em Macau “tem de ser estudada” e Danny Leong explica porquê: “Se temos tantas espécies nativas, e estas conseguem manter-se apesar dos recursos estarem comprometidos, precisamos entender as razões”.
Danny Leong não pensa numa carreira académica para já: o seu objectivo é continuar no terreno a fazer pesquisas. Mas deixa a ideia de como Macau pode vir a ter uma geração mais consciente e, quem sabe, mais especialistas e investigadores. “As crianças devem ser mais encorajadas a lidar com insectos e a natureza em geral. É esse incentivo que deve ser dado nas escolas, até porque não são precisos assim tantos recursos. Os mais novos são muito curiosos e isso é o primeiro passo para conhecerem mais.”
Mostra-se disposto a ajudar a divulgar as suas investigações e descobertas a grupos escolares, algo que já fez depois de publicar o estudo sobre a Leptanilla macauensis. “Estive com um grupo de alunos de ensino primário e mostrei-lhes algumas amostras de solo e eles mesmos conseguiram ver ao microscópio. E consegui ver que é realmente a curiosidade que pode servir de motor para as crianças se focarem na descoberta da natureza.”
Lembra o seu exemplo. Apesar de não ter despertado cedo para este gosto pelos insectos, recorda que nos tempos de escola observava as joaninhas nas plantas. “Olhava para elas e gostava de perceber qual a sua história, que caminho as tinha levado ali. E nada disso era ensinado na escola ou em casa. Ninguém sabe como tratar os insectos.” E acrescenta: “Os grandes animais há muito que deixaram de habitar o território, tudo o que nos resta são os insectos. Se não os tratarmos melhor também podemos perdê-los, porque o hábito que temos é o de matar insectos”.
O entomologista apenas deseja que algo mude na mentalidade dos residentes, em especial das grandes cidades. “Se puder ajudar a aumentar o sentido de preservação da biodiversidade, já ficaria feliz.” Quer ficar em Macau para continuar a conduzir estas pesquisas e poder continuar a publicar estudos sobre as espécies nativas locais.
“Gostava de encontrar mais, não só na Ilha Verde, mas também em Ká-Ho ou outros locais, mas tudo depende do esforço na recolha de amostras. Os resultados dizem-nos que apenas encontrámos na Ilha Verde, mas acredito que haja muito mais para descobrir.” Este contributo pode estimular a outras acções com vista à conservação, nomeadamente, um modelo de cidade que preserve a biodiversidade, no entanto, Danny Leong diz que outros especialistas devem trabalhar em conjunto. “Sou apenas um cientista, trabalho com amostras, estudo as espécies. Mas isso pode ajudar a encontrar uma forma de construirmos melhor. Deixo isso para outros especialistas que possam planear e desenvolver, mas acredito que seja um trabalho conjunto para o qual os cientistas que estudam a biodiversidade também possam ser ouvidos. Só posso dizer onde encontrar as formigas e o que podemos fazer para preservá-las”.
O jovem de Macau, diz que em Macau tem três objectivos: “O primeiro é tentar estudar a biodiversidade de Macau; o segundo é tentar perceber como Macau pode equilibrar entre o desenvolvimento e a preservação da biodiversidade; e o terceiro é encorajar outros cientistas a estudarem Macau”.