Tecnologia

A força de um certificado

O Governo continua a apoiar o desenvolvimento das empresas tecnológicas locais
Macau está a intensificar os esforços para promover o desenvolvimento do sector tecnológico através de um sistema de certificação para empresas locais. Apoios financeiros, sessões de intercâmbio e suporte institucional visam impulsionar a indústria, procurando, em última análise, promover a diversificação da economia local

Texto Tony Lai

Um certificado é mais do que uma mera formalidade – é um selo de credibilidade atribuído pelo Governo da Região Administrativa Especial de Macau (RAEM) que pode abrir novas oportunidades para as empresas tecnológicas locais em termos de financiamento, parcerias e expansão. Esta é a premissa do Programa de Certificação de Empresas Tecnológicas, criado pela Direcção dos Serviços de Economia e Desenvolvimento Tecnológico (DSEDT) para impulsionar o crescimento das empresas tecnológicas locais e, a longo prazo, fortalecer o ecossistema da indústria tecnológica da cidade.

Lançado em 2023, o programa classifica as empresas tecnológicas em três níveis: “empresa tecnológica potencial”, “empresa tecnológica em crescimento” ou “empresa tecnológica de referência”. Para se qualificarem, as empresas devem estar constituídas em Macau e operar no sector tecnológico há pelo menos um ano.

A certificação, válida por três anos, é atribuída apenas após uma avaliação abrangente baseada em sete critérios: dimensão de empresa; número dos direitos da propriedade intelectual detidos; situação sobre indústria-universidade-investigação; situação do pessoal de investigação e desenvolvimento; prémios obtidos na área de inovação científica e tecnológica; habilitações académicas do pessoal; e qualificação das empresas associadas.

Até Maio de 2025, 41 empresas tecnológicas locais estavam certificadas através do programa, cobrindo sectores como circuitos integrados, informática, inteligência artificial, medicina tradicional chinesa e novos materiais, segundo dados da DSEDT. Entre estas, estavam seis “empresas tecnológicas de referência”, uma “empresa tecnológica em crescimento” e 34 “empresas tecnológicas potenciais”. Colectivamente, estas empresas empregavam cerca de 1500 pessoas e geraram receitas superiores a 3,6 mil milhões de patacas em 2024, refere o organismo numa resposta escrita à Revista Macau.

“O objectivo do programa é identificar empresas tecnológicas locais qualificadas através de um sistema de avaliação e, ao certificá-las a diferentes níveis, incentivar a expansão dos seus negócios e impulsionar a economia local”, afirma a DSEDT. A tecnologia de ponta é uma das quatro principais indústrias de desenvolvimento prioritário – em paralelo com as áreas da “big health” de medicina tradicional chinesa, das finanças modernas e das convenções e exposições, comércio, desporto e cultura –, através do apoio do sector basilar do turismo e lazer, em linha com a estratégia governamental “1+4” para uma diversificação adequada da economia local.

Novas oportunidades

A Macau Digifluidic Biotecnologia Limitada, uma start-up de biotecnologia fundada em 2019 e incubada pela Universidade de Macau, está entre as 34 entidades certificadas como empresas tecnológicas com potencial. A empresa tem-se dedicado ao desenvolvimento de tecnologia ligada a sistemas microfluídicos digitais e à sua aplicação na área da biologia molecular. O trabalho tem vindo a ganhar reconhecimento, com a sua tecnologia a ser utilizada para desenvolver produtos de testes rápidos que podem substituir os testes laboratoriais convencionais em sectores como a segurança alimentar, o diagnóstico médico, a saúde animal e a agricultura.

“Esta certificação pela DSEDT veio reforçar a nossa credibilidade e visibilidade, o que tem sido benéfico na exploração de oportunidades de cooperação com outras entidades”, sublinha Tianlan Chen, presidente e director-executivo da Macau Digifluidic. A iniciativa do Governo da RAEM “apoia o nosso desenvolvimento empresarial a longo prazo”, acrescenta.

A certificação, atribuída em Março de 2024, abriu mais portas à Macau Digifluidic, que passou a ter maior acesso a eventos e feiras do sector tecnológico, incluindo a InnoEX – Exposição Internacional de Inovação de Hong Kong, um dos principais eventos tecnológicos da Ásia para start-ups, investidores e empreendedores. “Também fomos apresentados a departamentos governamentais, serviços públicos e empresas privadas, incluindo operadores de resorts integrados, para explorar potenciais aplicações das nossas soluções”, refere Tianlan Chen. Segundo o responsável, a certificação da DSEDT também abriu portas a apoio financeiro adicional, como o proveniente do Fundo para o Desenvolvimento das Ciências e da Tecnologia (FDCT).

Para acelerar o crescimento das empresas tecnológicas certificadas, vários departamentos do Governo da RAEM estão a prestar apoio personalizado, adianta a DSEDT. Por exemplo, dois programas de financiamento relevantes no âmbito do FDCT – o “Plano de Financiamento para Investigação e Desenvolvimento Inovadores de Empresas” e o “Programa de Apoio à Formação de Talentos em Investigação e Desenvolvimento Científico e Tecnológico” — oferecem vias de candidatura e elegibilidade para apoios financeiros para estas empresas tecnológicas.


“Esta certificação pela DSEDT veio reforçar a nossa credibilidade, o que tem sido benéfico na exploração de oportunidades de cooperação”

TIANLAN CHEN
PRESIDENTE E DIRECTOR-EXECUTIVO
DA MACAU DIGIFLUIDIC

No âmbito do programa de inovação empresarial, as “empresas tecnológicas de referência” podem candidatar-se a um apoio financeiro até cinco milhões de patacas. Para projectos orientados para as necessidades do desenvolvimento da diversificação adequada da economia de Macau, estas empresas são elegíveis para financiamento até 20 milhões de patacas. Já o programa de talentos oferece apoio financeiro adicional, fornecendo subsídios mensais que cobrem até 70 por cento dos salários do pessoal de investigação e desenvolvimento elegível. Este financiamento ajuda as empresas a “realizarem actividades inovadoras de investigação e desenvolvimento e a recrutarem talentos relevantes”, afirma a DSEDT.

“A DSEDT, em conjunto com outros departamentos governamentais de Macau, apoia activamente empresas tecnológicas certificadas na participação em feiras do sector a nível local e internacional, além de facilitar oportunidades de parcerias comerciais para as ajudar a expandir os seus negócios”, realça o organismo. “Através do mecanismo de parceria coordenado pela DSEDT, algumas empresas certificadas já formaram parcerias de sucesso com operadores de resorts integrados, aplicando as suas soluções tecnológicas em feiras e eventos promocionais destes operadores.”

Uma cerimónia de atribuição de certificados a nove empresas tecnológicas foi realizada em Outubro de 2024

Expansão além-fronteiras

Num movimento para aprofundar a integração entre Macau e a Zona de Cooperação Aprofundada entre Guangdong e Macau em Hengqin, as autoridades expandiram o Programa de Certificação de Empresas Tecnológicas da cidade para incluir operações afiliadas na Zona de Cooperação. De acordo com a DSEDT, os critérios de certificação foram revistos em Abril de 2024, como parte dos esforços para alinhar o desenvolvimento das indústrias da ciência e tecnologia nas duas regiões. Os critérios actualizados para avaliação das empresas candidatas à certificação têm agora em conta as actividades comerciais e as qualificações das entidades afiliadas em Hengqin.

Paralelamente, as autoridades de Hengqin introduziram um subsídio financeiro único, que varia entre 200.000 e 800.000 renminbi, destinado às empresas da Zona de Cooperação que sejam associadas às empresas de Macau certificadas. “Estas [medidas] incentivam as empresas tecnológicas a aproveitarem as vantagens de Macau e Hengqin para expandirem os seus negócios”, salienta a DSEDT. Até Maio do corrente ano, mais de 15 empresas certificadas pelo programa da DSEDT tinham estabelecido filiais em Hengqin.

Mas os objectivos são ainda mais ambiciosos, com a DSEDT a revelar que estão em curso esforços para alinhar o seu programa de certificação com políticas relevantes noutras cidades que fazem parte da Grande Baía Guangdong-Hong Kong-Macau. Num avanço significativo, o Governo da RAEM e o Ministério do Comércio da China assinaram, no ano passado, o Acordo relativo à Alteração ao Acordo sobre Comércio de Serviços no âmbito do CEPA II, que permite que as empresas tecnológicas certificadas pela RAEM recebam um tratamento equivalente ao das empresas nacionais de tecnologia de ponta no Interior da China, com excepção dos incentivos fiscais.

Entre as empresas beneficiadas pelo programa de certificação está a InfoMacro Tecnologia de Informação Limitada, uma das entidades reconhecidas como “empresa tecnológica de referência”. Com sede em Macau e um centro de investigação e desenvolvimento em Zhuhai, a InfoMacro é uma empresa que se dedica à tecnologia financeira e à inovação aplicada. Fundada em 2014, é especializada em serviços de dados transfronteiriços, plataformas integradas, análise de “big data”, inteligência artificial e cibersegurança. A empresa obteve reconhecimento público pelo desenvolvimento da aplicação “Código de Saúde de Macau” durante a pandemia da COVID-19, bem como de outras plataformas digitais, incluindo o sistema de aplicação de quotas de veículos de Macau para viagens transfronteiriças.


“As políticas governamentais locais apoiam cada vez mais as empresas tecnológicas, o que é vital para o crescimento a longo prazo da indústria”

SIMON LEI
FUNDADOR E DIRECTOR-EXECUTIVO
DA INFOMACRO TECNOLOGIA

“A concorrência em Macau, tanto por parte das empresas internacionais como das empresas do Interior da China, é intensa. Esta certificação dá-nos uma vantagem sólida e apoia o desenvolvimento sustentável da empresa”, comenta Simon Lei, fundador e director-executivo da InfoMacro. Por recomendação da DSEDT, a empresa foi recentemente reconhecida pelas autoridades de Zhuhai como uma “empresa de alta qualidade”, reforçando ainda mais o seu perfil transfronteiriço.

“A estrutura industrial de Macau está a mudar para uma maior diversificação na era pós-COVID. As políticas governamentais locais apoiam cada vez mais as empresas tecnológicas, o que é vital para o crescimento a longo prazo da indústria tecnológica local”, realça Simon Lei.

Aproveitando a dinâmica do programa de certificação e o desenvolvimento tecnológico contínuo em Hengqin, a InfoMacro estabeleceu recentemente uma subsidiária na Zona de Cooperação, com foco na aplicação da inteligência artificial ​​em áreas como as finanças, o combate ao branqueamento de capitais e a monitorização em tempo real. “Hengqin oferece um amplo apoio institucional, recursos industriais e oportunidades de inovação que criam um vasto espaço para o desenvolvimento de empresas tecnológicas”, afirma o fundador da InfoMacro. “Continuaremos a aumentar o investimento em investigação e desenvolvimento, a atrair talentos de primeira linha e a ultrapassar os obstáculos tecnológicos para fornecer produtos e serviços competitivos a nível internacional”, acrescenta.

Mais e melhores talentos

Ao analisar a implementação do programa de certificação desde o seu lançamento em 2023, a DSEDT refere que a iniciativa “incentivou as empresas locais a expandirem as suas operações e a melhorarem as suas capacidades de inovação através de várias medidas de apoio”. Como resultado das melhorias no desempenho operacional e na capacidade de inovação, algumas empresas inicialmente certificadas como “empresa tecnológica potencial” avançaram para níveis superiores. Entre estas, uma empresa foi promovida a “empresa tecnológica em crescimento” e duas foram elevadas a “empresa tecnológica de referência”, exemplifica o organismo.

Para melhor responder às necessidades do sector e apoiar a estratégia de desenvolvimento de Macau, o programa de certificação tecnológica tem sido continuamente actualizado. Para além da revisão efectuada no ano passado, os regulamentos foram novamente revistos em Abril deste ano, para introduzir a possibilidade de benefícios para empresas fundadas por talentos de topo oriundos do exterior de Macau.

Especificamente, as empresas tecnológicas criadas por indivíduos classificados como talentos de alto nível ou excepcionais – ao abrigo do “Regime jurídico de captação de quadros qualificados” – estão agora isentas da avaliação de pontuação. Estas empresas podem obter a certificação de “empresa tecnológica potencial” desde que cumpram com os requisitos mínimos de elegibilidade.

“Esta actualização visa incentivar indivíduos com uma sólida experiência e conhecimento tecnológico a estabelecerem empresas tecnológicas em Macau”, explica a DSEDT. “Ao alavancar os seus pontos fortes profissionais, estes talentos podem impulsionar a inovação a nível local e criar mais oportunidades para a diversificação económica adequada de Macau.”