“Futuro é visto com confiança e optimismo”

Mário Vicente, delegado de Cabo Verde no Fórum Macau, antevê a concretização de projectos com claros benefícios económicos, assim como o reforçar continuado das relações entre o seu país e a China

 

 

 

CABOVERDE

Texto Nuno G. Pereira | Fotos Gonçalo Lobo Pinheiro

 

“O Fórum Macau, enquanto mecanismo complementar às relações entre a China e os Países de Língua Portuguesa, tem vindo a cumprir o seu papel na promoção da imagem e das oportunidades de negócios dos diferentes países que nele participam.” Mário Vicente, delegado de Cabo Verde junto do Secretariado Permanente do Fórum para a Cooperação Económica e Comercial entre a China e os Países de Língua Portuguesa (Macau), faz uma avaliação positiva, dando especial relevo aos contactos promovidos pelo Fórum no Interior da China, em diversas acções de contacto com instituições públicas e privadas.

O seu país não é um colosso económico como Angola e Brasil, mas possui muitos atractivos. “Cabo Verde, sendo um país de pequena dimensão (territorial e do próprio mercado), tem procurado aproveitar esta plataforma para, por um lado, promover o país nas várias províncias da China através das actividades do Fórum, mas também através de acções coordenadas a partir da nossa Embaixada em Pequim, com vista a dar a conhecer as potencialidades de investimentos no nosso país, com base nas vantagens competitivas e comparativas. Refiro-me, nomeadamente, à localização geopolítica estratégica, à estabilidade política, económica e social, e às excelentes condições para o investimento externo. É preciso também dizer que Cabo Verde tem condições especiais de acesso a mercados como a CEDEAO (Comunidade Económica dos Estados Africanos do Oeste), a Parceria Especial com a União Europeia, e o projecto AGOA (African Growth and Opportunity Act), com Estados Unidos e Canadá.”

O delegado assume que Cabo Verde é praticamente desconhecido no mundo empresarial chinês e que, por isso, o Fórum tem servido antes de mais para dar a conhecer o país e descobrir parceiros de cooperação privada na China.

 

Papel do delegado

Mário Vicente define os delegados junto do Secretariado Permanente do Fórum como promotores da imagem do seu país e das oportunidades de investimentos que o mesmo oferece. “Através de actividades do Fórum e em acções levadas a cabo através da Embaixada, contactando com potenciais investidores e parceiros, apresentado o país e suas oportunidades, fazendo as devidas articulações com instituições públicas em Cabo Verde mas também com o sector privado nacional.”

No seu caso específico, e sendo Cabo Verde um país pequeno, os desafios de desenvolvimento vão muito além das acções de promoção de investimento. “Estou sob directa coordenação da Embaixada em Pequim, colaborando sempre que chamado em acções essencialmente relacionadas com questões económicas. Em Macau, procuro ainda dinamizar a cooperação bilateral entre os governos de Cabo Verde e de Macau, através de protocolos e acordos de cooperação em diversas áreas de potencial desenvolvimento com vantagens mútuas: turismo, jogo, registos notariais, educação, cultura, saúde. Já há alguns acordos assinados e outros em fase de conclusão. Temos vindo a criar as condições para materialização de acções concretas.”

 

Expectativa em alta

Enquanto representante de Cabo Verde, Mário Vicente traz expectativas legítimas quanto à intervenção futura do Fórum. Afirma que a instituição tem cumprido o papel de dinamizador de negócios entre os seus países-membros,  mas sublinha que há um novo desafio na sua actuação para garantir resultados concretos. Um crescimento natural, onde se faça mais e melhor. “O desafio pode implicar mudanças substanciais no funcionamento e na estratégia, alguma mudança de paradigmas e abordagens. No essencial, porém, o futuro é visto com confiança e optimismo na concretização de projectos com claros benefícios económicos e sociais dos nossos países. Ou seja, para o melhoramento do bem-estar das populações, que afinal é o fim último dos governos que representamos.”

Acima de tudo, está em cima da mesa a operacionalização do Fundo de Cooperação e Desenvolvimento entre a China e os Países de Língua Portuguesa. O Fundo, anunciado em Novembro de 2010, durante a III Conferência Ministerial do Fórum, pelo então primeiro-ministro chinês Wen Jiabao vale mil milhões de dólares. Foi efectivamente criado em Junho de 2013, com um orçamento inicial de 125 milhões de dólares. “Este novo instrumento de cooperação económica pode alavancar o Fórum para um patamar mais elevado, procurando resultados mais concretos e visíveis. A IV Conferência Ministerial, sob o lema ‘Novo ciclo, novas oportunidades’ mostrou outras perspectivas para a actuação do Fórum, na sua organização interna e nas suas actividades na China e nos países de língua portuguesa, enquanto mecanismo de implementação do novo Plano de Acção.”

Os delegados têm aqui um papel fundamental. “Devemos ser proactivos na identificação de projectos que preencham os requisitos exigidos pelo fundo, é uma oportunidade de agarrar investimentos. Ao mesmo tempo, continuaremos à  procura de parceiros chineses, e não só, para projectos fundamentais no desenvolvimento económico dos nossos países.”

 

 

Onde estão os investimentos

 

Quais os investimentos mais importantes da China em Cabo Verde?

“A relação diplomática entre China e Cabo Verde começa oficialmente em 1976, portanto um ano após a nossa independência. Desde então a China tem sido um parceiro importante para o processo de construção do Estado de Cabo Verde e seu desenvolvimento. Os investimentos foram basicamente de cariz público, como formação de quadros e construção de escolas, infra-estruturas desportivas e edifícios públicos simbólicos da República (como a Assembleia Nacional e o Palácio do Governo). Mais recentemente, o financiamento de projectos como E-Governance e Habitação Social (enquadrado no grande projecto nacional denominado Casa para Todos) e a primeira barragem de Cabo Verde. A nível privado, as coisas ganharam outro rumo após o estabelecimento da Embaixada em Pequim (2007) e a presença no Fórum de Macau (2008). Nos últimos anos procuramos uma estratégia de cooperação mais económica e de relação directa com potenciais parceiros/investidores. Há vários projectos em discussão entre empresas de Cabo Verde (nesta fase essencialmente públicas) e da China (públicas e privadas) que, espera-se a breve trecho, vão trazer resultados com grande impacto na nossa economia. A nível privado, ainda não existe um grande número de investimentos chineses em Cabo Verde, mas há bons exemplos. Embora sejam de pequena-média dimensão, são consistentes e com impacto na nossa economia: empresas de prestação de serviços na construção civil, televisão por satélite, restaurantes, área automóvel e uma grande rede de lojas com produtos chineses, que se espalharam pelo país e estão bem integradas.”

 

Quais só foram possíveis devido à existência do Fórum?

“O Fórum é um mecanismo complementar às cooperações bilaterais entre China e os países de língua portuguesa. Assim, dificilmente se pode concluir que qualquer projecto de investimento surja como resultado apenas pela acção do Fórum. Tanto em Cabo Verde, como em relação a outros países que participam no Fórum, há projectos de parceria ou investimento que foram desencadeados através deste organismo, mas não é possível dissociá-los de outras acções levadas a cabo pelas embaixadas em Pequim e por outras instituições de promoção de investimentos dos diferentes países.”

 

Cabo Verde tem investido na China?

“Cabo Verde é ainda um país à procura de investimentos, não tendo por agora capacidade endógena de investir no exterior, nomeadamente na China. No seu processo natural de desenvolvimento económico, espera-se que venha a ter investimentos noutros países, incluindo a China.”

 

 

 

Populações abertas ao mundo

Mário Vicente está no Fórum há dois anos e meio. Uma nomeação surgida na sequência das funções que desempenhou durante quase três anos: director de Gabinete do Secretário de Estado de Economia de Cabo Verde. “Na altura éramos responsáveis pelo dossiê de cooperação económica com a China, incluindo o Fórum de Macau. O convite surge de forma natural, uma vez que o meu antecessor, o Dr. Francisco Mendes, tinha que regressar a Cabo Verde para seguir a sua carreira na diplomacia. O desafio para a minha vida profissional foi aceite com sentido de responsabilidade e determinação, procurando como é natural cumprir os objectivos definidos.”

A chegada a um espaço tão longínquo do seu, na geografia e na cultura, trouxe uma experiência rica. E agradável. “A população de Macau, tal como a de Cabo Verde, sempre foi muito aberta ao mundo. Isto torna-as muito iguais na forma como acolhem os que chegam. Aquilo que em Cabo Verde chamamos morabeza (saber receber com alegria e simpatia, procurando que o outro se sinta em casa). É isto que se sente em Macau. Aliás, iria além da minha experiência pessoal para abordar a da integração da comunidade cabo-verdiana na sociedade de Macau, que torna ainda mais evidente esta abertura. Obviamente que alguns aspectos como a gastronomia e a língua são um pouco mais ‘estranhos’, mas tenho-me adaptado bem. Incluindo a minha família, em particular as minhas filhas. Na vida quotidiana, destaco a segurança e o respeito pelas pessoas, os outros ‘ingredientes’ que facilitam a integração. É evidente que existem aspectos bastante diferentes e muitas vezes de difícil percepção, mas que constituem as nossas diferenças socioculturais e as quais procuro perceber e adaptar-me para melhor conviver.”

 

 

Investimentos emblemáticos da China em Cabo Verde

 

Administração Pública

Palácio do  Governo, Assembleia Nacional, Palácio do Presidente, projecto E-Governance, formação de quadros

 

Educação

Escolas (incluindo o Complexo Educacional de Santa Maria, na ilha do Sal), Biblioteca Nacional, Auditório Nacional

 

Saúde e apoio social

Hospital Agostinho Neto, habitação social, formação de quadros

 

Energia

Barragem do Poilão, formação de quadros.

 

Desporto

Várias infraestruturas desportivas, onde se destaca o Estádio Nacional.

 

Investimento privado

Empresas de prestação de serviços na construção civil, televisão por satélite, restaurantes, área automóvel e uma grande rede de lojas.