“Queremos transferência de tecnologia para criar mais oportunidades de emprego”

Texto: Dalton Sitoe

Fotos: Salvador Sigaúque

O presidente da Confederação de Empresários da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CE-CPLP), Salimo Abdula, reconheceu que os atractivos económicos oferecidos por Macau à lusofonia são sedutores. Em entrevista à MACAU, Abdula também falou dos interesses do empresariado dos países de língua portuguesa em relação ao mercado asiático no geral, e chinês, em particular. Acompanhe as partes relevantes deste diálogo nas próximas linhas.

Que leitura faz do nível de inserção do empresariado dos países de língua portuguesa na China e no continente asiático?

Ainda não estamos no nível desejável. A China atingiu um grau económico, de conhecimento e capacidade que a elevou ao patamar de grande potência. Isto obriga a todos que pretendem trabalhar com a China a estarem devidamente organizados. Como Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), defendemos que só será possível atingirmos o nível desejado de inserção do nosso empresariado na China se unirmos as nossas valências e nos organizarmos em bloco. E já estamos a caminhar nesse sentido. Contudo, desde a criação do Fórum de Macau, em 2003, a esta parte, as trocas comerciais entre a China e os países de língua portuguesa aumentaram 11 vezes. Também as áreas de cooperação sino-lusófonas subiram de sete para duas dezenas. Só para termos uma ideia, em 2018, as trocas comerciais entre a China e os países lusófonos atingiram a fasquia dos 130 mil milhões de euros, um aumento de 25,3 por cento em relação a 2017.

Em que passo está a formação do bloco?

É um processo que é construído respeitando diversas etapas. Um bloco económico é uma visão futurista. E o primeiro passo para lá chegar é a livre circulação de pessoas nos países que integram a CPLP. Já há um consenso dos Estados-membros nesse sentido. Depois, como empresários, vamos defender e envidar esforços no sentido de a CPLP criar condições e advogar junto dos governos a necessidade da livre circulação de bens e capitais, criação de ponte aérea entre os Estados-membros, abolição dos vistos de entrada, e estabelecimento do tribunal de arbitragem da CPLP. Com estas condições criadas, mais facilmente os empresários farão a sua parte de modo a atingir a dimensão económica suficiente para uma maior inserção na Ásia.

Como interpreta o facto de Macau ter sido considerado pelo Governo Central uma plataforma comercial e de investimentos para os países de língua portuguesa?

Esse facto demonstra o interesse da China na CPLP. O exemplo de que Macau nos liga à China está na existência do Fórum de Macau. E esta plataforma se traduz em enormes oportunidades para os países de língua portuguesa, uma vez que os projectos que a China tem para Macau demandam muita mão-de-obra, matéria-prima e serviços, que em conjunto os nossos países poderão providenciar.

Que tipo de interesses o empresariado da CPLP tem em relação ao mercado chinês e asiático?

Temos sido mais consumidores do mercado asiático. Na prática, o que temos vendido é matéria-prima para a China. Precisamos equilibrar a nossa balança. É necessário fazermos parcerias para que haja transferência de tecnologia. Pretendemos que o processamento da matéria-prima possa acontecer dentro dos nossos países. A CPLP tem matéria-prima e uma população muito jovem, que precisa de trabalhar. Exportando apenas a matéria-prima em bruto para China não estamos a criar postos de trabalho. As parcerias entre o empresariado lusófono e chinês irão conduzir à abertura de mais fábricas nos nossos países, oferta de emprego à juventude, e transferência de tecnologia para a lusofonia. Essa é a nossa esperança. Na transformação conjunta da matéria-prima ganhamos todos.

Isenção de tarifas aduaneiras, impostos simples e baixos, diversidade cultural, oportunidades para empresas de vários sectores de actividade e a oportunidade de entrar em vários mercados por via de Macau são alguns dos pontos usados como chamariz. Olhando para a realidade do empresariado da CPLP, estas coisas seduzem-vos?

Sim, sem dúvida. É uma oportunidade para os nossos países poderem ter este intercâmbio comercial com a China e outros mercados asiáticos através de Macau. Estes mercados detêm conhecimento e capacidade em sectores produtivos, como na agricultura, assim como possuem capacidade de investimento tão necessário nos países africanos da CPLP. Não podemos nos esquecer, também, que dentro da nossa Comunidade temos um país asiático, Timor-Leste, que desempenha uma função preponderante nesta ligação com a Ásia.

Macau lançou em 2019 a “Exposição de Produtos e Serviços Dos Países de Língua Portuguesa” (PLPEX), que decorre em paralelo com a Feira Internacional de Macau (MIF). Como a CE-CPLP tem usado esta plataforma para alavancar as relações entre os empresários da CPLP e a China?

Utilizamos este evento para estabelecer e reforçar os laços de cooperação, bem como trocar experiências e partilhar ideias e oportunidades de negócios. Pensamos, também, em organizarmo-nos em delegações representativas para fazer contactos proveitosos, apresentar as nossas intenções e, através dos nossos associados que já operam nestes mercados, estender a possibilidade para mais empresários da CPLP poderem operar na Ásia e, em particular, nos projectos chineses. Por exemplo, no ano passado, a Associação de Jovens Empresários Portugal-China, que é nosso associado, fez-se representar, nesta feira, organizando o V Fórum de Jovens Empresários da China e dos Países de Língua Portuguesa. Na ocasião, a Federação das Mulheres Empresárias e Empreendedoras da CE-CPLP, representada pela sua presidente e pela vice-presidente por Portugal, Maria da Assunção Abdula, e Nelma Pontes, respectivamente, participaram do Fórum organizado pelo nosso associado.

CAIXA

Nascido numa família humilde em Moçambique há 55 anos, Salimo Abdula conseguiu chegar à universidade e tornar-se um dos empresários mais bem-sucedidos do país. Em 2018, foi reeleito presidente da Confederação Empresarial da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CE-CPLP), para um mandato até 2022. Salimo Abdula tem uma vasta experiência no associativismo empresarial, tendo dirigido a Confederação das Associações Económicas de Moçambique (CTA) por dois mandatos, coroados de êxito na atracção do investimento estrangeiro para Moçambique e na construção de parcerias entre empresários moçambicanos e estrangeiros.