Associação Industrial e Comercial de Macau

Desafios são também oportunidades para as PME: Ng Wah Wai

As empresas de Macau continuam a navegar um ecossistema complexo, especialmente com a mudança nos hábitos dos consumidores. Ng Wah Wai, dirigente da Associação Industrial e Comercial de Macau, salienta que a aposta digital e a promoção de produtos dos países de língua portuguesa podem ajudar numa estratégia de internacionalização

Texto Stephanie Lai

O presidente executivo da Associação Industrial e Comercial de Macau diz que os desafios das pequenas e médias empresas (PME) de Macau representam também uma oportunidade para o sector. A adaptabilidade e a inovação, defende Ng Wah Wai, serão ferramentas fundamentais para o desenvolvimento das empresas locais.

Constituída há 16 anos, a Associação Industrial e Comercial de Macau conta com membros de mais de 20 sectores, nomeadamente comércio electrónico, saúde, construção, advocacia, contabilidade, logística, entre outros. A associação representa maioritariamente PME locais.

Se, por um lado, a mudança de rotinas dos residentes locais – desde actividades de lazer; de poupança e despesa; de hábitos digitais; e de sustentabilidade – tem afectado o volume de negócios das empresas de Macau, por outro, também os hábitos de consumo dos turistas são actualmente diferentes, uma transformação a que a maioria das PME ainda se tem de adaptar, argumenta o dirigente associativo.

“As PME não se podem agarrar às memórias de 2017 ou anos anteriores”, afirma Ng Wah Wai em entrevista à Revista Macau, referindo-se ao que chamou de um período “próspero” para quase todos os sectores comerciais em Macau, com um grande influxo de turistas, muitos dos quais com elevado poder de compra.

“As PME precisam de ter consciência de quais são os objectivos dos visitantes actuais e perceber como podem beneficiar com isso”, frisa o mesmo responsável, reconhecendo que o processo de adaptação não é imediato: requer tempo e dedicação.

Segundo Ng Wah Wai, uma lição essencial ocorreu no período da pandemia da COVID-19, durante o qual as pessoas estiveram mais dependentes do uso de plataformas digitais para adquirir serviços e produtos. Nesse contexto, aprender a utilizar diversas aplicações e plataformas digitais tornou-se fundamental para as empresas conseguirem aumentar o seu volume de negócios e até fazer uma gestão eficiente dos seus inventários, exemplifica.

Apoiar a inovação

Identificando a necessidade de as empresas se manterem a par das tendências tecnológicas, a Associação Industrial e Comercial de Macau tem procurado apoiar as PME locais nos esforços de inovação, realça Ng Wah Wai. No ano passado, recorda, a associação realizou uma campanha de promoção de consumo em colaboração com vários comerciantes e lojas locais através de uma parceria com o “Gaode Map”, um serviço chinês de mapeamento e navegação popular entre os utilizadores do Interior da China.

No passado, a associação já tinha apoiado as PME locais a colaborarem com o “Dazhong Dianping” – uma plataforma digital chinesa que permite aos usuários encontrarem e avaliarem estabelecimentos comerciais como restaurantes, lojas e serviços – para promoverem os respectivos produtos ou ofertas gastronómicas.

Mas cada situação é única e deve ser avaliada individualmente, levando em consideração as suas particularidades e contexto, sublinha Ng Wah Wai. No caso das empresas a operar no sector dos serviços turísticos, a diversificação deve focar-se na própria fonte de clientes, analisa o dirigente. Nesse sentido, a Associação Industrial e Comercial de Macau tem produzido vídeos promocionais de várias zonas de Macau, procurando encorajar os turistas – tanto do Interior da China como visitantes internacionais – a visitarem bairros comunitários e a consumirem em estabelecimentos ou lojas locais.

“Em 2024, realizámos quatro campanhas de promoção online [através de vídeos] que abrangeram a Taipa, Coloane, a Avenida do Conselheiro Ferreira de Almeida e a zona norte, procurando ajudar as empresas a atraírem mais turistas”, conta o presidente executivo da associação, referindo que os vídeos foram também promovidos no exterior, em mercados como a Malásia.


“Como associação representativa do sector, esperamos continuar a trabalhar todos os anos para ajudar as PME a atraírem mais clientes”

NG WAH WAI
PRESIDENTE EXECUTIVO DA ASSOCIAÇÃO INDUSTRIAL E COMERCIAL DE MACAU

Para chegar ao maior número possível de consumidores, os vídeos sobre a gastronomia local e sobre outros estabelecimentos comerciais de Macau foram divulgados nos vários resorts integrados da cidade. A iniciativa contou também com a participação do Guangzhou Public Transport Group, considerado a maior empresa de transporte público e rodoviário do sul da China, de acordo com Ng Wah Wai.

A iniciativa dos vídeos promocionais continua a decorrer este ano, abrangendo as zonas do Largo do Senado, da Rotunda de Carlos da Maia, outras áreas da zona norte da península, bem como Hengqin, frisa o dirigente.

“O objectivo é utilizar plataformas e aplicações digitais […] para ajudar as PME a expandirem os seus negócios, ajudando-as a atraírem mais visitantes internacionais”, adianta.

“O que as PME precisam de fazer, urgentemente, é reavaliar os seus modelos de negócio e ver como podem adaptá-los, aperfeiçoá-los e expandi-los”, acrescenta. “Como associação representativa do sector, esperamos continuar a trabalhar todos os anos para ajudar as PME a atraírem mais clientes.”

O poder da diferença

De acordo com Ng Wah Wai, cada estabelecimento deve procurar oferecer algo singular e distinto dos demais, evitando uma certa homogeneidade da oferta. Explorar novos modelos de retalho baseados no exterior – incluindo nos mercados dos países de língua portuguesa – pode ser uma direcção a seguir, se esses modelos puderem ser adaptados com sucesso ao mercado local.

“Já existem iniciativas governamentais que promovem o comércio nos [seis] distritos”, frisa o dirigente, referindo-se a seis bairros comunitários da cidade, para os quais o Governo tem promovido esforços de revitalização, incluindo trajectos turísticos.

“Devemos ter elementos que correspondam ao desenvolvimento [dos seis bairros]; [esta] é uma direcção fundamental para nós e será incorporada numa visita aos países de língua portuguesa prevista para o próximo ano”, avança Ng Wah Wai.

Através da visita, que entre outros destinos inclui Portugal, a Associação Industrial e Comercial de Macau pretende realizar sessões de intercâmbio com associações comerciais de alguns dos países de língua portuguesa para que os empresários de Macau possam explorar eventuais oportunidades de colaboração com lojas típicas e estabelecimentos de alimentação e bebidas das regiões a visitar.

“Se houver lojas nos países de língua portuguesa que vendam bons produtos […] ou que vendam produtos artesanais especiais, veremos se podemos colaborar com elas, para que possam […] estabelecer-se nos seis bairros da cidade”, adianta o presidente executivo.

E acrescenta: “Para os visitantes, o foco está sempre nos aspectos do retalho, das comidas e bebidas […] qualquer elemento que possa ajudar a atrair mais visitantes internacionais é, na minha opinião, a direcção que as PME de Macau devem seguir para progredir.”

O papel de plataforma

Mas a Associação Industrial e Comercial de Macau reveste-se de uma missão mais ampla: ajudar a impulsionar o intercâmbio entre as PME de Macau e da Grande Baía Guangdong-Hong Kong-Macau com as empresas dos países de língua portuguesa. Para alcançar essa meta, a associação criou, há três anos, uma comissão consultiva especializada sobre os países de língua portuguesa, refere Ng Wah Wai.

A comissão consultiva especializada sobre os países de língua portuguesa foi criada há três anos

“Muitas [PME de Macau] estão a esforçar-se, mas não sabem como procurar sinergias com organismos como o Fundo de Cooperação e Desenvolvimento China-Países de Língua Portuguesa” ou como promover os seus produtos junto dos mercados dos países de língua portuguesa, realça o responsável.

“A Grande Baía tem muitas cidades que já ouviram falar dos países de língua portuguesa, mas não sabem como entrar nesses mercados”, acrescenta. Por outro lado, a associação já recebeu pedidos de informação de empresas dos mercados de língua portuguesa sobre estratégias para entrar no mercado chinês.

É neste contexto que a associação pode desempenhar um “papel de plataforma”, sublinha o dirigente. “Dentro da nossa comissão [especializada], temos membros profissionais das áreas da banca, da contabilidade e até mesmo empresários [que gerem negócios] lá [nos países de língua portuguesa]. Assim, quando prestamos o serviço de consultoria, as pessoas não se deparam com esforços inúteis e não precisam de recorrer a agentes”, acrescenta.

A Associação Industrial e Comercial de Macau tem duas outras comissões especializadas: uma sobre assuntos comerciais relacionados com a Grande Baía, e outra na área da “big health” de medicina tradicional chinesa.

Através destas comissões consultivas, a associação oferece consultoria e assistência a empresas do Interior da China em temas que vão desde a criação de uma empresa em Macau até ao apoio na comercialização dos seus produtos para os mercados internacionais, explica Ng Wah Wai.

A área da “big health” de medicina tradicional chinesa é uma das quatro principais indústrias de desenvolvimento prioritário de Macau, em linha com a estratégia governamental “1+4” para uma diversificação adequada da economia local. Neste âmbito, a Associação Industrial e Comercial de Macau pretende aprofundar o seu papel para apoiar a internacionalização do sector, salienta o dirigente.

“Esperamos construir laços com os países de língua portuguesa, visto que a medicina tradicional chinesa e os suplementos alimentares não são estranhos a estes países, como Portugal ou Brasil. O eventual modelo de cooperação com as suas universidades, entidades ou empresas locais é algo em que temos de trabalhar este ano”, diz Ng Wah Wai. “Esperamos contribuir com o nosso esforço para ajudar Macau a diversificar a sua economia”, remata.