Prosperidade partilhada

Vários Chefes de Estado estiveram na capital chinesa para discutir a iniciativa “Faixa e Rota”, que envolve um plano global de desenvolvimento de infraestruturas

Texto Paulo Barbosa 

segunda edição do Fórum “Faixa e Rota” para a Cooperação Internacional decorreu em Pequim, entre os 26 e 28 de Abril, com a presença de vários chefes de Estado e líderes de organizações internacionais. Durante o evento realizado na capital chinesa, que teve como tema “Cooperação ‘Faixa e Rota’: Construir um futuro melhor e partilhado”, foi debatida a estratégia adotada pelo Governo Central envolvendo o desenvolvimento de infra-estruturas e investimentos em países da Europa, Ásia e África.

No discurso de encerramento, o Presidente Xi Jinping anunciou que consensos extensivos foram alcançados sobre a promoção da “cooperação de alta qualidade”. “Elogiamos o progresso e o significado da cooperação no âmbito da iniciativa ‘Faixa e Rota’. Compartilhamos a opinião de que a cooperação enquadrada por esta iniciativa abriu uma porta para oportunidades de prosperidade comum”, disse  o Presidente, ao apresentar à imprensa os resultados de uma mesa-redonda no último dia do evento, que contou com a participação de líderes de 40 países e organizações internacionais, entre eles o presidente russo Vladimir Putin e o Chefe de Estado português Marcelo Rebelo de Sousa.

Proposta por Xi Jinping em 2013, a iniciativa chinesa estendeu-se da Ásia e Europa para a África, as Américas e a Oceânia. De acordo com a agência noticiosa Xinhua, mais de 150 países e organizações internacionais assinaram documentos de cooperação com a China no âmbito da iniciativa “Faixa e Rota”.

“Todos nós apoiamos a ideia de desenvolver uma parceria global para a conectividade e concordamos em fortalecer os mecanismos de cooperação”, disse Xi Jinping. “Todos nós apoiamos a cooperação mais pragmática para alcançar resultados mais concretos.”

De acordo com Xi Jinping, um total de 283 acordos foram alcançados no processo preparatório e durante o fórum, e acordos de cooperação avaliados em 64 mil milhões de dólares norte-americanos em foram assinados numa conferência de CEO de grandes empresas realizada durante o fórum.

No discurso principal na cerimónia de abertura, o Presidente chinês anunciou um pacote de propostas para avançar com o desenvolvimento de alta qualidade da iniciativa. O princípio de consulta extensiva, contribuição conjunta e benefícios compartilhados deve ser defendido, disse Xi Jinping, enfatizando abordagens abertas, verdes e limpas, assim como objectivos exigentes, melhoria do nível de vida e desenvolvimento sustentável.

Apoio internacional

Participaram do fórum cerca de 5000 pessoas de mais de 150 países e 90 organizações internacionais. O secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres, enfatizou na cerimónia de abertura que os cinco pilares da iniciativa “Faixa e Rota” – coordenação da política, conectividade de instalações, comércio livre, integração financeira, e intercâmbios entre pessoas – servem como “pilares conceptuais que podem ser traduzidos no processo da vida real para todas as pessoas”.

De 2013 a 2018, o volume comercial entre a China e outros países que se juntaram à iniciativa ultrapassou os seis triliões de dólares norte-americanos, e o investimento chinês nos países da iniciativa “Faixa e Rota” excedeu os 90 mil milhões de dólares norte-americanos.

Graças à iniciativa “Faixa e Rota”, foi construída uma autoestrada na África Oriental, a República das Maldivas tem sua primeira ponte entre ilhas, o número de comboios de carga entre a China e a Europa está em crescimento. O porto de Pireus, próximo da capital grega Atenas, tornou-se um dos terminais de contentores com um dos crescimentos mais rápidos no mundo.

Klaus Schwab, fundador e presidente executivo do Fórum Económico Mundial, participou do primeiro fórum em 2017, e recordando o evento, descreveu a iniciativa naquela época como “ainda uma criança a crescer”. Actualmente, segundo Schwab disse à Xinhua, a iniciativa chinesa cresceu a ponto de se tornar um importante factor na economia global.

Macau aposta no multiculturalismo

O Chefe do Executivo da RAEM, Chui Sai On, e a delegação oficial de Macau assistiram à cerimónia de inauguração do segundo Fórum “Faixa e Rota”, tendo a seguir participado numa reunião de alto nível, na qual o vice-primeiro-ministro do Conselho de Estado, Han Zheng, proferiu uma intervenção.

No seu discurso durante o evento, o Chefe do Executivo disse que Macau é uma cidade com particularidades históricas e importância no plano cultural, que tendo a cultura chinesa como predominante, preserva a coexistência harmoniosa de diversas culturas. “É importante que Macau possa aproveitar, activamente, as imensas oportunidades oferecidas pela construção da ‘Faixa e Rota’ para aprofundar o intercâmbio cultural e humanístico e promover o entendimento entre os povos”, referiu na sua intervenção.

O líder do governo de Macau disse também que a cooperação na área do turismo é uma parte integrante da iniciativa e um meio eficaz para reforçar o diálogo e a amizade entre os povos dos países envolvidos.

Chui Sai On frisou que durante o evento o Governo Central reiterou o seu apoio para que seja acelerada a construção do “Centro Mundial de Turismo e Lazer” em Macau. “Tomámos a iniciativa de articular estreitamente a construção do Centro com a construção de ‘Faixa e Rota’. Ao utilizarmos adequadamente as vantagens decorrentes do estatuto de região administrativa especial, e contando com a nossa experiência técnica, vamos enriquecer os nossos produtos turísticos segundo o modelo multi-destinos, vamos criar uma base de ensino e formação na área do turismo”, apontou Chui, acrescentando que o governo local pretende alargar o âmbito e estreitar a cooperação turística com os países que aderiram à iniciativa “Faixa e Rota”.

Plataforma de intercâmbio cultural

Durante o seu discurso, Chui Sai On considerou que a essência do entendimento entre os povos está intrinsecamente ligada ao intercâmbio e à compreensão mútua entre civilizações e culturas diferentes. “Macau, enquanto uma das cidades da China que se abriu mais cedo para o exterior, é uma cidade de renome pela sua história e cultura, caracterizadas pelo intercâmbio entre as culturas chinesa e ocidental. A inclusividade e a diversidade, que são umas das particularidades da cultura de Macau, e os valores tradicionais da harmonia e integração da sociedade, são boas provas do espírito da Rota da Seda”, disse.

No âmbito do projecto da Grande Baía Guangdong-Hong Kong-Macau, o Chefe do Executivo disse que há a intenção de promover os princípios de “paz e cooperação, abertura e inclusão, aprendizagem mútua e benefício mútuo” através da criação de uma base de cooperação e intercâmbio cultural, que servirá de modelo e estímulo para o trabalho nesta área.

Juntamente com as trocas culturais e comerciais, a medicina chinesa é considerada pelo Governo da RAEM como outro veículo privilegiado de ligação entre os povos. Referindo que o sector da medicina tradicional é um precioso património da civilização chinesa, que beneficiará ainda mais pessoas com o desenvolvimento da iniciativa “Faixa e Rota”, o chefe do Governo local disse que Macau dá um forte estímulo à modernização e internacionalização da medicina chinesa, tendo sido definida como prioritária a criação do Laboratório de Referência do Estado para Investigação de Qualidade em Medicina Chinesa e do Parque Científico e Industrial de Medicina Tradicional Chinesa Guangdong-Macau. “Com o apoio do Centro de Cooperação da Medicina Tradicional da Organização Mundial de Saúde, estabelecido em Macau, vamos fazer com que a medicina chinesa possa servir ainda melhor os povos envolvidos na iniciativa ‘Faixa e Rota’.”

Outra vantagem apontada pelo líder da RAEM é a existência de uma comunidade de chineses de Macau retornados do exterior que envolve mais de 60 países. As suas redes de contactos pessoais podem contribuir para a criação de uma ponte de cooperação entre os povos. “São importantes recursos que contribuem para o desenvolvimento do comércio e o intercâmbio humanístico com os países envolvidos na iniciativa ‘Faixa e Rota’. Apoiar-nos-emos na força dos retornados e na sua rede internacional de contactos pessoais, com vista a abrir novos mercados para diversos sectores”, disse o Chefe do Executivo.

Entre outras medidas, o Chefe do Executivo falou em lançar um plano de bolsas de estudo “Faixa e Rota” e estabelecer relações de “Cidades Amigas”, dando prioridade à intensificação das relações com os países de língua portuguesa e do Sudeste Asiático. “Também congregaremos a ‘sabedoria dos retornados’ e pretendemos convidar representantes distintos deste grupo para participarem em eventos, tais como a Exposição Internacional de Importação da China, e para assim contribuírem com a sua criatividade e dedicação para a iniciativa ‘Faixa e Rota’.”

Chui Sai On acrescentou que ao participar e ao dar impulso à construção da “Faixa e Rota”, Macau irá aperfeiçoar o seu estatuto e as suas funções no quadro do desenvolvimento nacional e da abertura para o exterior, enriquecendo a prática do princípio “um país, dois sistemas”.

Fizeram parte da delegação de Macau que se deslocou a Pequim, a secretária para a Administração e Justiça, Sónia Chan, o secretário para a Economia e Finanças, Lionel Leong, e o comissário contra a Corrupção, André Cheong. Os membros do Conselho Executivo, Liu Chak Wan, Ma Iao Lai, Cheang Chi Keong, Eddie Wong Yue Kai, Lam Kam Seng Peter e Chan Chak Mo estiveram também presentes.

Presidente português destaca alterações climáticas

O Presidente português interveio no painel do Fórum dedicado a alterações climáticas, onde também participaram o Presidente chinês, Xi Jinping, e o secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres. Marcelo Rebelo de Sousa disse que as alterações climáticas são uma das prioridades no mundo de hoje. “Depende de enfrentar esse desafio o desenvolvimento sustentável, o combate à pobreza e às desigualdades universais,” disse. O Chefe de Estado português disse também que Portugal atingiu recentemente o objectivo de ter metade da energia eléctrica proveniente de energias renováveis.

China National Convention Center in Beijing, China, April 25, 2019. REUTERS/Jason Lee
  • O que é a iniciativa “Faixa e Rota”?
  • Em 2013, o Presidente Xi Jinping anunciou duas grandes iniciativas, a Faixa Económica da Rota da Seda e a Rota da Seda Marítima. Estas duas iniciativas enquadram-se numa visão estratégica da política económica interna e externa da China, visando investimentos e projectos, procurando criar ligações de conectividade económica entre a Ásia, a Europa e África, de modo a aumentar o comércio e a estabelecer relações regionais de longa duração, visando o crescimento e desenvolvimento económico e beneficiando todas as partes envolvidas.

  • A via terrestre

  • A via terrestre terá início no Interior do País, na cidade de Xian, passando pela Ásia Central, Médio Oriente e Ásia Menor, estabelecendo ligação à Europa através de Moscovo e Roterdão, tendo como destino final a cidade de Veneza.

  • A via marítima

  • A via marítima, tendo igualmente como destino final a cidade italiana de Veneza, terá partida no porto de Xangai, passando primeiramente pelo Sudeste Asiático, com portos como Kuala Lumpur ou Jacarta, seguindo para o subcontinente indiano, daí para África, continuando pelo Canal de Suez.

  • Projectos

  • A iniciativa “Faixa e Rota” tem como objectivo o desenvolvimento de diversos projectos de grande escala – designadamente portos, estradas, caminhos-de-ferro, aeroportos, centrais de energia, gasodutos, oleodutos e refinarias – bem como o estabelecimento de Zonas Económicas Especiais.

  • Objectivos

  • Um dos objectivos desta iniciativa é o desenvolvimento de zonas subdesenvolvidas como as regiões da China Ocidental e da Ásia Central, designadamente o corredor económico China-Paquistão e o corredor Bangladesh-China-Índia-Myanmar. 

    Tendo em conta motivos de longo prazo, tanto políticos como económicos, um outro objectivo é o de estimular o comércio e as exportações com os países vizinhos da China, bem como internacionalizar a moeda chinesa – o renmimbi –, servindo paralelamente de veículo para estabelecimento de boas relações com os países vizinhos. Esta nova política centra-se sobretudo em três direcções: para o Oeste (China Ocidental, Ásia Central, o Médio Oriente e a Europa), para Este (Sudeste Asiático) e para Sul (Sul da Ásia e África). 

    Será dada ainda prioridade a duas regiões: a Eurásia e o Sudeste Asiático. A primeira, devido à sua proximidade à China Ocidental, à abundância de recursos naturais essenciais para a China e também uma necessidade de uma maior estabilidade na região. A segunda, devido à importância do comércio com a China.