RAEM/20 anos | Administração e Justiça. Modernização e maior credibilidade na função pública e nos tribunais

A pasta da Administração e Justiça conheceu nas últimas duas décadas mudanças legislativas no regime da Função Pública e a instituição de novos juízos no Tribunal Judicial de Base. Destaque ainda para a revisão da lei de bases da organização judiciária, que alargou o direito de recurso aos titulares dos principais cargos. O futuro da tutela passa pela maior implementação do sistema de Governo Electrónico.

Texto Andreia Sofia Silva

Rever e modernizar. Estas palavras podem descrever as últimas duas décadas da área da Administração e Justiça, que teve, durante dois mandatos, Florinda Chan como secretária, que foi substituída, em 2014, por Sónia Chan, que estava no Gabinete de Protecção de Dados Pessoais (GPDP). Nas últimas duas décadas a área da justiça passou por várias alterações, não só ao nível da lei que estrutura o funcionamento dos tribunais como pelos tribunais em si, com o estabelecimento de novos juízos criminais, a fim de dar resposta ao desenvolvimento da sociedade. 

Na área da Administração Pública, o regime jurídico da função pública também foi alvo de várias mudanças, não só ao nível das carreiras como do próprio estatuto dos funcionários públicos. Outra das apostas feitas passou pela implementação progressiva do Governo Electrónico. 

O objectivo da modernização da máquina administrativa esteve sempre presente na agenda do Governo. Nas Linhas de Acção Governativa (LAG) para o ano de 2001, Edmund Ho Hau Wah, então Chefe do Executivo, chamava a atenção para a necessidade de ter um “Governo com uma capacidade governativa estável”, algo que “depende, por sua vez, da estabilidade moral dos trabalhadores da Administração Pública”. Nos primeiros anos da era RAEM, o Executivo concluía que existiam “tendências positivas na cultura de serviço dos trabalhadores da Administração Pública”. “Entendemos que a institucionalização de uma Administração Pública moderna que ofereça efectivamente serviços de qualidade à população depende de uma reforma profunda da máquina administrativa e da existência de trabalhadores da Administração Pública eficientes e empenhados”, apontavam ainda as LAG para o ano de 2001. 

Já nas LAG para 2019, Chui Sai On frisava a necessidade de reorganizar funções e estruturas públicas, aperfeiçoar o regime da função pública, rever as normas sobre a responsabilização administrativa do pessoal de direcção e chefia, além de promover o amor pela Pátria e por Macau. No domínio da Justiça, a intenção é a de continuar a aperfeiçoar a coordenação centralizada da produção legislativa e impulsionar os projectos legislativos prioritários, entre eles, o regime de mediação civil e comercial e o aperfeiçoamento das leis fundamentais como o Código de Processo Civil, o Código Penal e o Código do Procedimento Administrativo. O Executivo também promete reforçar a cooperação judiciária com os países situados ao longo do percurso “Uma Faixa, Uma Rota” e os países lusófonos, aprofundar a cooperação no âmbito de serviços jurídicos e na área judiciária entre Guangdong, Hong Kong e Macau, criando um ambiente de governação segundo a lei para efeitos da integração da RAEM no desenvolvimento nacional e da construção da Grande Baía Guangdong-Hong Kong-Macau.

Em nome dos funcionários públicos 

A vontade de reformar a máquina administrativa foi sempre uma peça-chave na estratégia política, tendo sido criado, em 2007, o Conselho Consultivo para a Reforma da Administração Pública. Dez anos depois, em 2017, foi criada a Comissão de Coordenação da Reforma da Administração Pública. Foi também neste ano que foi revisto o Regime das carreiras dos trabalhadores dos serviços públicos, que havia sido implementado em 2009.

No mandato de Florinda Chan, no ano de 2006, foi instituído o Regime de previdência dos trabalhadores dos serviços públicos considerado, à época, pelos Serviços de Administração e Função Pública (SAFP), como sendo “um trabalho inovador muito importante para a reforma do sistema da função pública e para o impulsionamento reformista de outros regimes da função pública”. 

Este regime ofereceu “uma maior flexibilidade e uma oportunidade para mais de 6000 trabalhadores que estavam desprovidos de qualquer regime de aposentação”. A partir do dia 1 de Janeiro de 2007, todos os trabalhadores da função pública passaram a beneficiar de uma garantia para a aposentação, através de regimes que se foram uniformizando no âmbito de aposentação e desvinculação. 

Dois anos depois, foram estabelecidas as disposições fundamentais do estatuto do pessoal de direcção e de chefia, cuja revisão está actualmente a ser estudada pelo Governo. Kou Peng Kuan, actual director do SAFP, admitiu que o organismo “irá proceder a estudos sobre a revisão do Regime de gestão do pessoal de direcção e chefia, comparando-o com os modelos de gestão de quadros superiores de administração de outros países e regiões”. Uma vez que o diploma celebra dez anos de existência, “afigura-se uma necessária adaptação das exigências quanto às capacidades do pessoal de direcção e chefia como ao desenvolvimento da sua carreira profissional, para fazer face ao desenvolvimento social”, adiantou Kou Peng Kuan. Em articulação com a reforma geral do regime de avaliação de desempenho, serão especificados os factores e critérios de avaliação, exigências e aperfeiçoados os requisitos de selecção e contratação.

Novas direcções de serviços 

Além de promover uma reestruturação das leis que regulam o funcionalismo público, os mandatos de Florinda e Sónia Chan ficaram marcados pela reestruturação das direcções de serviço. Em Janeiro de 2011, ainda Florinda Chan estava no cargo, foi instituída a Direcção dos Serviços da Reforma Jurídica e do Direito Internacional, resultante da fusão do Gabinete para a Reforma Jurídica com o Gabinete para os Assuntos do Direito Internacional. O objectivo desta medida prendia-se com a “criação de um organismo responsável pela coordenação central da reforma jurídica, no sentido de intensificar a coordenação e a articulação das acções no âmbito da reforma jurídica”.

No entanto essa direcção de serviços foi extinta em 2015 e as suas atribuições e competências passaram a ficar a cargo da Direcção dos Serviços de Assuntos de Justiça (DSAJ), que já existia desde 2000. Presentemente a DSAJ tem como responsabilidade o estudo e apoio técnico no âmbito da política de justiça em geral, a centralização da coordenação jurídica, a execução das políticas de produção legislativa, a tradução jurídica, os assuntos do direito internacional e a área dos registos e notariado, entre outras atribuições e competências.

Além disso, o Fundo de Pensões foi transferido da área da Economia e Finanças para a área da Administração e Justiça, enquanto o Fundo de Segurança Social passou da área da Economia e Finanças para a área dos Assuntos Sociais e Cultura. Foram também criados, com “vista a acompanhar o desenvolvimento social e aperfeiçoar o seu funcionamento”, o Gabinete do Porta-voz do Governo, o Gabinete de Estudo das Políticas do Governo da RAEM e o Conselho para os Assuntos de Habitação Pública, entre outros. 

Ainda dentro da alçada do Chefe do Executivo, foi criada a Direcção dos Serviços de Estudo de Políticas e Desenvolvimento Regional, que tem como funções “apresentar teorias científicas e prestar apoio em termos de informações para a tomada de decisões pelo Chefe do Executivo e para as acções governativas do Governo, bem como sobre o papel, cooperação e desenvolvimento da RAEM nas estratégias nacionais”, entre outras. 

Na área do ensino superior, o Governo instituiu mais recentemente a Direcção dos Serviços do Ensino Superior, que veio substituir o Gabinete de Apoio ao Ensino Superior. 

Esta nova direcção de serviços tem como objectivo “estudar, propor e promover as políticas públicas para o ensino superior da RAEM e as medidas do regime do ensino superior, bem como avaliar os resultados da respectiva execução”, e também “conceber e propor estratégias para o desenvolvimento e internacionalização do ensino superior da RAEM, através de acções de planeamento e de estudos sobre a modernização e diversificação do ensino superior, tendo em conta a sua inserção no contexto local, regional e internacional”, entre outros objectivos. 

A aposta no Governo Electrónico 

Desde o estabelecimento da RAEM, o Governo tem vindo a atribuir maior importância à implementação do Governo Electrónico. Além da realização de estudos de viabilidade, têm sido apresentados anualmente projectos estratégicos para a sua implementação nas LAG. No início de 2001, foi criado o Grupo de Trabalho para o Governo Electrónico para dirigir e coordenar a informatização da Administração Pública. No fim desse ano, o SAFP lançou o “Relatório de Estudo sobre as Estratégias do Governo Electrónico da RAEM”, onde foram apresentadas as metas a atingir com a sua implementação, nomeadamente, a redução dos custos de funcionamento da Administração Pública, a elevação da sua eficiência e a melhoria da qualidade e eficácia dos serviços públicos, tendo ainda sido definida a estratégia e os planos de desenvolvimento para os três anos seguintes. 

Entre 2005 a 2015, o SAFP apresentou um conjunto de planos, definindo os trabalhos a serem levados a cabo no âmbito da implementação do Governo Electrónico. De 2001 até 2016, o SAFP elaborou um total de quatro planos para a implementação do Governo Electrónico. 

O serviço “ePass”, que foi lançado em Novembro de 2009 pelo SAFP, permite aos cidadãos acederem, através de uma conta criada para o efeito, a vários serviços públicos online. Em 2012 o SAFP efectuou uma revisão do sistema de “ePass” por forma a promover a criação de um mecanismo de identificação unificado. 

O Governo elaborou ainda o “Planeamento Geral do Governo Electrónico da Região Administrativa Especial de Macau 2015-2019”, tendo por base a revisão integral do estado do desenvolvimento do Governo Electrónico na RAEM, a análise da tendência mundial do desenvolvimento do mesmo, bem como a experiência de outros países e consultas realizadas junto dos diversos serviços públicos. Em 2019, o SAFP esteve a aperfeiçoar os diversos trabalhos do Planeamento Geral, bem como avançar com uma avaliação da execução do mesmo. Está também a ser elaborado o próximo plano de desenvolvimento do Governo Electrónico.

Os objectivos que o Governo quer atingir na próxima fase deste projecto prendem-se com a promoção da informatização dos serviços públicos tendo em conta as suas necessidades, bem como a promoção de um serviço público personalizado através da criação de uma conta e modelo de assinatura únicos. De acordo com o Planeamento Geral do Governo Electrónico da Região Administrativa Especial de Macau 2015-2019, serão prosseguidos os diversos trabalhos definidos no Planeamento Geral. Sob a fiscalização e o acompanhamento dos respectivos mecanismos de coordenação, foram concluídos a maior parte dos trabalhos de 40 projectos definidos no Planeamento Geral do Governo Electrónico, até finais de 2018, a taxa de execução dos projectos atingiu 80 por cento, e em 2019 continuará a realizar os projectos não concluídos.

Além disso, implementou-se a electronização para a renovação de licenciamentos de restauração em finais de 2018, o que permite aos cidadãos apresentarem, através de um computador ou telemóvel, o pedido de renovação, a entrega de documentos e o pagamento de taxas e ainda imprimir as licenças renovadas nos quiosques do “Guia da Cidade” do Instituto para os Assuntos Municipais (IAM).

Colaboração interdepartamental

A reforma da máquina administrativa da RAEM tem também colocado uma tónica especial na cooperação entre diferentes departamentos públicos em prol da mesma causa. No “Planeamento Geral do Governo Electrónico da RAEM (2015-2019)”, o Executivo diz estar também focado no “melhoramento do mecanismo de colaboração interdepartamental”, de forma a que “sejam promovidos o diálogo e a colaboração” para “elevar a eficiência administrativa”. Para tal, foi criado um grupo de trabalho em cada serviço público que garanta a coordenação e execução das tarefas, conjugando com o funcionamento do mecanismo da cooperação interdepartamental. O grupo de trabalho é ainda responsável pela promoção da optimização e electronização dos procedimentos de trabalhos dos serviços públicos, como a gestão interna e os serviços externos, impulsionando em conjunto a cooperação interdepartamental e a optimização da gestão interna.

Um dos grandes objectivos da cooperação entre departamentos é evitar a repetição do uso de recursos – tanto humanos como tecnológicos – para a mesma finalidade. Tal meta só poderá ser cumprida, segundo o documento oficial, com o bom desenvolvimento do “Governo Electrónico”, que torna possível o desenvolvimento de uma plataforma de uso comum entre diferentes sectores da Administração Pública.

“Para se criar condições para disponibilizar serviços de qualidade aos cidadãos, no futuro, será utilizado o mecanismo de coordenação e colaboração para impulsionar a elaboração de regulamentação sobre a optimização dos procedimentos das actividades próprias dos serviços públicos, os trabalhos de electronização e respectiva execução. O SAFP, tendo em conta os serviços interdepartamentais, irá coordenar e apoiar a perspectiva optimização dos procedimentos e os trabalhos de electronização, bem como vai proporcionar ferramentas de electronização para os procedimentos interdepartamentais e a interconexão de documentos”, refere o “Planeamento Geral do Governo Electrónico da RAEM (2015-2019)”.

Na apresentação das LAG 2019 na área da Administração e Justiça, a secretária Sónia Chan referiu que, até ao final de 2018, 55 serviços interdepartamentais já estavam aperfeiçoados. A prioridade para o ano que agora finda era a revisão do regulamento administrativo que regula o regime de licenciamento de estabelecimentos de comidas e bebidas, que prevê a criação de uma comissão conjunta e permanente para a apreciação de pedidos, por forma a acelerar o tempo para a emissão de licenciamento.

Para 2019, a promessa era a de optimizar 75 procedimentos interdepartamentais de prestação de serviços, sendo um deles o “Serviço de Balcão Único”, que tem sido gradualmente disponibilizado à população.

Cidade Inteligente à vista

No Plano Quinquenal de Desenvolvimento da RAEM (2016-2020), publicados pelo Governo em 2016 e no Relatório das Linhas de Acção Governativa do Governo dos últimos anos, foram apresentadas expressamente as exigências sobre a construção de Macau como cidade inteligente. Para concretizar os referidos trabalhos, o Governo da RAEM criou o “Grupo Especializado para Desenvolvimento da Cidade Inteligente”, subordinado à Comissão para a Construção do Centro Mundial de Turismo e Lazer, de forma a coordenar e promover os trabalhos relacionados à cidade inteligente desenvolvidos dentro do Governo, e a “Comissão Especializada da Cidade Inteligente”, subordinada ao Conselho de Ciência e Tecnologia, para promover a investigação académica, o desenvolvimento das indústrias e a divulgação social, entre outros trabalhos relevantes.

Em Agosto de 2017, o Governo celebrou o “Acordo-Quadro para a Cooperação Estratégica na Área da Construção de uma Cidade Inteligente” com o Grupo Alibaba, no intuito de impulsionar o estabelecimento do centro de computação em nuvem exclusivo do Governo e os projectos relativos à aplicação das tecnologias de megadados, acelerando assim o ritmo de desenvolvimento das infra-estruturas de Macau como cidade inteligente.

De acordo com o plano definido, será construído um centro provisório de computação em nuvem no Centro de Serviços da RAEM na Areia Preta, cujas obras ficaram concluídas em Setembro de 2018. 

Na primeira fase do projecto seis domínios foram assinalados como prioritários: promoção do turismo, formação de talentos, gestão do trânsito, serviços de assistência médica, gestão integrada urbana e prestação de serviços urbanos integrados e tecnologia financeira.

Foram seleccionados dados de licenciamento dos estabelecimentos de restauração, trabalhadores domésticos, obtenção de senhas e marcação para serviços no centro de computação em nuvem organizando progressivamente os dados do Governo.

A segunda etapa compreende o aperfeiçoamento do centro de computação em nuvem e da plataforma de megadados, abrangendo outras áreas como a introdução de novos carros elétricos, a eficiência energética e a construção de postos fronteiriços eletrónicos, através da tecnologia de reconhecimento facial.

Paralelamente, as obras de construção do centro oficial de computação em nuvem no edifício do Terminal de Pac On já foram iniciadas.

Este ano cerca de 20 serviços públicos têm sido prestados de forma totalmente electrónica, nomeadamente no que diz respeito à segurança social, à divulgação jurídica, aos trabalhadores e à prestação de serviços. De 2016 até ao fim de 2019, estima-se que cerca de 90 serviços estejam a funcionar de forma totalmente electronizada.

Segundo o relatório das LAG para 2019, o Executivo tenciona promover, de forma gradual, a abertura de dados do Governo, bem como lançar o “Serviço de Balcão Único”, ou seja, um único balcão onde seja possível tratar, de uma só vez, de vários pedidos ligados a documentos pessoais, encurtando assim o tempo de espera. Depois de uma visita ao “Serviço de Balcão Único”, na Direcção dos Serviços de Identificação (DSI), em Novembro do ano passado, a secretária Sónia Chan disse estar bastante satisfeita com a implementação e o funcionamento do modelo, já que este “não só permite maior conveniência aos cidadãos, mas também melhora a qualidade dos serviços e aumenta a eficácia da DSI”.

A reforma política e o novo IAM

Na fase final do mandato da secretária Florinda Chan, a Assembleia Legislativa (AL) viu ser alterada, em 2012, a proposta de lei eleitoral da AL e do Chefe do Executivo, que permitiu aumentar a composição do hemiciclo com mais dois deputados eleitos pela via directa e dois pela via indirecta. No que diz respeito ao Chefe do Executivo, este passou a ser eleito, a partir de 2014, por uma Comissão Eleitoral de 400 pessoas, mais 100 face ao período anterior do desenvolvimento do sistema político. A reforma política, que ocorreu depois de um período de consulta pública, não previu o aumento do número de deputados nomeados.

O caminho começou a traçar-se em Novembro de 2011, quando o vice-secretário-geral do Comité Permanente da Assembleia Popular Nacional (APN) afirmou que seriam dadas, no final desse ano, as orientações para se avançar com uma reforma política.

Florinda Chan disse que o principal objectivo era “auscultar a sociedade de forma alargada” com o objetivo de se “concluírem todos os trabalhos” para que a reforma fosse implementada nas eleições legislativas de 2013 e do Chefe do Executivo, em 2014, algo que aconteceu. 

A primeira AL, com mandato até ao dia 15 de Outubro de 2001, era composta por 23 membros, oito dos quais eleitos por sufrágio directo, oito por sufrágio indirecto e sete nomeados pelo Chefe do Executivo. A segunda AL, constituída depois das eleições de Setembro do mesmo ano, era composta por 27 membros, dez dos quais eleitos por sufrágio directo, dez por sufrágio indirecto e sete nomeados pelo Chefe do Executivo, com mandato até ao ano de 2005. A terceira e quarta AL foram compostas por 29 membros, 12 eleitos por sufrágio directo, 10 por sufrágio indirecto e sete nomeados pelo Chefe do Executivo. A quinta e posteriores AL foram compostas por 33 membros, 14 eleitos por sufrágio directo, 12 por sufrágio indirecto e sete nomeados pelo Chefe do Executivo. 

Segundo a Lei Básica, o território goza de poder legislativo, sendo a AL o organismo protagonista desse poder. No âmbito da auto-administração, a RAEM exerce por si própria todos os assuntos relacionados com a legislação, o que constitui importante demonstração e garantia do seu alto grau de autonomia. O poder legislativo da RAEM é exercido exclusivamente pela AL sem que mais algum dos outros órgãos ou entidades gozem do mesmo poder.

Além do exercício da competência legislativa de acordo com a lei, a AL exerce ainda poderes de fiscalização e outras competências conforme o estipulado na Lei Básica da RAEM e no Regimento da Assembleia Legislativa.

No tocante ao aprofundamento da reforma institucional, foi aprovada, em 2018, a criação do Instituto para os Assuntos Municipais (IAM), com vista à constituição do órgão municipal sem poder político previsto na Lei Básica, tendo sido feita uma “transição suave” das funções e do pessoal do extinto Instituto para os Assuntos Cívicos e Municipais (IACM), criado em 2001. 

O novo órgão municipal é constituído por dois conselhos, nomeados pela tutela do Chefe do Executivo, um de administração, com um máximo de oito membros, e um consultivo, com não mais de 25. O estabelecimento do IAM levou ainda à transferência de algumas funções e competências para Instituto Cultural e Instituto do Desporto.

A reforma dos tribunais 

Depois de vários estudos, o Governo procedeu em 2018 à revisão da Lei de bases da organização judiciária, que alargou as possibilidades de recurso dos titulares dos principais cargos, cujos processos deixam de ser julgados no Tribunal de Última Instância (TUI) para serem julgados no Tribunal de Segunda Instância (TSI). 

Outra das mudanças trazidas pela revisão deste diploma, implementado em 1999, prende-se com o facto de apenas juízes com cidadania chinesa poderem julgar casos relacionados com segurança do Estado chinês. “Os juízes competentes para julgar estes processos sejam previamente designados pelo Conselho dos Magistrados Judiciais, entre juízes de nomeação definitiva e que sejam cidadãos chineses”, aponta a lei. 

Entre outras mudanças destacam-se também as alterações no quadro dos magistrados e no regime de acumulação de funções, tendo ficado prevista a colocação de “juízes dos tribunais de primeira instância num outro juízo ou tribunal de primeira instância, com vista a uma gestão mais eficaz do volume de trabalho”.

Os tribunais da RAEM exercem com independência a função judicial, sendo livres de qualquer interferência e estando apenas sujeitos à lei. A RAEM dispõe de Tribunais de Primeira Instância, de um Tribunal de Segunda Instância e de um Tribunal de Última Instância, a quem compete o poder de julgar em última instância na Região. A RAEM dispõe de um Tribunal Administrativo que tem jurisdição sobre as acções administrativas e fiscais. 

Os juízes dos tribunais das diferentes instâncias da RAEM são nomeados pelo Chefe do Executivo, sob proposta de uma comissão independente constituída por juízes, advogados e personalidades locais de renome. Os presidentes dos tribunais das diferentes instâncias da RAEM são nomeados de entre os juízes pelo Chefe do Executivo. O Presidente do Tribunal de Última Instância deve ser cidadão chinês de entre os residentes permanentes da RAEM.

Ainda nesta área há a registar a entrada em funcionamento do novo edifício do Tribunal Judicial de Base, em 2017, situado junto ao Lago Sai Van.

Novos Códigos 

Depois de vários anos em vigor, o Governo decidiu proceder a uma revisão gradual dos cinco principais Códigos que vigoram na RAEM. O Código do Processo Penal foi revisto em 2012, seguindo-se o Código Penal (CP), em 2018, mas apenas ao nível dos crimes de índole sexual. 

O diploma prevê o alargamento da abrangência dos crimes de violação e introduz três novos crimes de cariz sexual: a importunação sexual, o recurso à prostituição de menores e a pornografia de menores. Com a revisão, há penas agravadas, nomeadamente a aplicada ao crime de abuso de menores, que pode ir até aos oito anos de prisão.

Contudo, o CP vai novamente ser alterado no que diz respeito às disposições sobre crimes cometidos por pessoas colectivas, sejam associações ou empresas. O objectivo desta revisão é, por um lado, uniformizar todos os critérios e conceitos relativos aos crimes cometidos por pessoas colectivas e incluí-los no CP, uma vez que apenas existem 21 leis avulsas sobre a matéria.

A proposta que está em consulta pública prevê não apenas determinar o âmbito dos crimes que podem ser cometidos por pessoas colectivas, mas também deixar claro, no CP, que “os associados das associações sem personalidade jurídica têm de assumir uma responsabilidade solidária em relação às multas aplicadas às associações pelo cometimento de crime”.

Além disso, foram desenvolvidos diversos projectos legislativos prioritários, tal como a “Lei de bases de gestão das áreas marítimas” aprovada na especialidade, em Julho de 2018. Este diploma surgiu depois do Conselho de Estado da China ter aprovado um novo mapa da divisão administrativa de Macau que determinou que o território passava a ter sob sua jurisdição 85 quilómetros quadrados de áreas marítimas.

Esta medida foi considerada pelo Governo como sendo uma contribuição “para que a RAEM implemente de forma plena e correcta a política de ‘um país, dois sistemas’”, permitindo “uma implementação efectiva da governação de Macau à luz da lei” e uma “clarificação das questões jurisdicionais dentro da área agora definida”.