Art For All Society

Arte conjugada no plural

Uma das prioridades da Art for All Society é promover a arte contemporânea junto do público de Macau
Os números não enganam: em 15 anos de existência, a Art For All Society organizou mais de uma centena de exposições, mantendo actualmente cerca de 70 membros activos. A associação, criada em 2007, é uma das principais plataformas do território de promoção da arte contemporânea

Texto Catarina Brites Soares

A Art For All Society (AFA), grupo dedicado à promoção das artes em Macau, está a celebrar 15 anos de existência. Vários artistas locais reconhecem o papel da associação no desenvolvimento das respectivas carreiras. Já os fundadores defendem que a AFA tem cumprido a meta mais importante a que se propôs aquando do seu lançamento: promover criadores locais dentro e fora de Macau.

“Essa foi a principal motivação para criar a associação”, frisa a artista Bianca Lei Sio Chong, uma das pessoas que esteve na origem da AFA. Os também artistas James Chu Cheok Son, Konstantin Bessmertny, Tong Chong, Kent Ieong Chi Kin e Noah Ng Fong Chao foram os restantes fundadores, a quem alimentou o sonho de criar uma entidade que projectasse os talentos de Macau e lhes garantisse mais oportunidades. Assim nasceu a AFA em 2007 – uma associação sem fins lucrativos dedicada à arte contemporânea.

“O objectivo foi muito claro desde o início: ajudar e apoiar artistas, e desenvolver o sector em Macau”, reforça James Chu, antigo presidente da associação. Exposições, debates, seminários e promoção de nomes locais a nível internacional eram as linhas mestras. “A AFA, enquanto entidade aberta e independente, não tem comparação com qualquer outra associação”, defende o artista, que liderou o grupo durante seis anos. Actualmente, a presidência é assegurada pela também artista Alice Kok Tim Hei (ver entrevista aqui).


“A AFA conseguiu construir uma identidade na qual os artistas e amantes de arte se revêem e acreditam”

JAMES CHU CHEOK SON
ARTISTA E ANTIGO PRESIDENTE DA ART FOR ALL SOCIETY

Konstantin Bessmertny defende que a AFA é a associação do meio artístico mais dinâmica da cidade. A prova, fundamenta, é que os seus membros expõem com regularidade na Ásia e no resto do mundo. “Está no mapa como destino obrigatório dos que vêm a Macau e querem ver algo contemporâneo. É um espaço para os artistas locais estabelecidos, mas também um ponto de partida para os novos talentos que estão a dar os primeiros passos”, vinca o pintor russo, radicado em Macau há várias décadas e um dos nomes mais sonantes do panorama cultural local.

O ilustrador Eric Fok Hoi Seng, que faz parte da geração de artistas locais cujo início de carreira já beneficiou da existência da AFA, confirma. “Deu-me muitas oportunidades quando comecei. Além das mostras em Macau, também me abriu as portas a eventos internacionais. A par disso, foi ainda um meio para conhecer outros artistas”, refere o membro da associação, agora em Taiwan, onde está a fazer um doutoramento em arte.


“A associação deu-me muitas oportunidades quando comecei”

ERIC FOK HOI SENG
ARTISTA E MEMBRO DA ART FOR ALL SOCIETY

O artista plástico José Drummond – que, não sendo fundador, assistiu ao início da AFA de perto – afirma que a entidade ocupou um espaço no panorama cultural da cidade que estava vazio. O que a define, e distingue, é o enfoque na arte contemporânea nas suas mais diversas expressões, desde a pintura à fotografia, escultura e vídeo. “A AFA veio oferecer aos artistas de Macau a oportunidade de expor em contexto de galeria”, salienta José Drummond, actualmente a viver em Xangai e que acompanhou James Chu na direcção da associação, como vice-presidente.

Chu acrescenta: “A AFA conseguiu construir uma identidade na qual os artistas e amantes de arte se revêem e acreditam. Esta partilha faz com que haja vontade de trabalhar e de crescer em conjunto”, sublinha.

“Imaginemos que a AFA não existia…”

O antigo presidente não ignora falhas, mas ressalva: “A maioria toma tudo como garantido. Imaginemos que a AFA não existia. Eu, por exemplo, certamente não teria as mesmas oportunidades para crescer, errar e comercializar os meus trabalhos”.

Paralelamente às exposições regulares que organiza na cidade, a AFA tem procurado exportar o talento de Macau. A presença em feiras de arte no Interior da China, nomeadamente em Pequim e Xangai, e no exterior foi uma constante até às actuais limitações criadas pela pandemia da COVID-19. Tóquio, Nova Iorque, Taipé, Kuala Lumpur, Singapura e Lisboa foram alguns dos destinos que ficaram a conhecer o que se faz em Macau. Na sua página electrónica, a associação orgulha-se de ter organizado mais de 100 exposições de artistas locais no território, em Pequim – onde chegou a ter uma galeria fixa – e noutras cidades.

O Salão de Outono é outro dos orgulhos da AFA. A mostra colectiva, que marca o calendário artístico anual da cidade, resulta de um processo de selecção e recolha do melhor que é produzido por artistas que trabalham e vivem em Macau.

Edição de 2021 do Salão de Outono da AFA

José Drummond realça que se conquistou muito nos primeiros anos da AFA. “Não só a galeria em Macau como a de Pequim, bem como as feiras de arte regionais de primeira linha em que se marcou presença, são disso exemplo. Hoje, a realidade é bem diferente. A liderança mudou, a realidade mudou e os desafios também mudaram. Faz parte do crescimento”, refere.

No entanto, o esforço para cumprir a missão inicial da associação, sublinha a artista Bianca Lei, continua a ser notório. “Há cada vez mais exposições e vendas por causa da AFA. Na verdade, muitos dos que mostram interesse na arte local contactam a AFA directamente”, realça.

Bianca Lei recorda que há poucos artistas profissionais em Macau: muitos têm de compatibilizar a carreira com outros empregos a tempo inteiro. “A AFA é especialmente importante para ajudar na promoção e venda de trabalhos”, detalha.

José Drummond salienta que a associação tem demonstrado grande resiliência. De espaço, mudou uma mão cheia de vezes. Agora está no Macau Art Garden, na Avenida Dr. Rodrigo Rodrigues.

“Apesar de todos os acidentes normais de percurso, tem tido lideranças fortes e apresentado um trabalho exemplar para a difusão dos artistas de Macau. Tem contribuído para o enriquecimento da oferta cultural junto de um público que não é fácil, que não estava muito sensibilizado para a arte contemporânea e que se sente que tem vindo a crescer”, afirma o artista.


“A AFA tem contribuído para o enriquecimento da oferta cultural junto de um público que não é fácil”

JOSÉ DRUMMOND
ARTISTA E ANTIGO VICE-PRESIDENTE DA ART FOR ALL SOCIETY

“Tem deixado uma marca no panorama cultural e dinamiza-o”, defende Konstantin Bessmertny, assumindo que há sempre espaço para continuar a melhorar.

E agora?

James Chu diz que os desafios de hoje se resumem no repto que foi delineado há 15 anos. “Continuar a missão de ajudar a que os artistas de Macau cresçam e que sejam competitivos, melhorar o mercado e garantir o apoio do Governo”, enumera.

José Drummond insiste nas prioridades que afirma defender desde 1996, mas que, na sua opinião, “se revelam bastante difíceis” de concretizar. Por um lado, diz, a cena artística local só poderá evoluir com o surgimento de galerias de arte privadas e comerciais. Por outro, o reconhecimento dos artistas locais no exterior deve passar por acções de intercâmbio regional e internacional, acrescenta. Por fim, diz o artista, é necessária uma forte aposta em Macau no ensino superior especializado no campo das artes.

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A estas prioridades, Bianca Lei soma outras que devem nortear o futuro da AFA. A aposta na promoção a nível internacional é a mais relevante a curto e médio prazo. “É importante sair de Macau e aproveitar mais oportunidades lá fora. Organizar mostras online e promover os artistas locais através da internet podem ser alternativas atendendo ao contexto presente”, sugere, em alusão ao impacto da COVID-19 nas viagens internacionais.

“Tenho a certeza que a maioria dos artistas quer que o seu trabalho seja valorizado e recordado”, afirma Eric Fok. “Para isso, é fundamental que haja esforço individual, que tem de ser combinado com diversas forças externas. Essas forças devem ter um conhecimento do mundo da arte e permitir que o público a compreenda, e ajudar a ampliar a rede artística da cidade, para que mais obras possam ser exportadas. O ideal é sempre estar num palco maior.”

James Chu deixa o desejo que a AFA cumpra esta e outras metas e prospere, como até aqui. “Enquanto fundador, espero que continue a crescer e a renovar-se. Pode ir muito longe, sem prazo ou restrição geográfica.”