Guiné-Bissau

Da costa ao caju, um futuro promissor

A castanha-de-caju da Guiné-Bissau deve chegar ainda este ano aos supermercados da China, mas Bissau conta também com Pequim para ajudar a edificar unidades de processamento de castanha-de-caju no país africano, diz Abdu Jaquité, delegado da Guiné-Bissau junto do Secretariado Permanente do Fórum de Macau. Por outro lado, são também os sectores da agricultura, das pescas, da extracção mineira e do turismo que fazem do país uma das economias do futuro

Texto Marco Carvalho

Um país por explorar. Com reservas significativas de bauxite, de fosfato e de areias pesadas, a Guiné-Bissau é, assegura Abdu Jaquité, uma jóia à espera de ser esmerilada. O representante da Guiné-Bissau junto do Secretariado Permanente do Fórum para a Cooperação Económica e Comercial entre a China e os Países de Língua Portuguesa (Macau) – também conhecido como Fórum de Macau – coloca “a prospecção e mineração dos recursos minerais existentes” entre os pilares fundamentais sobre os quais se alicerça o desenvolvimento económico do país.

Mas, enquanto o potencial das jazidas mineralógicas não se concretiza plenamente, é outra mais-valia natural – a castanha-de-caju – que continua a alavancar a economia guineense, debilitada por décadas de fragilidade política e institucional.

Tido como um produto estratégico para o desenvolvimento da economia do país, ao ponto de as autoridades de Bissau terem fixado no ano passado um preço base de comercialização, a castanha-de-caju nutre, em grande medida, a economia do país da costa ocidental africana. De acordo com estimativas da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura, em 2022, mais de 70 por cento das famílias guineenses retiraram o seu sustento da produção de caju. No ano passado, os resultados da campanha de comercialização do caju ficaram aquém do desejado pelos produtores e pelo Governo guineense, mas da China pode chegar, ainda este ano, um novo fôlego para o sector.

“Tenho estado a tratar de um processo, que é o processo de autorização de entrada da castanha-de-caju da Guiné-Bissau na República Popular da China, tendo em conta que a China é um dos maiores consumidores mundiais deste produto”, adianta Abdu Jaquité. “Nesta altura, estamos a envidar esforços para que, neste ano agrícola, seja permitida a entrada dos produtos agrícolas da Guiné-Bissau, em especial de castanha-de-caju da Guiné-Bissau, no mercado chinês”, complementa o responsável.

A Guiné-Bissau é um dos maiores produtores mundiais de castanha-de-caju, atrás apenas da Índia, do Vietname e da Costa do Marfim, mas o produto que assegura a sustentabilidade económica da maior parte das famílias guineenses é exportado em bruto para países terceiros para ser descascado, torrado e transformado, num processo em que o valor acrescentado é praticamente nulo.

Capital natural

O Governo guineense está, no entanto, apostado em alterar esse cenário, com a ajuda de investimento chinês. Em Outubro de 2022, as autoridades de Bissau assinaram dois memorandos de entendimento com o Grupo Human Construção e Investimentos. A empresa estatal chinesa assumiu a intenção de adquirir, numa primeira fase, a totalidade da produção de castanha-de-caju guineense para processamento na China, antes de, posteriormente, investir na construção de unidades fabris de transformação no país.

Os acordos, sublinha Abdu Jaquité, estão perfeitamente alinhados com os objectivos estratégicos do Governo da Guiné-Bissau, que incluiu o desígnio do processamento da castanha-de-caju em território nacional entre os projectos que candidatou a financiamento por parte do Fundo de Cooperação e Desenvolvimento China-Países de Língua Portuguesa.


“A Guiné-Bissau pode ser a porta de entrada de Macau para os Países da África Ocidental”

ABDU JAQUITÉ
DELEGADO DA GUINÉ-BISSAU JUNTO DO FÓRUM DE MACAU

“O Governo gostava de ver aprovado financiamento em projectos de transformação de matérias-primas da Guiné-Bissau, nomeadamente no que toca à construção de fábricas de processamento de castanha-de-caju”, afirma o representante guineense. “Candidatámos ao Fundo de Cooperação projectos ligados às indústrias transformadoras, projectos de energias renováveis, construção de portos e prospecção de recursos minerais”, acrescenta.

Com uma posição estratégica na costa ocidental africana, a Guiné-Bissau é rica em recursos naturais, muitos dos quais nunca foram explorados de forma concertada e intensiva. Um estudo conduzido pelo Banco Mundial, em 2018, concluiu que 30 por cento da riqueza do país tinha directamente origem nos recursos naturais. O capital natural ligado a sectores como a agricultura, as pescas e o turismo, confirma Abdu Jaquité, é visto pelas autoridades do país como fundamental para o desenvolvimento nacional e são esses também os domínios da actividade económica que se prefiguram como mais promissores para eventuais investidores estrangeiros que queiram apostar no país.

“É um país constituído por uma parte continental e outra parte insular, com mais de 88 ilhas. Os sectores com maior potencialidade para investimento são, desde logo, a agricultura, as pescas e o turismo. Os projectos de interesse empresarial no sector da indústria, do comércio e das energias renováveis podem ser também explorados”, sustenta o representante guineense no Fórum de Macau.

“Trata-se de um país por explorar. Possui grandes reservas minerais de recursos como o fosfato, a bauxite, areias pesadas, ouro e petróleo em prospecção, que são recursos importantes para o desenvolvimento da economia mundial, mas o país possui também recursos naturais valiosos, como a madeira e o pescado”, complementa Abdu Jaquité, que desempenha também o cargo de coordenador do Gabinete de Ligação dos Países de Língua Portuguesa.

Parceiro fundamental

O desenvolvimento do tecido industrial da Guiné-Bissau está, ainda assim, em grande medida dependente da melhoria da rede de infra-estruturas do país, sector em que a presença da China é cada vez mais visível. Os principais edifícios públicos de Bissau – como o Palácio do Governo, o Palácio da Justiça ou o edifício do Parlamento – foram edificados ou reconstruídos com financiamento chinês e está actualmente em construção a primeira auto-estrada do país.

“A China é um parceiro fundamental para o estado guineense e isso reflecte-se nas infra-estruturas erguidas com o seu apoio, como o edifício da Assembleia Nacional Popular, no coração da nossa cidade. Temos ainda como exemplos desta dinâmica a construção do Palácio do Governo e do Palácio da Justiça, bem como a renovação completa do Palácio Presidencial”, ilustra Abdu Jaquité.

O turismo é um dos sectores com maior potencial de investimento na Guiné-Bissau

“Várias unidades hospitalares e escolares também foram construídas com a participação da China, assim como aquele que é o nosso maior estádio de futebol, o Estádio 24 de Setembro. Actualmente, a China está a construir uma auto-estrada que liga [Safim] à capital, Bissau, e que vai constituir o principal ponto de acesso à cidade”, sustenta o delegado guineense.

A Guiné-Bissau junta às potencialidades internas a cartada da integração económica regional. O país é um dos 15 estados-membros da Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental (CEDEAO), organização com o potencial para abrir as portas a um mercado com 350 milhões de consumidores.

“A Guiné-Bissau pode ser a porta de entrada de Macau para os Países da África Ocidental, tendo em conta que a Guiné-Bissau integra a CEDEAO, uma comunidade composta por 15 estados-membros, com mais de 350 milhões de consumidores e que pratica uma política de livre circulação de pessoas, bens e capitais”, sublinha Abdu Jaquité. “O investimento na Guiné-Bissau é uma porta de entrada para este mercado comunitário e Macau pode fazer o mesmo para a Guiné-Bissau. Pode ser a porta de entrada da Guiné-Bissau para o mercado asiático, em concreto para esse vasto país que é a República Popular da China.”