Nasceu em 2007 com um grande objectivo em mente: acabar com as fronteiras de Macau, cidade de dimensões reduzidas, e mostrar que aqui se faz arte, que a urbe vai muito além dos casinos noticiados por esse mundo fora. Mas foi criada também com o intuito de, localmente, proporcionar um ambiente que estimule a produção artística. Menos de três anos depois, a Art for All (AFA) conta com um espaço de exposições em Macau, outro em Pequim e trabalho feito que possibilita aos seus responsáveis afirmar que, “por enquanto, correu bem”.
James Chu, artista plástico e presidente da AFA, entende que a experiência acumulada desde o início da associação permite olhar para o futuro “de uma forma bastante optimista”. O movimento de artistas conta neste momento com cerca de 30 membros e tem-se destacado pelo facto de apostar no intercâmbio cultural, ao juntar gente de diferentes pontos da Grande China. “Temos agora um espaço novo em Macau e vamos ter também uma nova galeria em Pequim”, explica o responsável.
Por se tratar de uma associação sem fins lucrativos feita por pessoas que não trabalham a tempo inteiro, a AFA conhece algumas limitações, tanto em termos orçamentais, como no que toca à possibilidade de lançar artistas plásticos no mercado internacional. Mas Chu não se dá por vencido. Com dez eventos feitos em Macau e em Pequim no último ano, a associação trabalha numa lógica de consolidação. Mais recentemente, a AFA criou bolsas que se destinam a apoiar os estudos de jovens artistas. São passos para a construção de um “sistema” e de uma política para a arte que “crie equilíbrios” e da qual James Chu diz ser defensor.
O presidente da AFA acha que nos últimos tempos a dinâmica cultural da cidade tem aumentado – a sua associação para isso tem também contribuído – mas receia que tal não passe de um momento, fruto das circunstâncias. O ano que passou teve duplas celebrações – o 60º aniversário da República Popular da China e os dez anos do estabelecimento da Região Administrativa Especial de Macau – e foram muitos os eventos de índole artística na cidade. “Foi como um fogo-de-artifício! Mas não pode ser assim, porque os foguetes são bonitos mas duram pouco tempo.” Para que haja continuidade, é necessário “proporcionar mais condições aos artistas, para que se dediquem à arte a tempo inteiro”.
Independência e mecenato
O projecto liderado por Lúcia Lemos vai já a caminho do sétimo ano de existência e, de modo distinto da AFA (que coloca a tónica nas artes plásticas), tem as indústrias criativas como objecto principal da sua actividade.
O Centro de Indústrias Criativas (que dá também pelo nome de Creative Macau) surgiu numa altura em que o conceito estava ainda distante do território. No início, recorda a directora, o trabalho foi feito com base em artistas e criativos com nome consolidado, “para percebermos se o projecto fazia sentido”.
A ideia resultou e a carteira de membros foi sendo alargada. “Há sempre gente à espera para expor” no espaço da Creative, conta Lúcia Lemos, que acrescenta nunca ter tido problemas em encontrar artistas interessados em participar nas actividades da entidade sob a alçada do Instituto de Estudos Europeus de Macau. Só em 2009, a Creative Macau organizou 48 actividades, entre participações em feiras e certames, seminários, exposições e workshops.
Olhando para fora do organismo que dirige, Lúcia Lemos entende que a energia que se tem vindo a sentir ao nível cultural em Macau “é formidável, muito saudável”. Não obstante, enquanto gestora e agente cultural, quer mais e melhor. Muitos dos projectos de índole cultural dependem de financiamento público e a responsável pela Creative Macau considera que faz falta um registo independente, de “gente que assuma o risco”. Macau carece ainda de um “mecenato activo” oriundo do sector privado e de uma lógica cultural mais internacional. Para a responsável, não basta à cidade ser internacional em certas dimensões. “Deve sê-lo também ao nível cultural.”
Novas alternativas
Parte do trabalho feito durante o primeiro ano de vida do Albergue da Santa Casa da Misericórdia prende-se exactamente com a necessidade de trazer até Macau novas formas de pensar e modelos diferentes que levem os criativos e agentes culturais locais a outras abordagens. Oficialmente inaugurado em Janeiro do ano passado, o Albergue SCM Creative Lab organizou, no espaço de um ano, 62 actividades, onde cabem conferências, exposições, visitas de estudo, debates, performances de multimédia, workshops, leitura de poesia e preparação de publicações.
Em jeito de balanço, o director do projecto, o arquitecto Carlos Marreiros, fala em “alegria pelo reconhecimento do trabalho da nossa pequena equipa”. A média elevada de actividades mensais feitas com um “orçamento pequeno e muito controlado” faz com que esteja satisfeito com os resultados obtidos, mas tal não significa que tenham sido atingidos todos os objectivos desta organização instalada numa das zonas mais carismáticas da cidade, o Bairro de São Lázaro.
Para o segundo ano de trabalho, e a acontecer já durante Abril, o Albergue SCM Creative Lab organiza um encontro internacional de indústrias criativas, com participantes de vários países europeus, bem como do interior do País, Hong Kong e Taiwan. A ideia fundamental é debater sistemas de implementação das indústrias criativas, compreendendo áreas tão distintas como “formas de produção, marketing, marcas, legislação e direitos de autor”, e definir um modelo aplicável a Macau. Haverá ainda workshops em diversas áreas relacionadas com as indústrias criativas.
Pelo facto de oferecer actividades distintas, o Albergue tem sido, nos últimos tempos, um espaço da cidade com bastante dinamismo. Acompanha, de certo modo, uma tendência que se sente na região. Carlos Marreiros analisa o fenómeno em duas perspectivas distintas: por um lado, é resultado das circunstâncias, de se viver uma fase de mudança, do Governo ao início de uma nova década, dando-se assim início a um novo ciclo; por outro, é sinal de que a comunidade procura alternativas.
“O último ano foi bastante dinâmico e a tendência é para crescer. As pessoas têm dado mais atenção às coisas culturais e artísticas”, afiança, sublinhando que o Albergue tem procurado chamar a sociedade à participação activa, para que “os eventos dos designers não sejam só para os designers, e os de arquitectos apenas para os arquitectos”. Marreiros acrescenta que, cansadas de uma “sociedade extremamente materialista, é natural que as pessoas sigam noutros sentidos”. Contemplar uma pintura, um objecto bonito ou ouvir um concerto são alternativas. “As coisas estão em crescendo em termos de arte.”
Querer mais
Frank Lei lidera uma das associações mais enraizadas no panorama cultural local. O Armazém do Boi conta com vários anos de experiência, apostando numa oferta específica, com um enfoque muito alternativo. O trabalho da associação tem sido constante, e as duas dezenas de actividades feitas no espaço do último ano seguem a linha traçada desde o início.
Já quando se fala em termos globais, Lei assinala que tem havido muitas mais oportunidades de se organizarem diferentes tipos de eventos. “As comemorações do ano passado também ajudaram a que fossem feitas diferentes actividades. Até houve coisas a mais a acontecer”, diz Frank Lei, com uma gargalhada.
Além de incentivar a formação de artistas locais e de trazer pessoas de fora “para que se troquem experiências”, o Armazém do Boi tem saído à rua para interagir com a comunidade, sobretudo aquela que tem menos possibilidades de se dirigir a uma sala de espectáculos. É uma intervenção social através da cultura que, considera Lei, tem corrido bem. Permite tornar a arte mais acessível e explicar que ela assume diferentes formas.
Ainda assim, e à semelhança do director da AFA, o responsável pelo Armazém do Boi acha que falta trabalhar a “cultura por dentro”, que é como quem diz “dar oportunidades aos artistas”. Macau é uma cidade com ânsias de cultura: de quem a consome e de quem a produz.